OBS: o macete é parodia da musica "A praça" que fez sucesso na voz de Moacir Franco e é veiculada no programa semanal do SBT "Apraça é nossa" até Hoje.
Hoje eu acordei com vontade de escrever
Olhei lá na Gramática os quatro tipos de porquês
È separado, é junto, é com acento e sem acento
Esse é o porque que eu não aguento
O separado (Por que) para as perguntas
E com acento (Por quê) somente no final refrão
E o juntinho (Porque) para as resposta
E com acento (Porquê)para motivos Resais !!!
agora é só decorar e usar na elaboração de seus textos!!!!
Organizador: Professor Francisco Muriel
terça-feira, 13 de novembro de 2007
segunda-feira, 5 de novembro de 2007
Explicacao do poema: Moinho de Vento, publicado no tablóide da UEL
Explicacao do poema: Moinho de Vento
O poema parte da teoria dos signos lingüísticos de Ferdinand de Saussure, que tem como principal dicotomia, a do “significado/conceito: fenômeno psíquico” e do “significante/ imagem acústica: fenômeno puramente físico [Saussure. 1983.p.19].
A partir daí usei os significantes vento e eólico, para mostrar que um significado pode ter dois ou mais significantes ou vice-versa, no caso, corrente de ar.
Porém, notei que poderia ir além se pesquisasse a etimologia destas palavras. Constatando assim, que eólico é de origem grega “aiolios” e designa corrente de ar e vento é de origem latina “ventus”e designa a mesma coisa. No entanto, via latim a palavra eólico “aeolius” ganha um novo significado, o Deus do vento Éolo, filho de Posêidom.[Larousse,1995]
Também notei que a partir daí o significante que permaneceu foi o ventus latino,e esse se ramificou nas línguas românica (Neolatinas).É o que vemos em:
Português: vento;
Italiano:vento;
Francês:vent
Romeno:vînt
Espanhol: viento
Grego moderno: auemoz
Classifico meu poema como Rápido pois:
Existe uma ausência de fatos. Por exemplo:
No poema não é especificado ventus: palavra latina. Vent: palavra francesa, e assim por diante.
A existência do objeto (moinho) que forma uma correlação com todas as palavras.
Por exemplo, se um falante romeno identifica a palavra de seu idioma vînt, correlacionará com o moinho e poderá claramente deduzir que as outras palavras possuem o mesmo significado, o mesmo ocorrera com os falantes de outras línguas.
Existe uma economia de Expressões;
Existe uma multiplicação do tempo interno da obra.
Bibliografia:
Calvino,ítalo.seis proposta para o próximo milênio.Cia das letras,1990
Saussure, Ferdinand de.Curso de lingüística geral.11ºEdicão.São Paulo. Ed. Cutrix LTDA,1983.
Pereira, IsidoroS.J. dicionário Grego-Português/Portugês-Grego. São Paulo. Livraria A I-Braga.1998.
Melo,William Agel de.Dicionário Português-Romeno.Goiânia. Editora Oriente.1979.
Dicionário do Estudante. Português-Fancês Lisboa. Empresa Literária Fluminense.2003. .
Seco, Manuel. Diccionario de dudas y dificultades de la lengua española.10 ed. Madri, Calpe SA.1998
Palito, André Guilherme.Marchaelis,Pequeno dicionário italiano-Português.São Paulo. Melhoramento.1993 .
Enciclopédia Ilustrada Larousse 1995. Impresso pela editora e gráfica Plural. Nova Cultura 1998
Organização: Francisco Muriel
O poema parte da teoria dos signos lingüísticos de Ferdinand de Saussure, que tem como principal dicotomia, a do “significado/conceito: fenômeno psíquico” e do “significante/ imagem acústica: fenômeno puramente físico [Saussure. 1983.p.19].
A partir daí usei os significantes vento e eólico, para mostrar que um significado pode ter dois ou mais significantes ou vice-versa, no caso, corrente de ar.
Porém, notei que poderia ir além se pesquisasse a etimologia destas palavras. Constatando assim, que eólico é de origem grega “aiolios” e designa corrente de ar e vento é de origem latina “ventus”e designa a mesma coisa. No entanto, via latim a palavra eólico “aeolius” ganha um novo significado, o Deus do vento Éolo, filho de Posêidom.[Larousse,1995]
Também notei que a partir daí o significante que permaneceu foi o ventus latino,e esse se ramificou nas línguas românica (Neolatinas).É o que vemos em:
Português: vento;
Italiano:vento;
Francês:vent
Romeno:vînt
Espanhol: viento
Grego moderno: auemoz
Classifico meu poema como Rápido pois:
Existe uma ausência de fatos. Por exemplo:
No poema não é especificado ventus: palavra latina. Vent: palavra francesa, e assim por diante.
A existência do objeto (moinho) que forma uma correlação com todas as palavras.
Por exemplo, se um falante romeno identifica a palavra de seu idioma vînt, correlacionará com o moinho e poderá claramente deduzir que as outras palavras possuem o mesmo significado, o mesmo ocorrera com os falantes de outras línguas.
Existe uma economia de Expressões;
Existe uma multiplicação do tempo interno da obra.
Bibliografia:
Calvino,ítalo.seis proposta para o próximo milênio.Cia das letras,1990
Saussure, Ferdinand de.Curso de lingüística geral.11ºEdicão.São Paulo. Ed. Cutrix LTDA,1983.
Pereira, IsidoroS.J. dicionário Grego-Português/Portugês-Grego. São Paulo. Livraria A I-Braga.1998.
Melo,William Agel de.Dicionário Português-Romeno.Goiânia. Editora Oriente.1979.
Dicionário do Estudante. Português-Fancês Lisboa. Empresa Literária Fluminense.2003. .
Seco, Manuel. Diccionario de dudas y dificultades de la lengua española.10 ed. Madri, Calpe SA.1998
Palito, André Guilherme.Marchaelis,Pequeno dicionário italiano-Português.São Paulo. Melhoramento.1993 .
Enciclopédia Ilustrada Larousse 1995. Impresso pela editora e gráfica Plural. Nova Cultura 1998
Organização: Francisco Muriel
O que é Literatura?
, , , O que é Literatura?
Em sua origem , literatura vem da palavra latina literatura, que significava instrução, saber relativo à arte de escrever e ler, ou ainda, gramática, alfabeto, erudição (Vitor Manuel de Aguiar e Silva, Teoria da Literatura, pg.22)
A definição de literatura, atualmente pode ser considerada como algo subjetivo e instável, exatamente por estar ligada ao tempo e as sociedades que a produzem, bem como aquelas que a lêem.
Alguns formalistas Russos consideravam a “literariedade” como algo caracterizador da peculiaridade da linguagem. Nesse sentido, a literatura era um elemento intensificador da linguagem comum e permanecia afastada da fala cotidiana. Entre os formalistas russos estava Roman Jakobson que acreditava em uma organização particular da linguagem. A literatura, ainda era vista como um fato material, e o seu funcionamento poderia ser comparado ao uso de uma máquina, por exemplo.
Em contra partida, com o passar dos tempos, alguns pensadores, como Terry Eagleton, começaram a pensar na literatura como um discurso não pragmático, não dando à ela uma finalidade prática e imediata. Para eles, o que realmente importava não era a origem do texto, mas como as pessoas o consideram. Se elas decidirem que é literatura, então será confirmado. Dessa forma, é perceptível que a categoria literatura não pode ser eterna e imutável.
Com o tempo ocorreram várias mudanças nas sociedades, e a literatura também foi mudando, mas nunca deixou de estar ligada à história do homem, de refletir a cultura da época em que o texto foi escrito.
O caráter histórico da literatura perdura até hoje e tem sido um dos responsáveis pelo registro da evolução das sociedades, sem que se abandone, no entanto, a visão de literatura como arte da palavra.
· A relação da literatura com outros tipos de arte
Por vezes, a literatura se inspirou na pintura, na escultura ou na música, além de servir de tema para estas outras artes, especialmente à música vocal e de concerto.
No que diz respeito à pintura, a literatura tem tentado, por forma definida, alcançar os efeitos da pintura - tornar-se pintura com palavras. Em relação a sua proximidade com a música, a “musicalidade” em verso prova ser algo muito diferente da “melodia” em música: significa uma disposição de estruturas fonéticas, o evitar das acumulações de consoantes, ou simplesmente a presença de certos efeitos rítmicos.
A escultura e a arquitetura foram , porém, em medida muito superior a das outras artes – incluindo a literatura – determinadas por modelos clássicos e outros inspirados a partir destes.
Nesse sentido, verifica-se uma estreita relação entre essas várias artes – artes plásticas, literatura e música – porém cada uma delas tem uma evolução individual, com diferentes ritmos e elementos internos. Sem dúvida que elas mantenham constantes relações, intensamente complementares. Porém, devemos encarar a soma total das atividades culturais do homem como um sistema global de séries que evoluem por si próprias, cada uma delas com um conjunto de normas que não são necessariamente idênticas entre si.
Poesia e Prosa
· Poesia é forma de expressão literária que surgiu simultaneamente com a Música, a Dança e o Teatro, em época que remonta à Antiguidade histórica. Na própria fala - fruto da necessidade de comunicação entre elementos de uma comunidade primitiva - estão as raízes poéticas. Sabe-se que a comunicação imediata entre duas pessoas se dá pela palavra e pelo gesto, que estão tanto mais intimamente ligados quanto mais primitivo for o grupo. O gesto complementa sempre a fala, na proporção em que esta é limitada em sua inteligibilidade. Assim é que os gestos foram marcando o tom e o ritmo das palavras, até a caracterização individual dos primeiros contadores de seus feitos (caçadas) e dos feitos de sua tribo (guerras). A saliência cada vez maior do indivíduo que contava sobre a comunidade que o ouvia, acarretou a procura de fins artísticos em relação narrativa. (*)
O primeiro valor artístico destacável das narrativas primitivas foi o ritmo, a música da palavra já cantada ou simplesmente articulada. E até nas revoluções mais radicais das formas poéticas o ritmo continua a ser o elemento chave da expressão. É certo que a motivação rítmica varia entre o passado e o presente, como também sua perspectiva imediata: a fonética. Com o desenvolvimento cultural, os aspectos primários do ritmo e do som começaram a adquirir cores intelectuais, indivíduos que pensavam não mais em função estrita dos problemas da comunidade. Novas sugestões rítmicas foram aparecendo e permitindo à narrativa constituir-se em formas fixas.(*)Essência da Poesia - Ensaístas e filósofos já se preocupavam então com a essência da poesia, numa tentativa de desligá-la da matriz onde fermentara com outras expressões, que também foram conquistando autonomia e passando, por características afins, à qualidade de gêneros. A poesia, ligada à estrutura da narrativa, é a expressão artística que mais discussões tem suscitado em relação à sua essência.Platão, relativamente próximo às formas primitivas, classificou-a entre as artes representativas, ou artes plásticas, ao lado da dança e do teatro. Entre o filósofo grego e os modernos estudos da ensaísta norte-americana Susanne Langer há uma longa escala interpretativa. Para ela, a poesia não é mais representativa, pois desvinculou-se da preocupação de imitar a natureza. O inglês Herbert Read chega a conclusões semelhantes, quando estabelece a diferença entre poesia e prosa: "Na prosa, as palavras implicam, geralmente, a análise de um estado mental, ao passo que na poesia as palavras aparecem como coisas objetivas, que mantêm uma definida equivalência com o estado de intensidade mental do poeta." Prosa" é uma palavra de duplo sentido, pois pode designar uma forma (um texto escrito sem divisões rítmicas intencionais -- alheias à sintaxe, e sem grandes preocupações com ritmo, métrica, rimas, aliterações e outros elementos sonoros), e pode designar também um tipo de conteúdo (um texto cuja função lingüística predominante não é a poética, como por exemplo, um livro técnico, um romance, uma lei, etc...). Na acepção relativa à forma, "prosa" contrapõe-se a "verso"; na acepção relativa ao conteúdo, "prosa" contrapõe-se a "poesia".
Linguagem Conotativa e Denotativa
· Linguagem Conotativa
Apesar de todas as mudanças que ocorrem na literatura, existem características que lhe são peculiares e que atribuem um caráter “literário” a um determinado texto. Uma delas é o uso da linguagem conotativa. Este tipo de linguagem se manifesta quando a palavra ganha um sentido diferente daquele que normalmente atribuímos, distanciando-se do conceito dicionarizado, dizemos que está em sentido figurado, ou seja, conotativo.
Veja o exemplo:
“Meu Deus, eu quero a mulher que passa
Seu dorso frio é campo de lírios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na sua boca fresca”
(Vinicius de Morais)
O texto de Vinícius de Moraes, A mulher que passa, estaria nos indicando a figura da mulher cujo corpo contém um campo de lírios? Obviamente que não, mas através da linguagem figurada associa a cor do corpo, o perfume a essas qualidades do lírio. A isso se chama conotação. Porém, há alguns textos que não se encaixam nessas características, não podendo utilizar-se da conotação. São aqueles que, ao contrário do texto literário são pensados de forma objetiva, para que tenham apenas uma interpretação. Neles a linguagem usada é denotativa, ou seja, a palavra em seu sentido próprio. O texto jornalístico é um bom exemplo de texto não literário, mas existem outros, como os científicos ou instruções de manuais, em que a linguagem deve ser denotativa, ou seja, objetiva, sem dar margem a mais de uma interpretação.
Veja o exemplo abaixo:
Para estimular o lazer, os japoneses colocam uma praia e uma pista de esqui dentro dos prédios.
Muitos japoneses vão poder esquiar numa montanha gelada em pleno verão e ir à praia durante o inverno. Entra em funcionamento oficialmente nesta semana na cidade de Miyazaki, na Ilha de Kiushu, a quase 1500 quilômetros de Tóquio, o complexo de lazer Seagaia, o maior do gênero no mundo em ambientes fechados. Seagaia é uma praia de água doce com ondas artificiais tão grandes e regulares que o visitante pode até praticar surfe com prancha e tudo.
(Veja, 4 de agosto de 1993, p.40)
A notícia de construção da praia tem que estar clara, para que se tome conhecimento sobre a sua inauguração. Como se pode perceber, existe a necessidade de que se entenda a mensagem emitida de forma clara, sem duplas interpretações, o que se pode ser alcançado com o uso da linguagem denotativa.
Figuras de Linguagem
· Figuras de som
A) Aliteração: consiste na repetição ordenada de sons consonantais idênticos.
“Quem madruga sempre encontra Januária na janela” (Chico Buarque)
B) Assonância: consiste na repetição ordenada de sons vocálicos idênticos.
“Sou um mulato nato no sentido lato” (Caetano Veloso)
C) Paranomásia: consiste na aproximação de palavras de sons parecidos
“Violência, viola, violeiro” (Edu Lobo)
· Figuras de construção
A) Elipse: omissão de um termo facilmente identificável pelo contexto.
“ Na sala, apenas quatro ou cinco convidados” (Machado de Assis) (Omissão de havia)
B) Zeugma: omissão de um termo que já apareceu antes.
Ele prefere cinema: eu, teatro (omissão de prefiro)
C) Polissíndeto: repetição de conectivos ligando elementos da frase ou do período.
“E sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob o sarcasmo”
(Carlos Drummond de Andrade)
D-)Pleonasmo: É o uso de termos desnecessários, isso só é válido quando os termos usados têm finalidade expressiva de repetição. O pleonasmo pode ser Semântico ou Sintático.
EX: Vi com meus próprios olhos. (Semântico)
A mim me parece óbvio. (Sintático)
D-) Anacoluto É a falta de nexo entre o começo e o final da frase.
EX: Eu parece que estou com sono.
E-) Silepse É a concordância com a idéia, não com a escrita. Pode se de três tipos: Silepse de Gênero, de Número e de P essoa.
Exemplos de Silepse:
Silepse de Gênero: Ocorre quando o predicativo que combina com a idéia está implícita, e não com a forma escrita.
EX: Rio de Janeiro é fria. (A cidade do Rio de Janeiro é fria.).
Silepse de Número: Ocorre quando uma palavra que está no singular, mas indica mais de um ser.
EX: Estamos muito feliz por você. (Estou muito feliz = Estamos muito feliz.).
Silepse de Pessoa: Ocorre quando o verbo aparece na 3ª pessoa e o verbo na primeira. A idéia é que se integra o sujeito.
EX: Dissemos que os gaúchos somos poucos.
F-)Hipérbato: É na ordem natural e direta dos termos da oração.
EX: Passeiam, à tarde, as belas na Avenida.
· Figuras de Pensamento
G-)Hipérbole: É o exagero em uma idéia.
EX: Tentei mais de mil vezes te ligar e não consegui.
H-)Lilotes: É o contrário de hipérbole.
EX: Não estou nada contente com você.
I-)Eufemismo: É a utilização de palavras ou expressões agradáveis em troca das que tem sentido grosseiro.
EX: Por favor, onde fica o toalete. (Toalete = Banheiro)
J-) Ironia :Sugere pela entonação e pela contradição de termos, o contrário do que a palavra ou orações parece dizer.
EX: Ele é gentil como um cavalo chucro.
K-)Prosopopéia: É a atribuição de sentimentos humanos em animais, objetos ou seres inanimados.
EX: As árvores estão chorando.
L-) Antítese: Consiste em opor a uma idéia outra de sentido contrário.
EX: Não haveria luz se não fosse a escuridão.
· Figuras de palavras
A-) Metáfora: consiste em empregar um termo com significado diferente do habitual, com base numa relação de similaridade entre o sentido próprio e o sentido figurado. A metáfora implica, pois, uma comparação em que o conectivo comparativo fica subtendido.
“Meu pensamento é um rio subterrâneo” (Fernando Pessoa)
B-) Metonímia: como a metáfora, consiste numa transposição de significado, ou seja, uma palavra que usualmente significa uma coisa passa a ser usada com outro significado. Todavia, a transposição de significados não é mais feita com base em traços de semelhança, e sim de antiguidade. Observe:
Pão para quem tem fome (pão em lugar de alimento)
C-) Sinestesia: consiste em mesclar, numa expressão, sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido.
A luz crua da madrugada invadia o meu quarto.
Em sua origem , literatura vem da palavra latina literatura, que significava instrução, saber relativo à arte de escrever e ler, ou ainda, gramática, alfabeto, erudição (Vitor Manuel de Aguiar e Silva, Teoria da Literatura, pg.22)
A definição de literatura, atualmente pode ser considerada como algo subjetivo e instável, exatamente por estar ligada ao tempo e as sociedades que a produzem, bem como aquelas que a lêem.
Alguns formalistas Russos consideravam a “literariedade” como algo caracterizador da peculiaridade da linguagem. Nesse sentido, a literatura era um elemento intensificador da linguagem comum e permanecia afastada da fala cotidiana. Entre os formalistas russos estava Roman Jakobson que acreditava em uma organização particular da linguagem. A literatura, ainda era vista como um fato material, e o seu funcionamento poderia ser comparado ao uso de uma máquina, por exemplo.
Em contra partida, com o passar dos tempos, alguns pensadores, como Terry Eagleton, começaram a pensar na literatura como um discurso não pragmático, não dando à ela uma finalidade prática e imediata. Para eles, o que realmente importava não era a origem do texto, mas como as pessoas o consideram. Se elas decidirem que é literatura, então será confirmado. Dessa forma, é perceptível que a categoria literatura não pode ser eterna e imutável.
Com o tempo ocorreram várias mudanças nas sociedades, e a literatura também foi mudando, mas nunca deixou de estar ligada à história do homem, de refletir a cultura da época em que o texto foi escrito.
O caráter histórico da literatura perdura até hoje e tem sido um dos responsáveis pelo registro da evolução das sociedades, sem que se abandone, no entanto, a visão de literatura como arte da palavra.
· A relação da literatura com outros tipos de arte
Por vezes, a literatura se inspirou na pintura, na escultura ou na música, além de servir de tema para estas outras artes, especialmente à música vocal e de concerto.
No que diz respeito à pintura, a literatura tem tentado, por forma definida, alcançar os efeitos da pintura - tornar-se pintura com palavras. Em relação a sua proximidade com a música, a “musicalidade” em verso prova ser algo muito diferente da “melodia” em música: significa uma disposição de estruturas fonéticas, o evitar das acumulações de consoantes, ou simplesmente a presença de certos efeitos rítmicos.
A escultura e a arquitetura foram , porém, em medida muito superior a das outras artes – incluindo a literatura – determinadas por modelos clássicos e outros inspirados a partir destes.
Nesse sentido, verifica-se uma estreita relação entre essas várias artes – artes plásticas, literatura e música – porém cada uma delas tem uma evolução individual, com diferentes ritmos e elementos internos. Sem dúvida que elas mantenham constantes relações, intensamente complementares. Porém, devemos encarar a soma total das atividades culturais do homem como um sistema global de séries que evoluem por si próprias, cada uma delas com um conjunto de normas que não são necessariamente idênticas entre si.
Poesia e Prosa
· Poesia é forma de expressão literária que surgiu simultaneamente com a Música, a Dança e o Teatro, em época que remonta à Antiguidade histórica. Na própria fala - fruto da necessidade de comunicação entre elementos de uma comunidade primitiva - estão as raízes poéticas. Sabe-se que a comunicação imediata entre duas pessoas se dá pela palavra e pelo gesto, que estão tanto mais intimamente ligados quanto mais primitivo for o grupo. O gesto complementa sempre a fala, na proporção em que esta é limitada em sua inteligibilidade. Assim é que os gestos foram marcando o tom e o ritmo das palavras, até a caracterização individual dos primeiros contadores de seus feitos (caçadas) e dos feitos de sua tribo (guerras). A saliência cada vez maior do indivíduo que contava sobre a comunidade que o ouvia, acarretou a procura de fins artísticos em relação narrativa. (*)
O primeiro valor artístico destacável das narrativas primitivas foi o ritmo, a música da palavra já cantada ou simplesmente articulada. E até nas revoluções mais radicais das formas poéticas o ritmo continua a ser o elemento chave da expressão. É certo que a motivação rítmica varia entre o passado e o presente, como também sua perspectiva imediata: a fonética. Com o desenvolvimento cultural, os aspectos primários do ritmo e do som começaram a adquirir cores intelectuais, indivíduos que pensavam não mais em função estrita dos problemas da comunidade. Novas sugestões rítmicas foram aparecendo e permitindo à narrativa constituir-se em formas fixas.(*)Essência da Poesia - Ensaístas e filósofos já se preocupavam então com a essência da poesia, numa tentativa de desligá-la da matriz onde fermentara com outras expressões, que também foram conquistando autonomia e passando, por características afins, à qualidade de gêneros. A poesia, ligada à estrutura da narrativa, é a expressão artística que mais discussões tem suscitado em relação à sua essência.Platão, relativamente próximo às formas primitivas, classificou-a entre as artes representativas, ou artes plásticas, ao lado da dança e do teatro. Entre o filósofo grego e os modernos estudos da ensaísta norte-americana Susanne Langer há uma longa escala interpretativa. Para ela, a poesia não é mais representativa, pois desvinculou-se da preocupação de imitar a natureza. O inglês Herbert Read chega a conclusões semelhantes, quando estabelece a diferença entre poesia e prosa: "Na prosa, as palavras implicam, geralmente, a análise de um estado mental, ao passo que na poesia as palavras aparecem como coisas objetivas, que mantêm uma definida equivalência com o estado de intensidade mental do poeta." Prosa" é uma palavra de duplo sentido, pois pode designar uma forma (um texto escrito sem divisões rítmicas intencionais -- alheias à sintaxe, e sem grandes preocupações com ritmo, métrica, rimas, aliterações e outros elementos sonoros), e pode designar também um tipo de conteúdo (um texto cuja função lingüística predominante não é a poética, como por exemplo, um livro técnico, um romance, uma lei, etc...). Na acepção relativa à forma, "prosa" contrapõe-se a "verso"; na acepção relativa ao conteúdo, "prosa" contrapõe-se a "poesia".
Linguagem Conotativa e Denotativa
· Linguagem Conotativa
Apesar de todas as mudanças que ocorrem na literatura, existem características que lhe são peculiares e que atribuem um caráter “literário” a um determinado texto. Uma delas é o uso da linguagem conotativa. Este tipo de linguagem se manifesta quando a palavra ganha um sentido diferente daquele que normalmente atribuímos, distanciando-se do conceito dicionarizado, dizemos que está em sentido figurado, ou seja, conotativo.
Veja o exemplo:
“Meu Deus, eu quero a mulher que passa
Seu dorso frio é campo de lírios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na sua boca fresca”
(Vinicius de Morais)
O texto de Vinícius de Moraes, A mulher que passa, estaria nos indicando a figura da mulher cujo corpo contém um campo de lírios? Obviamente que não, mas através da linguagem figurada associa a cor do corpo, o perfume a essas qualidades do lírio. A isso se chama conotação. Porém, há alguns textos que não se encaixam nessas características, não podendo utilizar-se da conotação. São aqueles que, ao contrário do texto literário são pensados de forma objetiva, para que tenham apenas uma interpretação. Neles a linguagem usada é denotativa, ou seja, a palavra em seu sentido próprio. O texto jornalístico é um bom exemplo de texto não literário, mas existem outros, como os científicos ou instruções de manuais, em que a linguagem deve ser denotativa, ou seja, objetiva, sem dar margem a mais de uma interpretação.
Veja o exemplo abaixo:
Para estimular o lazer, os japoneses colocam uma praia e uma pista de esqui dentro dos prédios.
Muitos japoneses vão poder esquiar numa montanha gelada em pleno verão e ir à praia durante o inverno. Entra em funcionamento oficialmente nesta semana na cidade de Miyazaki, na Ilha de Kiushu, a quase 1500 quilômetros de Tóquio, o complexo de lazer Seagaia, o maior do gênero no mundo em ambientes fechados. Seagaia é uma praia de água doce com ondas artificiais tão grandes e regulares que o visitante pode até praticar surfe com prancha e tudo.
(Veja, 4 de agosto de 1993, p.40)
A notícia de construção da praia tem que estar clara, para que se tome conhecimento sobre a sua inauguração. Como se pode perceber, existe a necessidade de que se entenda a mensagem emitida de forma clara, sem duplas interpretações, o que se pode ser alcançado com o uso da linguagem denotativa.
Figuras de Linguagem
· Figuras de som
A) Aliteração: consiste na repetição ordenada de sons consonantais idênticos.
“Quem madruga sempre encontra Januária na janela” (Chico Buarque)
B) Assonância: consiste na repetição ordenada de sons vocálicos idênticos.
“Sou um mulato nato no sentido lato” (Caetano Veloso)
C) Paranomásia: consiste na aproximação de palavras de sons parecidos
“Violência, viola, violeiro” (Edu Lobo)
· Figuras de construção
A) Elipse: omissão de um termo facilmente identificável pelo contexto.
“ Na sala, apenas quatro ou cinco convidados” (Machado de Assis) (Omissão de havia)
B) Zeugma: omissão de um termo que já apareceu antes.
Ele prefere cinema: eu, teatro (omissão de prefiro)
C) Polissíndeto: repetição de conectivos ligando elementos da frase ou do período.
“E sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob o sarcasmo”
(Carlos Drummond de Andrade)
D-)Pleonasmo: É o uso de termos desnecessários, isso só é válido quando os termos usados têm finalidade expressiva de repetição. O pleonasmo pode ser Semântico ou Sintático.
EX: Vi com meus próprios olhos. (Semântico)
A mim me parece óbvio. (Sintático)
D-) Anacoluto É a falta de nexo entre o começo e o final da frase.
EX: Eu parece que estou com sono.
E-) Silepse É a concordância com a idéia, não com a escrita. Pode se de três tipos: Silepse de Gênero, de Número e de P essoa.
Exemplos de Silepse:
Silepse de Gênero: Ocorre quando o predicativo que combina com a idéia está implícita, e não com a forma escrita.
EX: Rio de Janeiro é fria. (A cidade do Rio de Janeiro é fria.).
Silepse de Número: Ocorre quando uma palavra que está no singular, mas indica mais de um ser.
EX: Estamos muito feliz por você. (Estou muito feliz = Estamos muito feliz.).
Silepse de Pessoa: Ocorre quando o verbo aparece na 3ª pessoa e o verbo na primeira. A idéia é que se integra o sujeito.
EX: Dissemos que os gaúchos somos poucos.
F-)Hipérbato: É na ordem natural e direta dos termos da oração.
EX: Passeiam, à tarde, as belas na Avenida.
· Figuras de Pensamento
G-)Hipérbole: É o exagero em uma idéia.
EX: Tentei mais de mil vezes te ligar e não consegui.
H-)Lilotes: É o contrário de hipérbole.
EX: Não estou nada contente com você.
I-)Eufemismo: É a utilização de palavras ou expressões agradáveis em troca das que tem sentido grosseiro.
EX: Por favor, onde fica o toalete. (Toalete = Banheiro)
J-) Ironia :Sugere pela entonação e pela contradição de termos, o contrário do que a palavra ou orações parece dizer.
EX: Ele é gentil como um cavalo chucro.
K-)Prosopopéia: É a atribuição de sentimentos humanos em animais, objetos ou seres inanimados.
EX: As árvores estão chorando.
L-) Antítese: Consiste em opor a uma idéia outra de sentido contrário.
EX: Não haveria luz se não fosse a escuridão.
· Figuras de palavras
A-) Metáfora: consiste em empregar um termo com significado diferente do habitual, com base numa relação de similaridade entre o sentido próprio e o sentido figurado. A metáfora implica, pois, uma comparação em que o conectivo comparativo fica subtendido.
“Meu pensamento é um rio subterrâneo” (Fernando Pessoa)
B-) Metonímia: como a metáfora, consiste numa transposição de significado, ou seja, uma palavra que usualmente significa uma coisa passa a ser usada com outro significado. Todavia, a transposição de significados não é mais feita com base em traços de semelhança, e sim de antiguidade. Observe:
Pão para quem tem fome (pão em lugar de alimento)
C-) Sinestesia: consiste em mesclar, numa expressão, sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido.
A luz crua da madrugada invadia o meu quarto.
A POESIA CONCRETA (Literatura Contemporânea)
Literatura Contemporânea
A POESIA CONCRETA
Em 1956, a Exposição Nacional de Arte Concreta, realizada na cidade de São Paulo, lançou oficialmente o mais controverso movimento de poesia vanguardista brasileira: o concretismo*. Criada por Décio Pignatari (1927), Haroldo de Campos (1929) e Augusto de Campos (1931), a poesia concreta era um ataque à produção poética da época, dominada pela geração de 1945, a quem os jovens paulistas acusavam de verbalismo, subjetivismo, falta de apuro e incapacidade de expressar a nova realidade gerada pela revolução industrial. São Paulo vivia então o apogeu do desenvolvimentismo da Era J.K. e seus intelectuais buscavam uma poética ideológica/artística cosmopolita, como tinham feito os modernistas de 1922. Por isso, um dos modelos adotados pelos concretos foi Oswald de Andrade cuja lírica sintética (“poemas-pílula”) representava para eles o vanguardismo mais radical. Desde 1952, os jovens intelectuais paulistas vinham procurando um novo caminho através de uma revista chamada Noigandres, palavra tirada de um poema de Erza Pound e que não significa nada.
"Todo o poema é uma aventura planificada" Em síntese, os criadores do concretismo propugnavam um experimentalismo poético (planificado e racionalizado) que obedecia aos seguintes princípios:
- Abolição do verso tradicional, sobretudo através da eliminação dos laços sintáticos (preposições, conjunções, pronomes, etc.), gerando uma poesia objetiva, concreta, feita quase tão somente de substantivos e verbos;
- - Um linguagem necessariamente sintética, dinâmica, homóloga à sociedade industrial (“A importância do olho na comunicação mais rápida... os anúncios luminosos, as histórias em quadrinhos, a necessidade do movimento....”);
- Utilização de paronomásias, neologismos, estrangeirismos; separação de prefixos e sufixos; repetição de certos morfemas; valorização da palavra solta (som, forma visual, carga semântica) que se fragmenta e recompõe na página;
- O poema transforma-se em objeto visual, valendo-se do espaço gráfico como agente estrutural: uso dos espaços brancos, de recursos tipográficos, etc.; em função disso o poema deverá ser simultaneamente lido e visto.
Poesia- Práxis
Resultou das propostas de um grupo dissidentes dos Concretistas. O líder do movimento é o poeta Mário Chamie, autor dolivro Lavra-Lavra. O manifesto do grupo data de 1961 e afirma: “ as palavras não são corpos inertes, imobilizados a partir de quem as proferes e as usas (...) as palavras são corpos vivos. Não vítimas passivas do contexto.”
Enquanto os concretista levavam em conta a palavra-coisa, a poesia-práxis considera a palavra-energia. Por isso, valoriza a palavra mais no contexto exrtalingüístico. Alguns representantes da poesia-práxis: Yone Fonseca, Antônio Cabral, Carlos Brandão, Arnaldo Saraiva.
Poema/Processo
Radicalizando a proposta dos concretista, o poema/processo utiliza sobretudo signos visuais. Basicamente, procura explorar as possibilidades poéticas contidas nos signos não-verbais. Portanto, é um tipo de mensagem feito mais para ser visto do que para ser lido. O manifesto do grupo, de autoria de Wlademir Dias-Pino, foi publicado em 1967.
Poesia social
Surge da relação de alguns poetas aos excessos formais da poesia concretista. Buscando maior comunicação com o leitor, a poesia social propõe o retorno ao verso, o emprego de uma linguagem simples e volta sua temática para os problemas da realidade social da época. Além de Ferreira Gullar, destacam-se Afonso Ávila, Thiago Mello e Affonso Romano.
Poesia Marginal
Surgida na década de 70, a poesia marginal é assim chamada porque sua impressão e distribuição não são feitas por editoras e distribuidoras. Alguns poetas que começaram como “marginal” têm hoje sua obras impressa e distribuída por grandes editoras. É o caso de Chacal, Cacaso, Paulo Leminsky, entre outros.
A linguagem que aparece nos poemas marginais é extremamente diversificada: há textos próximos da prosa, como temas relacionados ao cotidiano num tom predominantemente coloquial; surge influências Concretistas e do poema/processo; a ironia e o desprezo ao chamado bom gosto marcam uma parte dessa produção.
Enquanto os Concretistas davam grande importância à construção do poema, os marginais preocupavam-se sobretudo com a expressão, ora de fatos triviais, ora de seus sentimentos. Por isso, boa parte dessa literatura apresenta um tom de conversa íntima, de confissão pessoal.
Análise de Poema Concreto de Augusto de Campos.
O poema, estritamente visual, vai além da audição, fazendo uso do espaço geográfico do papel em branco. Este tipo de poema, rompe claramente com a versificação clássica (temporístico e linear), para sobressair uma estrutura nova, de sobre posição (espaço-temporal). Assim o poema utiliza uma Sintaxe espacial ou visual.
No poema, podemos notar:
- a repetição sempre de um artigo + um Substantivo: “ uma vez, uma fala, uma foz, uma bala.”
- Toda a estrutura do poema começa com a expressão “uma vez” , que alimenta a possibilidade de narrativa.
- A expressão “uma vez”, se encontrará sempre no eixo central.
- A repetição de monossílabos: “vez, foz, voz”, intercalado por dissílabas: “fala, bala, vala”.
- Exploração de consoantes surda em relação à sua correspondente sonora: “fala e vala”, “foz e voz”,
- Os vocábulos são escolhidos semanticamente para trazer reflexões sobre a morte: Foz Vala, bala.
- Como todo poema concreto, deixa uma fissura, uma falta de significado.
Organização: professor Francisco Muriel
A POESIA CONCRETA
Em 1956, a Exposição Nacional de Arte Concreta, realizada na cidade de São Paulo, lançou oficialmente o mais controverso movimento de poesia vanguardista brasileira: o concretismo*. Criada por Décio Pignatari (1927), Haroldo de Campos (1929) e Augusto de Campos (1931), a poesia concreta era um ataque à produção poética da época, dominada pela geração de 1945, a quem os jovens paulistas acusavam de verbalismo, subjetivismo, falta de apuro e incapacidade de expressar a nova realidade gerada pela revolução industrial. São Paulo vivia então o apogeu do desenvolvimentismo da Era J.K. e seus intelectuais buscavam uma poética ideológica/artística cosmopolita, como tinham feito os modernistas de 1922. Por isso, um dos modelos adotados pelos concretos foi Oswald de Andrade cuja lírica sintética (“poemas-pílula”) representava para eles o vanguardismo mais radical. Desde 1952, os jovens intelectuais paulistas vinham procurando um novo caminho através de uma revista chamada Noigandres, palavra tirada de um poema de Erza Pound e que não significa nada.
"Todo o poema é uma aventura planificada" Em síntese, os criadores do concretismo propugnavam um experimentalismo poético (planificado e racionalizado) que obedecia aos seguintes princípios:
- Abolição do verso tradicional, sobretudo através da eliminação dos laços sintáticos (preposições, conjunções, pronomes, etc.), gerando uma poesia objetiva, concreta, feita quase tão somente de substantivos e verbos;
- - Um linguagem necessariamente sintética, dinâmica, homóloga à sociedade industrial (“A importância do olho na comunicação mais rápida... os anúncios luminosos, as histórias em quadrinhos, a necessidade do movimento....”);
- Utilização de paronomásias, neologismos, estrangeirismos; separação de prefixos e sufixos; repetição de certos morfemas; valorização da palavra solta (som, forma visual, carga semântica) que se fragmenta e recompõe na página;
- O poema transforma-se em objeto visual, valendo-se do espaço gráfico como agente estrutural: uso dos espaços brancos, de recursos tipográficos, etc.; em função disso o poema deverá ser simultaneamente lido e visto.
Poesia- Práxis
Resultou das propostas de um grupo dissidentes dos Concretistas. O líder do movimento é o poeta Mário Chamie, autor dolivro Lavra-Lavra. O manifesto do grupo data de 1961 e afirma: “ as palavras não são corpos inertes, imobilizados a partir de quem as proferes e as usas (...) as palavras são corpos vivos. Não vítimas passivas do contexto.”
Enquanto os concretista levavam em conta a palavra-coisa, a poesia-práxis considera a palavra-energia. Por isso, valoriza a palavra mais no contexto exrtalingüístico. Alguns representantes da poesia-práxis: Yone Fonseca, Antônio Cabral, Carlos Brandão, Arnaldo Saraiva.
Poema/Processo
Radicalizando a proposta dos concretista, o poema/processo utiliza sobretudo signos visuais. Basicamente, procura explorar as possibilidades poéticas contidas nos signos não-verbais. Portanto, é um tipo de mensagem feito mais para ser visto do que para ser lido. O manifesto do grupo, de autoria de Wlademir Dias-Pino, foi publicado em 1967.
Poesia social
Surge da relação de alguns poetas aos excessos formais da poesia concretista. Buscando maior comunicação com o leitor, a poesia social propõe o retorno ao verso, o emprego de uma linguagem simples e volta sua temática para os problemas da realidade social da época. Além de Ferreira Gullar, destacam-se Afonso Ávila, Thiago Mello e Affonso Romano.
Poesia Marginal
Surgida na década de 70, a poesia marginal é assim chamada porque sua impressão e distribuição não são feitas por editoras e distribuidoras. Alguns poetas que começaram como “marginal” têm hoje sua obras impressa e distribuída por grandes editoras. É o caso de Chacal, Cacaso, Paulo Leminsky, entre outros.
A linguagem que aparece nos poemas marginais é extremamente diversificada: há textos próximos da prosa, como temas relacionados ao cotidiano num tom predominantemente coloquial; surge influências Concretistas e do poema/processo; a ironia e o desprezo ao chamado bom gosto marcam uma parte dessa produção.
Enquanto os Concretistas davam grande importância à construção do poema, os marginais preocupavam-se sobretudo com a expressão, ora de fatos triviais, ora de seus sentimentos. Por isso, boa parte dessa literatura apresenta um tom de conversa íntima, de confissão pessoal.
Análise de Poema Concreto de Augusto de Campos.
O poema, estritamente visual, vai além da audição, fazendo uso do espaço geográfico do papel em branco. Este tipo de poema, rompe claramente com a versificação clássica (temporístico e linear), para sobressair uma estrutura nova, de sobre posição (espaço-temporal). Assim o poema utiliza uma Sintaxe espacial ou visual.
No poema, podemos notar:
- a repetição sempre de um artigo + um Substantivo: “ uma vez, uma fala, uma foz, uma bala.”
- Toda a estrutura do poema começa com a expressão “uma vez” , que alimenta a possibilidade de narrativa.
- A expressão “uma vez”, se encontrará sempre no eixo central.
- A repetição de monossílabos: “vez, foz, voz”, intercalado por dissílabas: “fala, bala, vala”.
- Exploração de consoantes surda em relação à sua correspondente sonora: “fala e vala”, “foz e voz”,
- Os vocábulos são escolhidos semanticamente para trazer reflexões sobre a morte: Foz Vala, bala.
- Como todo poema concreto, deixa uma fissura, uma falta de significado.
Organização: professor Francisco Muriel
Análise do Conto: Sala de Armas – Nélida Piñon.(lit. brasil.)
Análise do Conto: Sala de Armas – Nélida Piñon.
Neste conto, vemos a inquietação do eu, marca registra da autora. É contada a história de um homem que resolve parar todas as suas atividades para esperar o momento derradeiro. “eu também não queria morrer(...). Coube-me porém antecipar-me aos desígnios.” Narrado em primeira pessoa, o conto vai se desenrolando com o reflexo que tal ato causou no âmbito familiar do narrador, que começa a contar que tudo não passa de uma tradição de família.
Também eu herdara do pai a fadiga de viver(...).”
“(...) o mistério do pai ingressara na minha vida.’
Assim, ele passa a narrar todos os atos de seu pai, quando também decidira abandonar tudo para dedicar-se à abertura de um buraco capaz de comportar ele, sua cama, seu cachorro, seu cavalo (ambos sacrificados), alguns objetos de cozinha e ainda seus trajes comuns.
“E quando ele começou a emagrecer, dedicou-se à abertura de um grande buraco na clareira mais iluminada da floresta. Ali o sol não consentia sombras. E não aceitando ajuda, o trabalho tomou-lhes os últimos anos.”
“(...) logo morreu. Amontoamos ele então entre suas coisas e colocamos a terra de onde havia saído.”
Após, incursionar o leitor pela história de seu pai, o narrador passa a contar a sua própria história, de como organizou tudo, para esperar a morte. Então e nesse momento em que há a fusão entre o narrador e o protagonista. “elegi-me então para acompanhar o pai em sua excentricidade.”
Assim, o narrador conta como preparou uma sala de sua casa fixando no teto objetos estimados por ele, entre esses objetos, caixões para ele, sua esposa e seus filhos, cada qual com seu nome, para evitar brigas.
“Obriguei mulher e filhos a abandonarem a região, a que regressariam quarenta dias depois(...)”
Ates do retorno do seus o protagonista se despede do mundo externo, da fauna e da flora que tanto gostava, pois ele entra para sempre na sala da qual nunca mais sairá. Os filhos ficam de guarda – “em troca do arsenal de prata”- para que nenhuma fraqueza do nosso protagonista impedissem o seu próprio intento. A mulher – “como prometer” – nunca mais voltara à sala onde ele fica deitado, imóvel, olhos fixos no teto, fixo em seus tesouro, esperando a morte. Um de seus filhos, o caçula parece ser o próximo herdeiro de tal excentricidade. O protagonista ainda reflete, em uma narrativa mais que psicológica, sobre a dificuldade de seu corpo ser colocado em um dos caixões fixados no teto.
A narrativa tem o seu final, com o narrador deitado, já muito magro, pois ele deixa também de se alimentar, esperando a morte, e de quando e quando, pensando que ele já morrerá, um dos filhos, o do turno, chama os irmãos para constatar. Mas logo se vê, sua “leve respiração, os sucessivos tremores, sensíveis como um olho fixo” e ele mas do que ninguém, espera pela morte, desabafando:
“Mas, apesar da minha intensa paixão, a morte parece não me desejar.(...)há como é difícil aguardar”
A ausência de um final coerente, algo do tipo, a morte do protagonista ou sua salvação por influência de um dos filhos, não acontece nesse conto, o que o deixa aberto para interpretações possíveis, mas principalmente para retratar a angústia do eu frente a existência, e o esperar por algo que por mais que desejemos não dependerá absolutamente de nós. É assim que o narrador retumba seu final, com a esperança que lhe chegue a morte ou em outras palavras, lhe chegue a nova vida, além de se revelar o segredo universal.
O narrador se encontra em um estado em que colhe o que plantou, pois, assim como seu pai, diante do sentimento de paixão e de preparo para a morte, deixa de comunicar-se com os seus:
“A anos não pronunciou uma só palavra”.
Por isto, seus filhos lutam para tentar segurá-lo em vida. Para que ele se “agarre a vida e levante do berço”. Mas ele parece irresoluto em sua decisão e, já discrentre da vida, aguarda apenas a morte:
“Quero morrer de olhos abertos, contemplando o teto.”
Organização: Professor Francisco Muriel
Neste conto, vemos a inquietação do eu, marca registra da autora. É contada a história de um homem que resolve parar todas as suas atividades para esperar o momento derradeiro. “eu também não queria morrer(...). Coube-me porém antecipar-me aos desígnios.” Narrado em primeira pessoa, o conto vai se desenrolando com o reflexo que tal ato causou no âmbito familiar do narrador, que começa a contar que tudo não passa de uma tradição de família.
Também eu herdara do pai a fadiga de viver(...).”
“(...) o mistério do pai ingressara na minha vida.’
Assim, ele passa a narrar todos os atos de seu pai, quando também decidira abandonar tudo para dedicar-se à abertura de um buraco capaz de comportar ele, sua cama, seu cachorro, seu cavalo (ambos sacrificados), alguns objetos de cozinha e ainda seus trajes comuns.
“E quando ele começou a emagrecer, dedicou-se à abertura de um grande buraco na clareira mais iluminada da floresta. Ali o sol não consentia sombras. E não aceitando ajuda, o trabalho tomou-lhes os últimos anos.”
“(...) logo morreu. Amontoamos ele então entre suas coisas e colocamos a terra de onde havia saído.”
Após, incursionar o leitor pela história de seu pai, o narrador passa a contar a sua própria história, de como organizou tudo, para esperar a morte. Então e nesse momento em que há a fusão entre o narrador e o protagonista. “elegi-me então para acompanhar o pai em sua excentricidade.”
Assim, o narrador conta como preparou uma sala de sua casa fixando no teto objetos estimados por ele, entre esses objetos, caixões para ele, sua esposa e seus filhos, cada qual com seu nome, para evitar brigas.
“Obriguei mulher e filhos a abandonarem a região, a que regressariam quarenta dias depois(...)”
Ates do retorno do seus o protagonista se despede do mundo externo, da fauna e da flora que tanto gostava, pois ele entra para sempre na sala da qual nunca mais sairá. Os filhos ficam de guarda – “em troca do arsenal de prata”- para que nenhuma fraqueza do nosso protagonista impedissem o seu próprio intento. A mulher – “como prometer” – nunca mais voltara à sala onde ele fica deitado, imóvel, olhos fixos no teto, fixo em seus tesouro, esperando a morte. Um de seus filhos, o caçula parece ser o próximo herdeiro de tal excentricidade. O protagonista ainda reflete, em uma narrativa mais que psicológica, sobre a dificuldade de seu corpo ser colocado em um dos caixões fixados no teto.
A narrativa tem o seu final, com o narrador deitado, já muito magro, pois ele deixa também de se alimentar, esperando a morte, e de quando e quando, pensando que ele já morrerá, um dos filhos, o do turno, chama os irmãos para constatar. Mas logo se vê, sua “leve respiração, os sucessivos tremores, sensíveis como um olho fixo” e ele mas do que ninguém, espera pela morte, desabafando:
“Mas, apesar da minha intensa paixão, a morte parece não me desejar.(...)há como é difícil aguardar”
A ausência de um final coerente, algo do tipo, a morte do protagonista ou sua salvação por influência de um dos filhos, não acontece nesse conto, o que o deixa aberto para interpretações possíveis, mas principalmente para retratar a angústia do eu frente a existência, e o esperar por algo que por mais que desejemos não dependerá absolutamente de nós. É assim que o narrador retumba seu final, com a esperança que lhe chegue a morte ou em outras palavras, lhe chegue a nova vida, além de se revelar o segredo universal.
O narrador se encontra em um estado em que colhe o que plantou, pois, assim como seu pai, diante do sentimento de paixão e de preparo para a morte, deixa de comunicar-se com os seus:
“A anos não pronunciou uma só palavra”.
Por isto, seus filhos lutam para tentar segurá-lo em vida. Para que ele se “agarre a vida e levante do berço”. Mas ele parece irresoluto em sua decisão e, já discrentre da vida, aguarda apenas a morte:
“Quero morrer de olhos abertos, contemplando o teto.”
Organização: Professor Francisco Muriel
Análise do Conto: A menina de lá – João Guimarães Rosa.(lit. brasil.)
Análise do Conto: A menina de lá – João Guimarães Rosa.
No isolamento da roça, num lugar chamado “Temor-de-Deus”, localizado atrás da Serra do Mim, vivia uma estranha meninha chamada Nhinhinha. É notável como os topônimos iniciais já conferem ao conto uma aura de misticismo, que será progressivamente mesclado com um processo de sondagem do inconsciente. Nhinhinha inventava estórias absurdas, como a da abelha que se vou para uma nuvem ou da necessidade “de fazer uma lista das coisas todas que no dia por dia a gente vem perdendo. Intercalava suas brincadeiras com frases do tipo “A gente não vê como o vento acaba”, ou “Eu quero ir para lá”.
Quando a família falava dos parentes mortos, ela se ria dizendo: - “Vou visitar eles...” Tiantônia foi a primeira a perceber os dotes paranormais da menina: certa manhã ouviu-a dizer que queria um sapo; instante depois, entra pela sala uma “rã verdíssima”, indo direto para os pés de Nhinhinha. A família decide guardar o segredo:
“(...) não viessem ali os curiosos, gente maldosa e interesseira, com escândalos. Ou os padres, o bispo, quisessem tomar conta da menina, levá-la para sério convento. Ninguém, nem os parentes mais de perto, devia saber. Também, o pai, Tiatônia e a mãe, nem queriam versar conversas, sentiam um medo extraordinário da coisa. Achavam ilusão.”
Muitos prodígios se sucederam: o que ela falava acontecia. Quando a mãe adoecera, suas dores foram aliviadas pelo abraço e beijo quente da filha. Como as terras do roçado estavam secas, anunciando a perda total da colheita, o pai manifesta seu desespero e procura convencer a filha a pedir chuva. Dois dias depois, Nhinhinha “quis” uma arco-íris: choveu e, logo depois, um “vivo cor-de-rosa” desenhou-se no céu! Nesse dia, os pais não entenderam o motivo da menina Ter sido duramente repreendida pela tia. Dissimularam sua revolta, contentes com a perspectiva risonha que o futuro lhe acenava, alimentando projetos de desfrutarem economicamente a paranormalidade da filha. Foi aí que Nhinhinha adoeceu e morreu. Abatidos pela tristeza, os pais, ao tomarem as primeiras providências para um enterro com “acompanhamento de virgens e anjos”, são interrompidos por Tiantônia, que lhes conta o motivo da repressão em Nhinhinha: no dia do arco-íris, a menina dissera que queria um caixãozinho cor-de-rosa com enfeites brilhantes. Diante do derradeiro milagre, os pais como que a beatificam: o conto acaba com a expressão “Santa Nhinhinha”.
Nhinhinha é uma personagem alegórica, que simboliza o lirismo puro da mágica inocência infantil. Ela representa o estágio congênito, inato da sabedoria, numa fase irracional, anterior à consciência lógica. Lembra o arquétipo da “criança primordial” desenvolvida por Jung; segundo essa noção, a criança possui sentido de totalidade ou integridade no conhecimento das coisa, que se manifesta apenas antes do aparecimento do ego consciente, irrompendo sob a forma do misticismo e da ilogicidade.
Análise do Conto: Antiperipléia – João Guimarães Rosa.
Este conto, o primeiro de Tutaméia (ou Terceiras Estórias), terá como protagonista uma personagem muito interessante, pela sua profissão. Prudenciano é guia de cego. “Patrão meu, não. Eu regia – ele me acompanhava(...) ”. Esta atividade foi muito desempenhada por crianças do sertão que por serem parentes do cego mediante remuneração: “ele me dava cachaças, comidas.” passam toda a infância e parte de sua adolescência a vagar com o seu “regido” de vila em vila: “Aqui paramos, os meses, por causa da mulher....”
Porém, esse guia, desde o começo da história, dialoga com um delegado que pede que saia do Vilarejo por causa da misteriosa morte de seô Tomé, homem que ele guiava. Ele hesita, com medo das acusações que todos fazem.
“E vão me deixar ir? Em dês que o meu cego seô Tomé se passou, me vexam, por mim puxam, desconfiam discorrendo. Terra de injustiça.”
Em seu diálogo com o delegado ele diz que há coisas que todos desconhecem, pois o cego encontrava-se escondido com uma mulher, que não tinha, assim, uma aparência tão formosa: “as coisas começam deveras é por detrás do que há, recurso: quando no remate acontecem, estão já desaparecidas.” E pelo fato do delegado não lhe Ter perguntado nada, diz que vai lhe contar o que se sucedera. Começa narrando o seu relacionamento com seô Tomé, e como ele era desejados pelas mulheres. E o cego, sem ver, pedia para que ele – que ao contrário do cego, era feio e pouco desejado - descrevia a formosura das mulheres que a ele desejavam. Um fato interessante é que ambos (o cego e o guia) se invejavam. O guia, para suprir esta falta bebia: “Bebo, para impor em mim amôres dos outros.” E quando o guia se embriagava, o cego tinha de esperá-lo: “Bebo. Tomo até me apagar, vejo outras coisas. Ele carecia de esperar...”
Em um certo dia eles chegam ao vilarejo e logo essa mulher, a Sa Justa, vai pedir ao guia que descreva ela, que era “muito feia”, como uma mulher formoso para o cego, a mais formosa de todas. Diante de tais descrições, o cego logo se apaixona e passa a encontrar-se, às escondidas, com a mulher. Ela, era casada, contudo seu marido desgostava dela. “O marido desgostava dela, druxo homem, de estrambolias, nem vinha em casa..”. Mas era preciso cautela. Assim a cada novo encontro a mulher pedia ao guia que descrevesse malucas belezas. De observar o quanto a mulher ficava com o guia o cego começou a se inciumar. O marido da mulher, que com o guia bebia e já deveria Ter consciência do caso, a toda hora queria o dinheiro da sacola, que era arrecadado pelo cego. Esmolas.
Até que uma certa noite, o cego cai de um precipício, e todos acham que o guia é culpado. Ele, que se embriagara na noite do incidente diz que: “Seô Tomé, no derradeiro, variava: falando que voltara a enxergar.” Assim ele elenca algumas suposições sobre o autor do crime, se assassinato ou o caso de suicídio, pois se o cego realmente tivesse, realmente, voltado a enxergar, avistaria toda a feiura de Justa, pode Ter se desiludido de tal forma e se jogado. Já no caso de assassinato, o primeiro a ser sugerido seria o esposo, que desgostoso com a traição ou até mesmo para roubar a sacola com as esmolas, empurrara o cego ladeira abaixo. Ainda sugere a própria mulher, após Ter tomado consciência de que o cego voltara a enxergar, o empurrara para não ver o assombro de seus traços.
Ele acaba dizendo ao delegado que vai para a cidade somente se for para voltar a guiar cegos.
Organização: Francisco Muriel
No isolamento da roça, num lugar chamado “Temor-de-Deus”, localizado atrás da Serra do Mim, vivia uma estranha meninha chamada Nhinhinha. É notável como os topônimos iniciais já conferem ao conto uma aura de misticismo, que será progressivamente mesclado com um processo de sondagem do inconsciente. Nhinhinha inventava estórias absurdas, como a da abelha que se vou para uma nuvem ou da necessidade “de fazer uma lista das coisas todas que no dia por dia a gente vem perdendo. Intercalava suas brincadeiras com frases do tipo “A gente não vê como o vento acaba”, ou “Eu quero ir para lá”.
Quando a família falava dos parentes mortos, ela se ria dizendo: - “Vou visitar eles...” Tiantônia foi a primeira a perceber os dotes paranormais da menina: certa manhã ouviu-a dizer que queria um sapo; instante depois, entra pela sala uma “rã verdíssima”, indo direto para os pés de Nhinhinha. A família decide guardar o segredo:
“(...) não viessem ali os curiosos, gente maldosa e interesseira, com escândalos. Ou os padres, o bispo, quisessem tomar conta da menina, levá-la para sério convento. Ninguém, nem os parentes mais de perto, devia saber. Também, o pai, Tiatônia e a mãe, nem queriam versar conversas, sentiam um medo extraordinário da coisa. Achavam ilusão.”
Muitos prodígios se sucederam: o que ela falava acontecia. Quando a mãe adoecera, suas dores foram aliviadas pelo abraço e beijo quente da filha. Como as terras do roçado estavam secas, anunciando a perda total da colheita, o pai manifesta seu desespero e procura convencer a filha a pedir chuva. Dois dias depois, Nhinhinha “quis” uma arco-íris: choveu e, logo depois, um “vivo cor-de-rosa” desenhou-se no céu! Nesse dia, os pais não entenderam o motivo da menina Ter sido duramente repreendida pela tia. Dissimularam sua revolta, contentes com a perspectiva risonha que o futuro lhe acenava, alimentando projetos de desfrutarem economicamente a paranormalidade da filha. Foi aí que Nhinhinha adoeceu e morreu. Abatidos pela tristeza, os pais, ao tomarem as primeiras providências para um enterro com “acompanhamento de virgens e anjos”, são interrompidos por Tiantônia, que lhes conta o motivo da repressão em Nhinhinha: no dia do arco-íris, a menina dissera que queria um caixãozinho cor-de-rosa com enfeites brilhantes. Diante do derradeiro milagre, os pais como que a beatificam: o conto acaba com a expressão “Santa Nhinhinha”.
Nhinhinha é uma personagem alegórica, que simboliza o lirismo puro da mágica inocência infantil. Ela representa o estágio congênito, inato da sabedoria, numa fase irracional, anterior à consciência lógica. Lembra o arquétipo da “criança primordial” desenvolvida por Jung; segundo essa noção, a criança possui sentido de totalidade ou integridade no conhecimento das coisa, que se manifesta apenas antes do aparecimento do ego consciente, irrompendo sob a forma do misticismo e da ilogicidade.
Análise do Conto: Antiperipléia – João Guimarães Rosa.
Este conto, o primeiro de Tutaméia (ou Terceiras Estórias), terá como protagonista uma personagem muito interessante, pela sua profissão. Prudenciano é guia de cego. “Patrão meu, não. Eu regia – ele me acompanhava(...) ”. Esta atividade foi muito desempenhada por crianças do sertão que por serem parentes do cego mediante remuneração: “ele me dava cachaças, comidas.” passam toda a infância e parte de sua adolescência a vagar com o seu “regido” de vila em vila: “Aqui paramos, os meses, por causa da mulher....”
Porém, esse guia, desde o começo da história, dialoga com um delegado que pede que saia do Vilarejo por causa da misteriosa morte de seô Tomé, homem que ele guiava. Ele hesita, com medo das acusações que todos fazem.
“E vão me deixar ir? Em dês que o meu cego seô Tomé se passou, me vexam, por mim puxam, desconfiam discorrendo. Terra de injustiça.”
Em seu diálogo com o delegado ele diz que há coisas que todos desconhecem, pois o cego encontrava-se escondido com uma mulher, que não tinha, assim, uma aparência tão formosa: “as coisas começam deveras é por detrás do que há, recurso: quando no remate acontecem, estão já desaparecidas.” E pelo fato do delegado não lhe Ter perguntado nada, diz que vai lhe contar o que se sucedera. Começa narrando o seu relacionamento com seô Tomé, e como ele era desejados pelas mulheres. E o cego, sem ver, pedia para que ele – que ao contrário do cego, era feio e pouco desejado - descrevia a formosura das mulheres que a ele desejavam. Um fato interessante é que ambos (o cego e o guia) se invejavam. O guia, para suprir esta falta bebia: “Bebo, para impor em mim amôres dos outros.” E quando o guia se embriagava, o cego tinha de esperá-lo: “Bebo. Tomo até me apagar, vejo outras coisas. Ele carecia de esperar...”
Em um certo dia eles chegam ao vilarejo e logo essa mulher, a Sa Justa, vai pedir ao guia que descreva ela, que era “muito feia”, como uma mulher formoso para o cego, a mais formosa de todas. Diante de tais descrições, o cego logo se apaixona e passa a encontrar-se, às escondidas, com a mulher. Ela, era casada, contudo seu marido desgostava dela. “O marido desgostava dela, druxo homem, de estrambolias, nem vinha em casa..”. Mas era preciso cautela. Assim a cada novo encontro a mulher pedia ao guia que descrevesse malucas belezas. De observar o quanto a mulher ficava com o guia o cego começou a se inciumar. O marido da mulher, que com o guia bebia e já deveria Ter consciência do caso, a toda hora queria o dinheiro da sacola, que era arrecadado pelo cego. Esmolas.
Até que uma certa noite, o cego cai de um precipício, e todos acham que o guia é culpado. Ele, que se embriagara na noite do incidente diz que: “Seô Tomé, no derradeiro, variava: falando que voltara a enxergar.” Assim ele elenca algumas suposições sobre o autor do crime, se assassinato ou o caso de suicídio, pois se o cego realmente tivesse, realmente, voltado a enxergar, avistaria toda a feiura de Justa, pode Ter se desiludido de tal forma e se jogado. Já no caso de assassinato, o primeiro a ser sugerido seria o esposo, que desgostoso com a traição ou até mesmo para roubar a sacola com as esmolas, empurrara o cego ladeira abaixo. Ainda sugere a própria mulher, após Ter tomado consciência de que o cego voltara a enxergar, o empurrara para não ver o assombro de seus traços.
Ele acaba dizendo ao delegado que vai para a cidade somente se for para voltar a guiar cegos.
Organização: Francisco Muriel
Pompéia: Fonte do Latim Vulgar (filologia)
Pompéia: Fonte do Latim Vulgar
Baseando-se nos escrito das paredes da cidade de Pompéia, destruída pela erupção do vulcão Vesúvio , em 79 de nossa era, este trabalho buscará mostrar que as mensagens grafadas - os graffiti, do latim graphium, ou inscrições parietais - a carvão, nos muros da cidade arrasada, transformaram-se em preciosíssima fonte para os pesquisadores e estudiosos do latim vulgar. São mensagens baseadas em diversos temas como convites sedutores, conselhos, declarações de amor ou ódio, inveja, erotismo, súplicas etc., que mostram a linguagem corrente das classes incultas de Roma da época.
Há exatamente 2026 anos, no dia 24 de agosto de 79 de nossa era, data que deve ser relembrada por pesquisadores e estudiosos do latim vulgar, uma chuva de cinzas e pedra-pomes e sucessivos tremores de terra transformaram o dia, na cidade da Itália, às margens do Mar Tirreno, em noite e destruíram tudo e todos que se opunham a sua passagem.
As cidades de Pompéia e Herculano, no sul da Itália, permaneceram, durante muito tempo, soterradas pela erupção violenta do vulcão,. sob metros e metros de cinzas e pedras. Anos mais tarde, os pesquisadores efetuaram escavações na área soterrada e descobriram um vasto material arqueológico e lingüístico. A vantagem desta descoberta deve-se ao fato de que as mensagens têm um caráter lingüístico e social , revelando duas faces de uma mesma moeda. De um lado, forneceu-nos uma visão da forma de vida da sociedade de uma cidade da provincial, de outro, levou-nos ao estudo das alterações fonéticas, morfológicas e sintáticas de uma das fases da língua latina: o latim vulgar.
Os graffiti contribuíram para o estudo filológico e lingüístico na reconstituição do latim vulgar falado. A epigrafia, ciência que se ocupa da leitura, interpretação e datação das inscrições antigas em material resistente como pedras, metal, argila, cera, etc., em muito contribuiu para o estudo da reconstituição do latim vulgar.
O latim vulgar (vulgo (latim) = povo) ou latim corrente, em oposição ao latim clássico, norma culta do latim, está documentado em textos epigráficos, em textos literários e indiretamente nas línguas românicas. Não conhecemos na totalidade o latim vulgar. O que há, na verdade, são vestígios através dos quais os filólogos tentam reconstituir o que teria sido o latim vulgar.
As inscrições de Pompéia foram estudas por Väänänen, na Le latin Vulgaire des Inscriptions Pompéiennes, Helsinki,1937 (2ª ed.,1958) e reunidas no Corpus Inscriptionum Latinarum, conhecido pela sigla CIL, obra grandiosa editada pela Academia das Ciências de Berlim, iniciada em 1863 e ainda incompleta. Dos dezesseis volumes que compõem esta obra, que reúne inscrições de diversas cidades e regiões, o quarto volume é de grande relevância. Nele, encontram-se registradas as inscrições parietais, gravadas com estiletes, e em menor escala a carvão, em paredes, monumentos, muros, banheiros etc.
Há cerca de 15000 inscrições parietais recolhidas de Pompéia registradas no CIL. Os graffiti são bastante numerosos e diversificados, pelo hábito dos seus habitantes de todas as faixas etárias de rabiscarem as paredes com carvão. O nível de língua das inscrições parietais pompeianas varia bastante. Os habitantes locais zombavam do próprio hábito de rabiscarem as paredes numa linguagem bastante literária, conforme atesta o trecho abaixo:
Admiror, paries, te non cecidisse ruinis, qui tot scriptorum taedia sustineas.
(CIL, IV, 1904)
Admira-me, parede, não teres caído em ruínas, tu que agüenta o tédio de tantos escritores.
Entretanto, para este trabalho interessam apenas os textos que revelam traços típicos do latim vulgar, como no exemplo:
Quisquis ama, valia,
Peria qui nosci amare!
Bis tanti peria quisquis
Amare vota.
CIL,IV, 1173)
Viva todo aquele que ama,
pereça quem não sabe amar!
Duas vezes pereça com tanta intensidade todo aquele que
proíbe o ato de amar
Nele, cabe ressaltar os seguintes elementos:
a) a alta expressividade das antíteses empregadas:
valeat x pereat
amat x nescit amare
amat x amare vetat
b) as consoantes finais da desinência de terceira pessoa do singular (-t) dos verbos de modo finito apocopavam-se.
ama (-t);
valia (-t) ( = valeat)
peria (-t) ( = pereat);
vota (-t);
nosci (-t) ( = nescit);
c) a força da analogia na linguagem corrente em non scit empregado pelo tradicional : nescit
(ne-scio,-ivi,(-ii),-itum: não saber.);
d) a ultracorreção (ou hiperurbanismo) no uso do genitivo de preço:
bis tanti pelo usual bis tanto;
(o genitivo de preço é usado em concorrência com o ablativo de preço para indicar que a avaliação é feita de um modo mais geral, sendo particularmente freqüente com o genitivo de adjetivos e pronomes indefinidos quantitativos como: tanti, quanti etc)
e) uso intenso de arcaísmos:
vota < veta (-t);
f) há no vocábulo valia a evolução do hiato -ea para o ditongo -ia
valia (ditongo) (valeo,-ui,-itum) (e longo de estado): ser forte, ter saúde.(vale!);
Antevendo a palatalização que há em português, conforme vemos a seguir:
valia > valha
l(e,i) + vogal > -lh-: palea > palha;
folia > folha;
juliu > julho;
Assim conclui-se a análise de algumas das inscrições palietais encontradas em nos escombros de Pompéia, ciente de que fica em aberto a análise de várias inscrições que se encontram lá.
Bibliografia:
AUERBACH, Eric. Introdução aos Estudos Literários.Trad. José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1972.
BASSETTO, Bruno Fregni. Elementos de Filologia Românica: história externa das línguas. São Paulo: USP, 2001, v.1.
COUTINHO, Ismael de Lima. Gramática Histórica. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1976.
ELIA, Silvio Edmundo. Preparação à Lingüística Românica. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1979.
ILARI, Rodolfo. Lingüística Românica. 3ª ed. São Paulo: Ática, 2000.
SILVA NETO, Serafim. Manuel de Filologia Portuguesa. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1952.
TORRINHA, Francisco. Dicionário Latino-Português. 7ª ed. Porto: Gráficos Reunidos, [s / d.].
VÄÄNÄNEN, Veikko. Introducción al latin vulgar. Trad. Manuel Carrión. Madrid: Gredos, 1967.
Organização: Professor Francisco Muriel
Baseando-se nos escrito das paredes da cidade de Pompéia, destruída pela erupção do vulcão Vesúvio , em 79 de nossa era, este trabalho buscará mostrar que as mensagens grafadas - os graffiti, do latim graphium, ou inscrições parietais - a carvão, nos muros da cidade arrasada, transformaram-se em preciosíssima fonte para os pesquisadores e estudiosos do latim vulgar. São mensagens baseadas em diversos temas como convites sedutores, conselhos, declarações de amor ou ódio, inveja, erotismo, súplicas etc., que mostram a linguagem corrente das classes incultas de Roma da época.
Há exatamente 2026 anos, no dia 24 de agosto de 79 de nossa era, data que deve ser relembrada por pesquisadores e estudiosos do latim vulgar, uma chuva de cinzas e pedra-pomes e sucessivos tremores de terra transformaram o dia, na cidade da Itália, às margens do Mar Tirreno, em noite e destruíram tudo e todos que se opunham a sua passagem.
As cidades de Pompéia e Herculano, no sul da Itália, permaneceram, durante muito tempo, soterradas pela erupção violenta do vulcão,. sob metros e metros de cinzas e pedras. Anos mais tarde, os pesquisadores efetuaram escavações na área soterrada e descobriram um vasto material arqueológico e lingüístico. A vantagem desta descoberta deve-se ao fato de que as mensagens têm um caráter lingüístico e social , revelando duas faces de uma mesma moeda. De um lado, forneceu-nos uma visão da forma de vida da sociedade de uma cidade da provincial, de outro, levou-nos ao estudo das alterações fonéticas, morfológicas e sintáticas de uma das fases da língua latina: o latim vulgar.
Os graffiti contribuíram para o estudo filológico e lingüístico na reconstituição do latim vulgar falado. A epigrafia, ciência que se ocupa da leitura, interpretação e datação das inscrições antigas em material resistente como pedras, metal, argila, cera, etc., em muito contribuiu para o estudo da reconstituição do latim vulgar.
O latim vulgar (vulgo (latim) = povo) ou latim corrente, em oposição ao latim clássico, norma culta do latim, está documentado em textos epigráficos, em textos literários e indiretamente nas línguas românicas. Não conhecemos na totalidade o latim vulgar. O que há, na verdade, são vestígios através dos quais os filólogos tentam reconstituir o que teria sido o latim vulgar.
As inscrições de Pompéia foram estudas por Väänänen, na Le latin Vulgaire des Inscriptions Pompéiennes, Helsinki,1937 (2ª ed.,1958) e reunidas no Corpus Inscriptionum Latinarum, conhecido pela sigla CIL, obra grandiosa editada pela Academia das Ciências de Berlim, iniciada em 1863 e ainda incompleta. Dos dezesseis volumes que compõem esta obra, que reúne inscrições de diversas cidades e regiões, o quarto volume é de grande relevância. Nele, encontram-se registradas as inscrições parietais, gravadas com estiletes, e em menor escala a carvão, em paredes, monumentos, muros, banheiros etc.
Há cerca de 15000 inscrições parietais recolhidas de Pompéia registradas no CIL. Os graffiti são bastante numerosos e diversificados, pelo hábito dos seus habitantes de todas as faixas etárias de rabiscarem as paredes com carvão. O nível de língua das inscrições parietais pompeianas varia bastante. Os habitantes locais zombavam do próprio hábito de rabiscarem as paredes numa linguagem bastante literária, conforme atesta o trecho abaixo:
Admiror, paries, te non cecidisse ruinis, qui tot scriptorum taedia sustineas.
(CIL, IV, 1904)
Admira-me, parede, não teres caído em ruínas, tu que agüenta o tédio de tantos escritores.
Entretanto, para este trabalho interessam apenas os textos que revelam traços típicos do latim vulgar, como no exemplo:
Quisquis ama, valia,
Peria qui nosci amare!
Bis tanti peria quisquis
Amare vota.
CIL,IV, 1173)
Viva todo aquele que ama,
pereça quem não sabe amar!
Duas vezes pereça com tanta intensidade todo aquele que
proíbe o ato de amar
Nele, cabe ressaltar os seguintes elementos:
a) a alta expressividade das antíteses empregadas:
valeat x pereat
amat x nescit amare
amat x amare vetat
b) as consoantes finais da desinência de terceira pessoa do singular (-t) dos verbos de modo finito apocopavam-se.
ama (-t);
valia (-t) ( = valeat)
peria (-t) ( = pereat);
vota (-t);
nosci (-t) ( = nescit);
c) a força da analogia na linguagem corrente em non scit empregado pelo tradicional : nescit
(ne-scio,-ivi,(-ii),-itum: não saber.);
d) a ultracorreção (ou hiperurbanismo) no uso do genitivo de preço:
bis tanti pelo usual bis tanto;
(o genitivo de preço é usado em concorrência com o ablativo de preço para indicar que a avaliação é feita de um modo mais geral, sendo particularmente freqüente com o genitivo de adjetivos e pronomes indefinidos quantitativos como: tanti, quanti etc)
e) uso intenso de arcaísmos:
vota < veta (-t);
f) há no vocábulo valia a evolução do hiato -ea para o ditongo -ia
valia (ditongo)
Antevendo a palatalização que há em português, conforme vemos a seguir:
valia > valha
l(e,i) + vogal > -lh-: palea > palha;
folia > folha;
juliu > julho;
Assim conclui-se a análise de algumas das inscrições palietais encontradas em nos escombros de Pompéia, ciente de que fica em aberto a análise de várias inscrições que se encontram lá.
Bibliografia:
AUERBACH, Eric. Introdução aos Estudos Literários.Trad. José Paulo Paes. São Paulo: Cultrix, 1972.
BASSETTO, Bruno Fregni. Elementos de Filologia Românica: história externa das línguas. São Paulo: USP, 2001, v.1.
COUTINHO, Ismael de Lima. Gramática Histórica. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1976.
ELIA, Silvio Edmundo. Preparação à Lingüística Românica. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1979.
ILARI, Rodolfo. Lingüística Românica. 3ª ed. São Paulo: Ática, 2000.
SILVA NETO, Serafim. Manuel de Filologia Portuguesa. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1952.
TORRINHA, Francisco. Dicionário Latino-Português. 7ª ed. Porto: Gráficos Reunidos, [s / d.].
VÄÄNÄNEN, Veikko. Introducción al latin vulgar. Trad. Manuel Carrión. Madrid: Gredos, 1967.
Organização: Professor Francisco Muriel
A Formação do léxico Português(filologia)
A Formação do léxico Português
De acordo com Azeredo (2000:72):
“quando a língua portuguesa começou a ser escrita – no início do século XIII – seu léxico reunia cerca de 80% de palavras de origem latina e outros cerca de 20% de palavras pré-romanas, germânicas e árabes.”
Trata-se do acervo vocabular que se pode denominar hereditário, isto é, aquele surgido junto com o idioma, que a ele forneceu padrão fonético e morfológico. A partir do século XIII, fatores diversos colocaram o português em contato com várias outras línguas ao redor do planeta. Como resultado disso, a adoção de numerosas palavras pertencentes a esses idiomas, num processo de enriquecimento contínuo, que ainda hoje se verifica.
Nesse sentido, a língua portuguesa ostenta, em seu pecúlio lexical, vocábulos provenientes de sistemas lingüísticos tão diferentes quanto o provençal, o holandês, o hebraico, o persa e o quíchua ou o chinês, o turco, o japonês, o alemão e o russo, sem falar em idiomas bem mais familiares, como o inglês, o francês, o espanhol e o italiano, os quais, juntamente com muitos outros, ajudaram a moldar esse heterogêneo mosaico que é o léxico português.
Palavras hereditárias e palavras de empréstimo
Aplicando-se ao português uma noção que é pertinente às línguas de modo geral, é possível classificar as palavras que compõem o seu vocabulário em hereditárias e de empréstimo.
As primeiras, elementos do léxico original, “fazem parte de uma tradição lingüística ininterrupta” – Pisani (s/d:57) –, refletindo “as transformações fonéticas que caracterizam o idioma à época dos seus primeiros momentos” – Bechara (1998:116). Transmitidas oralmente, encontram-se identificadas com a fase pré-histórica do idioma, tendo passado por todas as transformações fonéticas do latim ao português, ou seja, são “aquelas que viviam no léxico da língua quando deixou de ser latim para ser identificada como português, numa passagem ininterrupta no tempo e no espaço” – Bechara (2002:217-8).
Nos termos de Melo (1981:158), trata-se do conjunto constituído pelas palavras “que vieram por tradição histórica, de boca a ouvido, através das gerações”. Compreendem não só a base latina popular – indiscutivelmente, o grosso do conjunto –, mas igualmente unidades lexicais de origem pré-românica, isto é, das línguas pertencentes aos povos que habitavam a Península Ibérica antes da chegada dos romanos no século II a.C. (arroio, baía, balsa, barro, bezerro, bico, bizarro, brio, cabana, cama, cambiar, caminho, camisa, carpinteiro, carro, cerveja, esquerdo, garra, gato, gordo, lança, légua, lousa, manto, mapa, mata, peça, saco, sapo, sarna etc.). E pós-românicas, ou seja, germanismos (frutos das invasões bárbaras do século V, por exemplo, albergue, anca, arauto, arreio, banco, bando, banho, branco, brasa, carpa, coifa, elmo, espora, estribo, guerra, roupa, sabão) e arabismos (resultado da presença dos árabes na Península a partir do ano 711, por exemplo, açougue, açude, alcachofra, alface, álgebra, alicate, arroz, azeite, oxalá), as quais contribuíram da mesma maneira para a formação do português.
Baseando-se na forma fonética – “combinação de fonemas concorde com a estrutura fonética de determinada língua” (Jota, 1981:forma fonética) – oferecida pelos itens léxicos pertencentes à camada hereditária, é possível afirmar que gato, leão, leite e mesa podem representar lexemas legitimamente portugueses, ao passo que speranza, felicidad, eau e school não podem, visto estarem em desacordo com os padrões dessa língua.
Melo (1981:149) não fala em palavra hereditária, mas em continuidade lingüística, isto é,
as palavras que compõem o fundo originário do idioma, as palavras herdadas, que nasceram com a língua e receberam a impressão de seus sinais característicos e de suas tendências marcantes.
No caso do português são os vocábulos que se usavam no latim vulgar e no romance portucalense e que continuaram a ser empregados pelo povo na fala de suevos, visigodos e mais gente que habitou a faixa ocidental da Península entre os séculos V e IX. As contribuições germânica e árabe se capitulam nesta primeira fonte.
Por outro lado, palavras de empréstimo são as provenientes de outros sistemas lingüísticos – inclusive do latim, os chamados cultismos ou eruditismos – acolhidas pelo português após o término de seu período de formação. Artificialmente vestidas à portuguesa, denunciam, em maior ou menor grau, sua procedência alienígena.
Conforme observa Robins (1977:324) relativamente à relação francês / latim:
“Evidentemente, o termo empréstimo é apenas usado de modo sensato em relação a uma língua admitida já estar em existência independente. Não se pode considerar o vocabulário do francês, que tem estado em uso contínuo desde a época dos romanos, enquanto ocorreram mudanças lingüísticas constituídas da passagem do latim para o francês, como empréstimos do latim, já que o francês é simplesmente a forma que o latim tomou numa certa parte da Europa.”
Já Bechara (1998:115-6), ao comentar a relação português / latim, afirma que:
“Antigamente, uma forma do tipo pé e mês era chamada popular, e outra do tipo de pedal e mensal era chamada erudita, porque, com pequena adaptação ao gênio do foneticismo português, refletia a integridade da forma originária latina. Hoje, em vez desses nomes, que podem levar o leitor a dar interpretação literal aos adjetivos popular e erudita – e assim entender uma meia verdade –, preferem-se, respectivamente, as expressões hereditário e de empréstimo, para indicarem formas que existiam no léxico na época em que o português se constituiu como tal ou, então, formas que foram introduzidas depois dessa fase.”
Melo (1981:149) conclui:
“Este vocabulário original é o mais importante, não só por ser o mais freqüente no uso comum, mas também por constituir a fôrma (sic) segundo a qual se modelarão, pelo tempo adiante, milhares e milhares de outras palavras, advindas da importação estrangeira ou decorrentes de formação vernácula.”
Cultismos e semicultismos
A maior parte do léxico da língua portuguesa é, como já mencionado anteriormente, de origem latina. A porção mais significativa desse conjunto constitui-se dos itens lexicais populares, nunca é demais repetir, aqueles que, ao longo do tempo, foram sofrendo, na boca do povo, toda uma série de modificações fonéticas espontâneas e contínuas.
Ao lado desses, é possível identificar ainda os chamados cultismos ou eruditismos, introduzidos por via escrita – razão pela qual também são chamados de termos literários – depois que certas mudanças fonéticas não mais ocorriam. É fato conhecido que as leis fonéticas têm uma duração limitada no tempo, apresentando um período específico de atuação. Nesse sentido, é comum que essas palavras apresentem seqüências fonológicas e grupos consonantais evitados pela história do português, tendo havido “apenas a adaptação da parte final aos modelos mórficos portugueses [gênero, número e pessoa] e uma ou outra alteração para evitar grupos anômalos de fonemas (...)” – Câmara Jr. (1991:eruditos).
A absorção desses cultismos foi particularmente significativa durante o Renascimento, mas não se limitou a esse período. Como lembra Coutinho (1976:200), “as traduções de obras, sobretudo latinas, contribuíram para a existência de um grande número de palavras cultas, no nosso vocabulário”.
Em português, alguns adjetivos eruditos relacionam-se a substantivos populares, como nos casos de água / aquoso, céu / celeste ou celestial, dor / doloroso, fogo / ígneo, ilha / insular, lei / legislativo ou legal, luz / lúcido, mês / mensal, neve / nívio, olho / ocular, ouro / áureo, paz / pacífico, povo / popular, touro / taurino e vida / vitalício, enquanto certos superlativos eruditos derivam-se de adjetivos populares, por exemplo, crudelíssimo / cruel, fidelíssimo / fiel, paupérrimo / pobre.
Por vezes, a unidade léxica erudita apresenta a mesma origem de outra popular, o que faz surgir, então, as chamadas formas divergentes (cf., por exemplo, afeição / afecção, avesso / adverso, bola / bula, bucho / músculo, chamar / clamar, chave / clave, circo /círculo, coalhar / coagular, comprar / comparar, contar / computar, cunhado / cognato, dobro / duplo, eira / área, empregar / implicar, escuro / obscuro, estreito / estrito, feição / facção, feitura / fatura, findo / finito, frio / frígido, frouxo / fluxo, geral / general, grude / glúten, herdeiro / hereditário, leal / legal, leigo / laico, livrar / liberar, logro / lucro, lugar / local, macho / másculo, madeira / matéria, mãe / madre, mascar / mastigar, meigo / mágico, meio / médio, miúdo / minuto, paço / palácio, palavra / parábola, pardo / pálido, partilha / partícula, pendência / penitência, pesar / pensar, primeiro / primário, puir / polir, puxar / pulsar, queimar / cremar, ração / razão, recobrar / recuperar, rezar / recitar, rijo / rígido, rolha / rótula, ruído / rugido, sarar / sanar, segredo / secreto, silvar / sibilar, siso / senso, sobrar / superar, soldo / sólido, soma / suma, teia / tela, teso / tenso, traição / tradição, viço / vício.
Mencione-se, ainda, a existência, no léxico do português, das chamadas formas semicultas ou semi-eruditas, espécie de meio-termo entre as cultas e as populares, as quais distinguem-se dessas últimas por “apresent[arem] mudanças fonéticas, mas não as mudanças sistemáticas e fundamentais que constituem o conjunto das leis fonéticas do romanço lusitânico e do protoportuguês” – Câmara Jr. (1991:semi-eruditos).
Referências bibliográficas
ALVES, Ieda Maria. Neologismo: criação lexical. São Paulo: Ática, 1990.
AZEREDO, José Carlos de. Fundamentos de gramática do português. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
BECHARA, Evanildo. As palavras também escondem a idade. In: ELIA, Sílvio et al (org.). Na ponta da língua 1. Rio de Janeiro: Liceu Literário Português; Lucerna, 1998.
––––––. Por que segunda-feira em português? – 2. In: ––– et al (org.). Na Ponta da língua 4. Rio de Janeiro: Liceu Literário Português; Lucerna, 2002.
CÂMARA Jr., Joaquim Mattoso. Dicionário de lingüística e gramática. 15ª ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
COUTINHO, Ismael de Lima. Pontos de gramática histórica. 7ª ed. rev. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1980.
ESTRELA, Edite & PINTO-COREIA, J. David. Guia essencial da língua portuguesa para comunicação social. 5ª ed. Lisboa: Notícias, 2001.
GALISSON, Robert & COSTE, Daniel (coord.). Dicionário de didáctica das línguas. Trad. Adelina Angélica Pinto et al. Coimbra: Almedina, 1983.
JOTA, Zélio dos Santos. Dicionário de lingüística. 2. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1981.
MELO, Gladstone Chaves de. Iniciação à filologia e à lingüística portuguesa. 6. ed. rev. e melh. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1981.
PISANI, Vittore. Linguistica generale e indeuropea. Torino: Rosemberg & Sellier, s/d.
ROBINS, Robert Henri. Lingüística geral. Sup. da trad. Wilson Chrisóstomo Guarany. Porto Alegre: Globo, 1977.
SILVA NETO, Serafim da. História da língua portuguesa. 6. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1992.
VILELA, Mário. O léxico do português: perspectivação geral. In: Filologia e lingüística portuguesa 1. São Paulo: Humanitas – FFLCH/USP, 1997.
Organização: Professor Francisco Muriel
De acordo com Azeredo (2000:72):
“quando a língua portuguesa começou a ser escrita – no início do século XIII – seu léxico reunia cerca de 80% de palavras de origem latina e outros cerca de 20% de palavras pré-romanas, germânicas e árabes.”
Trata-se do acervo vocabular que se pode denominar hereditário, isto é, aquele surgido junto com o idioma, que a ele forneceu padrão fonético e morfológico. A partir do século XIII, fatores diversos colocaram o português em contato com várias outras línguas ao redor do planeta. Como resultado disso, a adoção de numerosas palavras pertencentes a esses idiomas, num processo de enriquecimento contínuo, que ainda hoje se verifica.
Nesse sentido, a língua portuguesa ostenta, em seu pecúlio lexical, vocábulos provenientes de sistemas lingüísticos tão diferentes quanto o provençal, o holandês, o hebraico, o persa e o quíchua ou o chinês, o turco, o japonês, o alemão e o russo, sem falar em idiomas bem mais familiares, como o inglês, o francês, o espanhol e o italiano, os quais, juntamente com muitos outros, ajudaram a moldar esse heterogêneo mosaico que é o léxico português.
Palavras hereditárias e palavras de empréstimo
Aplicando-se ao português uma noção que é pertinente às línguas de modo geral, é possível classificar as palavras que compõem o seu vocabulário em hereditárias e de empréstimo.
As primeiras, elementos do léxico original, “fazem parte de uma tradição lingüística ininterrupta” – Pisani (s/d:57) –, refletindo “as transformações fonéticas que caracterizam o idioma à época dos seus primeiros momentos” – Bechara (1998:116). Transmitidas oralmente, encontram-se identificadas com a fase pré-histórica do idioma, tendo passado por todas as transformações fonéticas do latim ao português, ou seja, são “aquelas que viviam no léxico da língua quando deixou de ser latim para ser identificada como português, numa passagem ininterrupta no tempo e no espaço” – Bechara (2002:217-8).
Nos termos de Melo (1981:158), trata-se do conjunto constituído pelas palavras “que vieram por tradição histórica, de boca a ouvido, através das gerações”. Compreendem não só a base latina popular – indiscutivelmente, o grosso do conjunto –, mas igualmente unidades lexicais de origem pré-românica, isto é, das línguas pertencentes aos povos que habitavam a Península Ibérica antes da chegada dos romanos no século II a.C. (arroio, baía, balsa, barro, bezerro, bico, bizarro, brio, cabana, cama, cambiar, caminho, camisa, carpinteiro, carro, cerveja, esquerdo, garra, gato, gordo, lança, légua, lousa, manto, mapa, mata, peça, saco, sapo, sarna etc.). E pós-românicas, ou seja, germanismos (frutos das invasões bárbaras do século V, por exemplo, albergue, anca, arauto, arreio, banco, bando, banho, branco, brasa, carpa, coifa, elmo, espora, estribo, guerra, roupa, sabão) e arabismos (resultado da presença dos árabes na Península a partir do ano 711, por exemplo, açougue, açude, alcachofra, alface, álgebra, alicate, arroz, azeite, oxalá), as quais contribuíram da mesma maneira para a formação do português.
Baseando-se na forma fonética – “combinação de fonemas concorde com a estrutura fonética de determinada língua” (Jota, 1981:forma fonética) – oferecida pelos itens léxicos pertencentes à camada hereditária, é possível afirmar que gato, leão, leite e mesa podem representar lexemas legitimamente portugueses, ao passo que speranza, felicidad, eau e school não podem, visto estarem em desacordo com os padrões dessa língua.
Melo (1981:149) não fala em palavra hereditária, mas em continuidade lingüística, isto é,
as palavras que compõem o fundo originário do idioma, as palavras herdadas, que nasceram com a língua e receberam a impressão de seus sinais característicos e de suas tendências marcantes.
No caso do português são os vocábulos que se usavam no latim vulgar e no romance portucalense e que continuaram a ser empregados pelo povo na fala de suevos, visigodos e mais gente que habitou a faixa ocidental da Península entre os séculos V e IX. As contribuições germânica e árabe se capitulam nesta primeira fonte.
Por outro lado, palavras de empréstimo são as provenientes de outros sistemas lingüísticos – inclusive do latim, os chamados cultismos ou eruditismos – acolhidas pelo português após o término de seu período de formação. Artificialmente vestidas à portuguesa, denunciam, em maior ou menor grau, sua procedência alienígena.
Conforme observa Robins (1977:324) relativamente à relação francês / latim:
“Evidentemente, o termo empréstimo é apenas usado de modo sensato em relação a uma língua admitida já estar em existência independente. Não se pode considerar o vocabulário do francês, que tem estado em uso contínuo desde a época dos romanos, enquanto ocorreram mudanças lingüísticas constituídas da passagem do latim para o francês, como empréstimos do latim, já que o francês é simplesmente a forma que o latim tomou numa certa parte da Europa.”
Já Bechara (1998:115-6), ao comentar a relação português / latim, afirma que:
“Antigamente, uma forma do tipo pé e mês era chamada popular, e outra do tipo de pedal e mensal era chamada erudita, porque, com pequena adaptação ao gênio do foneticismo português, refletia a integridade da forma originária latina. Hoje, em vez desses nomes, que podem levar o leitor a dar interpretação literal aos adjetivos popular e erudita – e assim entender uma meia verdade –, preferem-se, respectivamente, as expressões hereditário e de empréstimo, para indicarem formas que existiam no léxico na época em que o português se constituiu como tal ou, então, formas que foram introduzidas depois dessa fase.”
Melo (1981:149) conclui:
“Este vocabulário original é o mais importante, não só por ser o mais freqüente no uso comum, mas também por constituir a fôrma (sic) segundo a qual se modelarão, pelo tempo adiante, milhares e milhares de outras palavras, advindas da importação estrangeira ou decorrentes de formação vernácula.”
Cultismos e semicultismos
A maior parte do léxico da língua portuguesa é, como já mencionado anteriormente, de origem latina. A porção mais significativa desse conjunto constitui-se dos itens lexicais populares, nunca é demais repetir, aqueles que, ao longo do tempo, foram sofrendo, na boca do povo, toda uma série de modificações fonéticas espontâneas e contínuas.
Ao lado desses, é possível identificar ainda os chamados cultismos ou eruditismos, introduzidos por via escrita – razão pela qual também são chamados de termos literários – depois que certas mudanças fonéticas não mais ocorriam. É fato conhecido que as leis fonéticas têm uma duração limitada no tempo, apresentando um período específico de atuação. Nesse sentido, é comum que essas palavras apresentem seqüências fonológicas e grupos consonantais evitados pela história do português, tendo havido “apenas a adaptação da parte final aos modelos mórficos portugueses [gênero, número e pessoa] e uma ou outra alteração para evitar grupos anômalos de fonemas (...)” – Câmara Jr. (1991:eruditos).
A absorção desses cultismos foi particularmente significativa durante o Renascimento, mas não se limitou a esse período. Como lembra Coutinho (1976:200), “as traduções de obras, sobretudo latinas, contribuíram para a existência de um grande número de palavras cultas, no nosso vocabulário”.
Em português, alguns adjetivos eruditos relacionam-se a substantivos populares, como nos casos de água / aquoso, céu / celeste ou celestial, dor / doloroso, fogo / ígneo, ilha / insular, lei / legislativo ou legal, luz / lúcido, mês / mensal, neve / nívio, olho / ocular, ouro / áureo, paz / pacífico, povo / popular, touro / taurino e vida / vitalício, enquanto certos superlativos eruditos derivam-se de adjetivos populares, por exemplo, crudelíssimo / cruel, fidelíssimo / fiel, paupérrimo / pobre.
Por vezes, a unidade léxica erudita apresenta a mesma origem de outra popular, o que faz surgir, então, as chamadas formas divergentes (cf., por exemplo, afeição / afecção, avesso / adverso, bola / bula, bucho / músculo, chamar / clamar, chave / clave, circo /círculo, coalhar / coagular, comprar / comparar, contar / computar, cunhado / cognato, dobro / duplo, eira / área, empregar / implicar, escuro / obscuro, estreito / estrito, feição / facção, feitura / fatura, findo / finito, frio / frígido, frouxo / fluxo, geral / general, grude / glúten, herdeiro / hereditário, leal / legal, leigo / laico, livrar / liberar, logro / lucro, lugar / local, macho / másculo, madeira / matéria, mãe / madre, mascar / mastigar, meigo / mágico, meio / médio, miúdo / minuto, paço / palácio, palavra / parábola, pardo / pálido, partilha / partícula, pendência / penitência, pesar / pensar, primeiro / primário, puir / polir, puxar / pulsar, queimar / cremar, ração / razão, recobrar / recuperar, rezar / recitar, rijo / rígido, rolha / rótula, ruído / rugido, sarar / sanar, segredo / secreto, silvar / sibilar, siso / senso, sobrar / superar, soldo / sólido, soma / suma, teia / tela, teso / tenso, traição / tradição, viço / vício.
Mencione-se, ainda, a existência, no léxico do português, das chamadas formas semicultas ou semi-eruditas, espécie de meio-termo entre as cultas e as populares, as quais distinguem-se dessas últimas por “apresent[arem] mudanças fonéticas, mas não as mudanças sistemáticas e fundamentais que constituem o conjunto das leis fonéticas do romanço lusitânico e do protoportuguês” – Câmara Jr. (1991:semi-eruditos).
Referências bibliográficas
ALVES, Ieda Maria. Neologismo: criação lexical. São Paulo: Ática, 1990.
AZEREDO, José Carlos de. Fundamentos de gramática do português. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
BECHARA, Evanildo. As palavras também escondem a idade. In: ELIA, Sílvio et al (org.). Na ponta da língua 1. Rio de Janeiro: Liceu Literário Português; Lucerna, 1998.
––––––. Por que segunda-feira em português? – 2. In: ––– et al (org.). Na Ponta da língua 4. Rio de Janeiro: Liceu Literário Português; Lucerna, 2002.
CÂMARA Jr., Joaquim Mattoso. Dicionário de lingüística e gramática. 15ª ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
COUTINHO, Ismael de Lima. Pontos de gramática histórica. 7ª ed. rev. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1980.
ESTRELA, Edite & PINTO-COREIA, J. David. Guia essencial da língua portuguesa para comunicação social. 5ª ed. Lisboa: Notícias, 2001.
GALISSON, Robert & COSTE, Daniel (coord.). Dicionário de didáctica das línguas. Trad. Adelina Angélica Pinto et al. Coimbra: Almedina, 1983.
JOTA, Zélio dos Santos. Dicionário de lingüística. 2. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1981.
MELO, Gladstone Chaves de. Iniciação à filologia e à lingüística portuguesa. 6. ed. rev. e melh. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1981.
PISANI, Vittore. Linguistica generale e indeuropea. Torino: Rosemberg & Sellier, s/d.
ROBINS, Robert Henri. Lingüística geral. Sup. da trad. Wilson Chrisóstomo Guarany. Porto Alegre: Globo, 1977.
SILVA NETO, Serafim da. História da língua portuguesa. 6. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1992.
VILELA, Mário. O léxico do português: perspectivação geral. In: Filologia e lingüística portuguesa 1. São Paulo: Humanitas – FFLCH/USP, 1997.
Organização: Professor Francisco Muriel
terça-feira, 30 de outubro de 2007
Análise: A Rosa do Povo - C. Drummond de Andrade (Vestibular UEL 2007)
Carlos Drummond de Andrade – “A Rosa do Povo”
O Poeta: Drummond (1902-1987) nasceu em Itabira (MG), fez seus estudos em colégio interno em Belo Horizonte, ate voltar para Itabira, por motivos de doença. Voltou novamente ao internato, porém , agora, no Estado do Rio de Janeiro, o mesmo onde seria expulso anos mais tarde. Formou-se em São Paulo no curso de farmácia - profissão que nunca desempenhou - e como redator de “O Diário de Minas” entrou em contato com os modernistas paulistas. Em 1934, entra para o funcionalismo público e muda-se novamente para o Rio, até que em Agosto de 1987, doze dias depois das morte de sua única filha, faleceu.
Pelo grande número de composições, a análise de suas características, partindo de um único estilo, seria impossível. De acontecimentos Banais, corriqueiros, gestos ou paisagens simples o poeta extrai poesia.
Uma grande porcentagem desses poemas funcionam como denúncia de opressão (DITADURA) e pela violência que marcou a 2º Guerra Mundial. Surge, então, uma literatura com um forte engajamento social. A consciência de estar vivendo um grande marco na história produz a indagação indagação filosófica sobre o sentido da vida.(EXISTÊNCIALSMO). Suas primeiras obras eram verdadeiros “Saudosismos” de sua infância e sua terra natal, depois, a partir da análise de sua experiência individual, da convivência com outros homens, suas obras ganham passa a refletir sobre o existir humana e até mesmo da existência de Deus. De sua Vasta produção, com mais de trinta publicações reunindo crônicas, poesias e contos, pode-se destacar: “Algumas Poesias, A Rosa do Povo, Amar se Aprende Amando e Contos de Aprendizes”.
Característica: Desde o seu batismo de fogo em 1928, com a publicação do célebre “No Meio do Caminho”, na Revista de Antropofagia, Drummond ficou conhecido como “o poeta da pedra”. Ao invés de se sentir ofendido com tal apelido, de origem pejorativa, pois a dureza e até a frieza da pedra marcam a poesia sua poesia, pois ela é dotada não de uma insensibilidade, mas de uma afetividade contida. Torna-se, portanto, um dos pilares da poesia moderna (junto de Bandeira e João Cabral), afastando do lugar nobre de nossa literatura o melodrama, a emoção desbragada, descontrolada e descabelada que por muito tempo imperaram por aqui. Dessa forma, vai sempre se mostrar um eu-lírico discreto ao sentir o seu círculo e o seu mundo até mesmo quando vaza críticas, muitas vezes feitas sob a perspectiva da ironia. Aliás, essa figura de linguagem é muito comum na estética do autor, pois pode ser entendida como uma forma torta de dizer as coisas. Tal caráter está não só na linguagem, mas também pode ser encontrado na maneira deslocada como se relaciona com o seu mundo, o que pode ser justificado pela sua origem, pois é um homem de herança rural, filho de fazendeiros, que acaba se encontrando no ambiente urbano. No entanto, ao invés de esse seu sem jeito tornar-se elemento pejorativo, acaba por dar-lhe uma potência fenomenal na análise social e existencial. Posto à margem do sistema, consegue ter uma visão mais clara e menos comprometida pela alienação dos que se preocupam em cumprir seus compromissos rotineiros. Eis o grande feito de Rosa do Povo.
Contexto Histórico para a produção de “A Rosa do Povo”.
Os Poemas deste livro formam escrito entre 1943 a 1945, período que corresponde:
No Mundo: Os horrores da Guerra assolava o mundo com suas atrocidades. Tudo por causa das Ditaduras de Hitlher (NAZISMO) e Mussolini (FACISMO) e do retalhamento dos países aliados. Neste período, a União Soviética apertava o cerco contra as tropas nazistas e as maiorias das tropas alemãs tinham sida desbaratadas no leste europeu. Por isso, o mundo comovia-se com a ação heróica dos russos (Comunista) e o confronto político (CAPITALISMO X COMUNISMO) que se desenhara desde 1917 (REVOLUÇÃO RUSSA), estava momentaneamente eslipsado na união contra o Nazismo e o Fascismo. Passo-se, então, por partes dos intelectuais ocidentais, a se Ter uma certa empatia não só com o povo russo mais também com o regime comunista.
No Brasil: entre 1937 e 1945, o Brasil assistiu ao “Estado Novo”, Ditadura de Getúlio Vargas que já havia sido o Governo provisório entre 1930 e 1934, criando nesse período a 3º Constituição do Brasil, em que apresentava propostas como o voto secreto, o voto feminino, salário mínimo, jornada de oito horas de trabalho e féria , etc.. Entre 1934 e 1937, Getúlio governa em uma fase Constitucional. Neste período surge o Fascismo e o Nazismo e em 1937 Vargas - diante de eleições marcadas e da consciência de que não venceria - Vargas decreta o “Plano Cohen”, que implantava a Ditadura como proteção contra o os regimes supracitados. Em 1939, começa a Segunda Guerra Mundial e o Brasil, em 1943 é intimado pelos EUA a entrar na guerra em favor dos Países Aliados, sofrendo sanções econômicas se não participassem. Com esta ação contraditória, Vargas vê o declínio de seu governo e a perda de apoios importantes, principalmente dos intelectuais, que dele receberam altos cargos públicos em troca de apoio.
A Rosa do povo
Obra-chave dentro da produção de Drummond, A rosa do povo, publicada em 1945, reflete a maturidade que o poeta alcançou desde sua estréia. Nela, conforme já se afirmou, além de acentuado progresso técnico-formal, estão presentes duas conquistas decisivas para a evolução de nossa literatura: o realismo social, particularmente penetrante e que não se restringe, apenas ao lirismo da poesia engajada; a poesia metapoética, alimentada pela reflexão introspectiva sobre o sentido da escrita como obra de arte. Este é o mais extenso e o mais variado dos livros de Drummond ( 55 poemas, alguns longos). Nele desfilam os principais temas de sua obra; o verso livre e a estrofação irregular alternam com versos de métrica tradicional dispostos em estrofes regulares; o estilo ora é "puro"(elevado, "poético" ), ora é "mesclado"(mistura de elevado e vulgar, sério e grotesco). Livro difícil, é dos mais discutidos e apreciados da poesia moderna brasileira. Obra de linguagem poética com participação social. Os poemas de A rosa do povo foram escritos nos anos sombrios da ditadura de Vargas e da Segunda Guerra Mundial. Os acontecimentos provocam o poeta, que se aproxima da ideologia revolucionária anticapitalista de inspiração socialista, e manifesta sua revolta e sua esperança em poemas indignados e intenso. Temas: eu-estar no mundo ( o amor, a família, o tempo, a velhice), a metapoesia (poesia pela própria poesia), eu igual ao mundo,... Portanto, em A rosa do povo, o poeta testemunha sua reação ante a dor coletiva e a miséria do mundo moderno, com seu mecanismo, seu materialismo, sua falta de humanidade. Essa fase enriqueceu sua essencialidade lírica e emocional, e, através da profunda consciência artística, o poeta atingiu a plenitude, a cristalização, a humanização, sob a forma suave e terna, em que o itabirano mergulha no lençol profundo de sua província e de seus antepassados, para melhor compreender a "máquina do mundo", a angústia de seu tempo, o desarvoramento do homem contemporâneo, com um largo sentimento de fraternidade.
Divisões Temáticas :
A partir de uma divasão feita pelo próprio autor em sua “Antoilogia Poética”, podemos elencar sete temas básicos em “A Rosa do Povo”. Claro que devemos frisar que alguns poemas podem ser enquadrado em mais de um tipo de temas:
1 – A poesia social;
2 – A poesia existencial;
3 – A posia sobre a própria poesia;
4 – O passado;
5 – O amor;
6 – O cotidiano;
7 – Os Amigos;
1- A poesia social: Trata-se da angustia do eu-lírico frente as atrocidades da guerra e do mundo. A partir daí, o poeta torna-se compromissado com a humanidade. Passa-se então, a não Ter uma preocupação com o estado subjetivo do poeta, como também toda a sociedade. Podemos encontrar em na obra: a – A culpa e a responsabiilidade moral; b – O registro puro e simples da ordem política, c – A passagem da náusea para uma perspectiva de nova sociedade; d – A celebração da Nova Ordem. São desta temática poemas como Nosso Tempo, Carrego Comigo, Áporo, Notícias, Carta a Stalingrado, e mais de 20 poemas do livro.
2- Poesia de reflexão existencial: Alguns vêem enlaçados com a poesia de engajamento social e político, outros se sobressaem quanto a interrogação existencial. Estes, são centram-se mais na subjetividade do poeta, desvelando, assim, a impotência do eu-lírico em estabelecer vias comunicantes com os demais seres. Trata-se de uma solidão terrível, pois ela ocorre na grande cidade, cidade antrpofágica e impassível, onde o indivíduo caminha imperceptível por uma multidão sem rostos. Fazem parte deste veio temático: Anoitecer, Desfile, Passagem do Ano, Morte de Avião, entre outros.
3- A Poesia sobre a poesia: a reflexão metapoética constituem uma das vertentes dominantes na obra de Drummond. A poesia é tematizada, na forma característica de poema sobre o poema, e discute o ofício de escrever, a construção do texto, o âmago da linguagem. Os dois poemas que abrem A Rosa do Povo (Considerações do Poema e Procura da Poesia), revela a importância que o peta dá sobre a problematização deste tema.
4- Poesia sobre o passado: As idéias do passado e de suas infinitas recordações afeta profundamente a recordação do Poeta. Em resumo, o passado é apresentado da seguinte maneira: o registro realista do quadro familiar, socio-cultural do interior mineiro no qual passara a infância; evocação de um mundo estritamente pessoal, formado por fatos, palavras e sentimentos que tiveram eco ou atingiram a subjetividade do menino Drummond; a projeção do passado no presente. Poemas: Como um presente, Retrato de Família, etc..
5- Poesia sobre o amor: a questão amorosa ocupa espaço mínimo na obra, com apenas um poema sobre o assunto. “O Mito”. Nele o procedimento humorístico exerce função corrosiva, pondo em xeque todos os valores humanos . e o humor já aparece no título que tem um amplo sentido: um ser ideal (a pessoa amada), o Grande Amor (paixões que a séculos percorria a cultura ocidental.
6- Poesia de Cotidiano: Embora vários texto de tema social de Drummond retratem a vida diária com grande vigor e a inclinação participante do poeta dão a estes versos uma dimensão explicitsamente enganjada, há algo que não encontramos nesses poemas nos de temática cotidiana. Neles, o autor narra ou conta histórias quase como um repórter de linguagem apurada. Em geral são os de leituras mais acessíveis, o que não lhes retiram a beleza. São eles: A morte do leiteiro, Caso de vestido, etc..
7- Os amigos: Em vários de seus livros, o autor faz louvações a personalidades que marcaram a sua existência, seja pela amizade ou seja pela grandeza artística/humana nas obras que produziram. Em A Rosa do Povo, duas longas Odes expressam a referida tendência: Mario de Andrade desce aos infernos e a Flor e a Náusea.
A FLOR E A NÁUSEA
Preso à minha classe e a algumas roupas,/vou de branco pela rua cinzenta./ Melancolias, mercadorias espreitam-me./ Devo seguir até o enjôo?\ Posso, sem armas, revoltar-me?/Olhos sujos no relógio da torre:/Não, o tempo não chegou de completa justiça./O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera./O tempo pobre, o poeta pobre/fundem-se no mesmo impasse./Em vão me tento explicar, os muros são surdos. /Sob a pele das palavras há cifras e códigos./ O sol consola os doentes e não os renova./As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase./Uma flor nasceu na rua!/Vomitar esse tédio sobre a cidade./Quarenta anos e nenhum problema /resolvido, sequer colocado./ Nenhuma carta escrita nem recebida./Todos os homens voltam para casa./Estão menos livres mas levam jornais /E soletram o mundo, sabendo que o perdem./Crimes da terra, como perdoá-los?/Tomei parte em muitos, outros escondi./Alguns achei belos, foram publicados./Crimes suaves, que ajudam a viver./Ração diária de erro, distribuída em casa/Os ferozes padeiros do mal./Os ferozes leiteiros do mal./Pôr fogo em tudo, inclusive em mim./Ao menino de 1918 chamavam anarquista/Porém meu ódio é o melhor de mim//Com ele me salvo//e dou a poucos uma esperança mínima./Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego./Uma flor ainda desbotada//ilude a polícia, rompe o asfalto./Façam completo silêncio, paralisem os negócios/garanto que uma flor nasceu/Sua cor não se percebe/Suas pétalas não se abrem/Seu nome não está nos livros//É feia. Mas é realmente uma flor. /Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde/e lentamente passo a mão nessa forma insegura./Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se/Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico./É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
Nota-se no poema um eu-lírico mergulhado num mundo sufocante, em que tudo é igualado a mercadoria, tudo é tratado como matéria de consumo. Em meio a essa angústia, a existência corre o risco de se mostrar inútil, insignificante, o que justificaria a náusea, o mal-estar. Tudo se torna baixo, vil, marcado por “fezes, maus poemas, alucinações”.
No entanto, em meio a essa clausura sócio-existencial (que pode ser representada pela imagem, na terceira estrofe, do muro), o poeta vislumbra uma saída. Não se trata de idealismo ou mesmo de alienação – o poeta já deu sinais claros no texto de que não é capaz disso. Ou seja, não está imaginando, fantasiando uma mudança – ela de fato está para ocorrer, tanto que já é vislumbrada na última estrofe, com o anúncio de nuvens avolumando-se e das galinhas em pânico. É o nascimento da rosa, símbolo do desabrochar de um mundo novo, o que mantém o poeta vivo em meio a tanto desencanto.
Dois pontos ainda merecem ser observados no presente poema. O primeiro é o fato de que ele, além de ser o resumo das grandes temáticas da obra, acaba por explicar o seu título. Basta notar que, conforme dito no parágrafo anterior, a rosa indica o desabrochar de uma nova realidade, tão esperada pelo poeta. E a expressão “do povo” pode estar ligada a uma tendência esquerdista, socialista, muito presente em vários momentos do livro e anunciadas pela crítica ao universo capitalista na primeira (“Melancolias, mercadorias espreitam-me.”) e terceira estrofes (“Sob a pele das palavras há cifras e códigos.”). O novo mundo, portanto, teria características socialistas.
O outro item é visto pelo estreito relacionamento que “A Flor e a Náusea” estabelece com o poema a seguir, “Áporo”, um dos mais estudados, densos, complexos e enigmáticos da Literatura Brasileira.
Organiação: Professor Francisco Muriel
O Poeta: Drummond (1902-1987) nasceu em Itabira (MG), fez seus estudos em colégio interno em Belo Horizonte, ate voltar para Itabira, por motivos de doença. Voltou novamente ao internato, porém , agora, no Estado do Rio de Janeiro, o mesmo onde seria expulso anos mais tarde. Formou-se em São Paulo no curso de farmácia - profissão que nunca desempenhou - e como redator de “O Diário de Minas” entrou em contato com os modernistas paulistas. Em 1934, entra para o funcionalismo público e muda-se novamente para o Rio, até que em Agosto de 1987, doze dias depois das morte de sua única filha, faleceu.
Pelo grande número de composições, a análise de suas características, partindo de um único estilo, seria impossível. De acontecimentos Banais, corriqueiros, gestos ou paisagens simples o poeta extrai poesia.
Uma grande porcentagem desses poemas funcionam como denúncia de opressão (DITADURA) e pela violência que marcou a 2º Guerra Mundial. Surge, então, uma literatura com um forte engajamento social. A consciência de estar vivendo um grande marco na história produz a indagação indagação filosófica sobre o sentido da vida.(EXISTÊNCIALSMO). Suas primeiras obras eram verdadeiros “Saudosismos” de sua infância e sua terra natal, depois, a partir da análise de sua experiência individual, da convivência com outros homens, suas obras ganham passa a refletir sobre o existir humana e até mesmo da existência de Deus. De sua Vasta produção, com mais de trinta publicações reunindo crônicas, poesias e contos, pode-se destacar: “Algumas Poesias, A Rosa do Povo, Amar se Aprende Amando e Contos de Aprendizes”.
Característica: Desde o seu batismo de fogo em 1928, com a publicação do célebre “No Meio do Caminho”, na Revista de Antropofagia, Drummond ficou conhecido como “o poeta da pedra”. Ao invés de se sentir ofendido com tal apelido, de origem pejorativa, pois a dureza e até a frieza da pedra marcam a poesia sua poesia, pois ela é dotada não de uma insensibilidade, mas de uma afetividade contida. Torna-se, portanto, um dos pilares da poesia moderna (junto de Bandeira e João Cabral), afastando do lugar nobre de nossa literatura o melodrama, a emoção desbragada, descontrolada e descabelada que por muito tempo imperaram por aqui. Dessa forma, vai sempre se mostrar um eu-lírico discreto ao sentir o seu círculo e o seu mundo até mesmo quando vaza críticas, muitas vezes feitas sob a perspectiva da ironia. Aliás, essa figura de linguagem é muito comum na estética do autor, pois pode ser entendida como uma forma torta de dizer as coisas. Tal caráter está não só na linguagem, mas também pode ser encontrado na maneira deslocada como se relaciona com o seu mundo, o que pode ser justificado pela sua origem, pois é um homem de herança rural, filho de fazendeiros, que acaba se encontrando no ambiente urbano. No entanto, ao invés de esse seu sem jeito tornar-se elemento pejorativo, acaba por dar-lhe uma potência fenomenal na análise social e existencial. Posto à margem do sistema, consegue ter uma visão mais clara e menos comprometida pela alienação dos que se preocupam em cumprir seus compromissos rotineiros. Eis o grande feito de Rosa do Povo.
Contexto Histórico para a produção de “A Rosa do Povo”.
Os Poemas deste livro formam escrito entre 1943 a 1945, período que corresponde:
No Mundo: Os horrores da Guerra assolava o mundo com suas atrocidades. Tudo por causa das Ditaduras de Hitlher (NAZISMO) e Mussolini (FACISMO) e do retalhamento dos países aliados. Neste período, a União Soviética apertava o cerco contra as tropas nazistas e as maiorias das tropas alemãs tinham sida desbaratadas no leste europeu. Por isso, o mundo comovia-se com a ação heróica dos russos (Comunista) e o confronto político (CAPITALISMO X COMUNISMO) que se desenhara desde 1917 (REVOLUÇÃO RUSSA), estava momentaneamente eslipsado na união contra o Nazismo e o Fascismo. Passo-se, então, por partes dos intelectuais ocidentais, a se Ter uma certa empatia não só com o povo russo mais também com o regime comunista.
No Brasil: entre 1937 e 1945, o Brasil assistiu ao “Estado Novo”, Ditadura de Getúlio Vargas que já havia sido o Governo provisório entre 1930 e 1934, criando nesse período a 3º Constituição do Brasil, em que apresentava propostas como o voto secreto, o voto feminino, salário mínimo, jornada de oito horas de trabalho e féria , etc.. Entre 1934 e 1937, Getúlio governa em uma fase Constitucional. Neste período surge o Fascismo e o Nazismo e em 1937 Vargas - diante de eleições marcadas e da consciência de que não venceria - Vargas decreta o “Plano Cohen”, que implantava a Ditadura como proteção contra o os regimes supracitados. Em 1939, começa a Segunda Guerra Mundial e o Brasil, em 1943 é intimado pelos EUA a entrar na guerra em favor dos Países Aliados, sofrendo sanções econômicas se não participassem. Com esta ação contraditória, Vargas vê o declínio de seu governo e a perda de apoios importantes, principalmente dos intelectuais, que dele receberam altos cargos públicos em troca de apoio.
A Rosa do povo
Obra-chave dentro da produção de Drummond, A rosa do povo, publicada em 1945, reflete a maturidade que o poeta alcançou desde sua estréia. Nela, conforme já se afirmou, além de acentuado progresso técnico-formal, estão presentes duas conquistas decisivas para a evolução de nossa literatura: o realismo social, particularmente penetrante e que não se restringe, apenas ao lirismo da poesia engajada; a poesia metapoética, alimentada pela reflexão introspectiva sobre o sentido da escrita como obra de arte. Este é o mais extenso e o mais variado dos livros de Drummond ( 55 poemas, alguns longos). Nele desfilam os principais temas de sua obra; o verso livre e a estrofação irregular alternam com versos de métrica tradicional dispostos em estrofes regulares; o estilo ora é "puro"(elevado, "poético" ), ora é "mesclado"(mistura de elevado e vulgar, sério e grotesco). Livro difícil, é dos mais discutidos e apreciados da poesia moderna brasileira. Obra de linguagem poética com participação social. Os poemas de A rosa do povo foram escritos nos anos sombrios da ditadura de Vargas e da Segunda Guerra Mundial. Os acontecimentos provocam o poeta, que se aproxima da ideologia revolucionária anticapitalista de inspiração socialista, e manifesta sua revolta e sua esperança em poemas indignados e intenso. Temas: eu-estar no mundo ( o amor, a família, o tempo, a velhice), a metapoesia (poesia pela própria poesia), eu igual ao mundo,... Portanto, em A rosa do povo, o poeta testemunha sua reação ante a dor coletiva e a miséria do mundo moderno, com seu mecanismo, seu materialismo, sua falta de humanidade. Essa fase enriqueceu sua essencialidade lírica e emocional, e, através da profunda consciência artística, o poeta atingiu a plenitude, a cristalização, a humanização, sob a forma suave e terna, em que o itabirano mergulha no lençol profundo de sua província e de seus antepassados, para melhor compreender a "máquina do mundo", a angústia de seu tempo, o desarvoramento do homem contemporâneo, com um largo sentimento de fraternidade.
Divisões Temáticas :
A partir de uma divasão feita pelo próprio autor em sua “Antoilogia Poética”, podemos elencar sete temas básicos em “A Rosa do Povo”. Claro que devemos frisar que alguns poemas podem ser enquadrado em mais de um tipo de temas:
1 – A poesia social;
2 – A poesia existencial;
3 – A posia sobre a própria poesia;
4 – O passado;
5 – O amor;
6 – O cotidiano;
7 – Os Amigos;
1- A poesia social: Trata-se da angustia do eu-lírico frente as atrocidades da guerra e do mundo. A partir daí, o poeta torna-se compromissado com a humanidade. Passa-se então, a não Ter uma preocupação com o estado subjetivo do poeta, como também toda a sociedade. Podemos encontrar em na obra: a – A culpa e a responsabiilidade moral; b – O registro puro e simples da ordem política, c – A passagem da náusea para uma perspectiva de nova sociedade; d – A celebração da Nova Ordem. São desta temática poemas como Nosso Tempo, Carrego Comigo, Áporo, Notícias, Carta a Stalingrado, e mais de 20 poemas do livro.
2- Poesia de reflexão existencial: Alguns vêem enlaçados com a poesia de engajamento social e político, outros se sobressaem quanto a interrogação existencial. Estes, são centram-se mais na subjetividade do poeta, desvelando, assim, a impotência do eu-lírico em estabelecer vias comunicantes com os demais seres. Trata-se de uma solidão terrível, pois ela ocorre na grande cidade, cidade antrpofágica e impassível, onde o indivíduo caminha imperceptível por uma multidão sem rostos. Fazem parte deste veio temático: Anoitecer, Desfile, Passagem do Ano, Morte de Avião, entre outros.
3- A Poesia sobre a poesia: a reflexão metapoética constituem uma das vertentes dominantes na obra de Drummond. A poesia é tematizada, na forma característica de poema sobre o poema, e discute o ofício de escrever, a construção do texto, o âmago da linguagem. Os dois poemas que abrem A Rosa do Povo (Considerações do Poema e Procura da Poesia), revela a importância que o peta dá sobre a problematização deste tema.
4- Poesia sobre o passado: As idéias do passado e de suas infinitas recordações afeta profundamente a recordação do Poeta. Em resumo, o passado é apresentado da seguinte maneira: o registro realista do quadro familiar, socio-cultural do interior mineiro no qual passara a infância; evocação de um mundo estritamente pessoal, formado por fatos, palavras e sentimentos que tiveram eco ou atingiram a subjetividade do menino Drummond; a projeção do passado no presente. Poemas: Como um presente, Retrato de Família, etc..
5- Poesia sobre o amor: a questão amorosa ocupa espaço mínimo na obra, com apenas um poema sobre o assunto. “O Mito”. Nele o procedimento humorístico exerce função corrosiva, pondo em xeque todos os valores humanos . e o humor já aparece no título que tem um amplo sentido: um ser ideal (a pessoa amada), o Grande Amor (paixões que a séculos percorria a cultura ocidental.
6- Poesia de Cotidiano: Embora vários texto de tema social de Drummond retratem a vida diária com grande vigor e a inclinação participante do poeta dão a estes versos uma dimensão explicitsamente enganjada, há algo que não encontramos nesses poemas nos de temática cotidiana. Neles, o autor narra ou conta histórias quase como um repórter de linguagem apurada. Em geral são os de leituras mais acessíveis, o que não lhes retiram a beleza. São eles: A morte do leiteiro, Caso de vestido, etc..
7- Os amigos: Em vários de seus livros, o autor faz louvações a personalidades que marcaram a sua existência, seja pela amizade ou seja pela grandeza artística/humana nas obras que produziram. Em A Rosa do Povo, duas longas Odes expressam a referida tendência: Mario de Andrade desce aos infernos e a Flor e a Náusea.
A FLOR E A NÁUSEA
Preso à minha classe e a algumas roupas,/vou de branco pela rua cinzenta./ Melancolias, mercadorias espreitam-me./ Devo seguir até o enjôo?\ Posso, sem armas, revoltar-me?/Olhos sujos no relógio da torre:/Não, o tempo não chegou de completa justiça./O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera./O tempo pobre, o poeta pobre/fundem-se no mesmo impasse./Em vão me tento explicar, os muros são surdos. /Sob a pele das palavras há cifras e códigos./ O sol consola os doentes e não os renova./As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase./Uma flor nasceu na rua!/Vomitar esse tédio sobre a cidade./Quarenta anos e nenhum problema /resolvido, sequer colocado./ Nenhuma carta escrita nem recebida./Todos os homens voltam para casa./Estão menos livres mas levam jornais /E soletram o mundo, sabendo que o perdem./Crimes da terra, como perdoá-los?/Tomei parte em muitos, outros escondi./Alguns achei belos, foram publicados./Crimes suaves, que ajudam a viver./Ração diária de erro, distribuída em casa/Os ferozes padeiros do mal./Os ferozes leiteiros do mal./Pôr fogo em tudo, inclusive em mim./Ao menino de 1918 chamavam anarquista/Porém meu ódio é o melhor de mim//Com ele me salvo//e dou a poucos uma esperança mínima./Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego./Uma flor ainda desbotada//ilude a polícia, rompe o asfalto./Façam completo silêncio, paralisem os negócios/garanto que uma flor nasceu/Sua cor não se percebe/Suas pétalas não se abrem/Seu nome não está nos livros//É feia. Mas é realmente uma flor. /Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde/e lentamente passo a mão nessa forma insegura./Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se/Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico./É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
Nota-se no poema um eu-lírico mergulhado num mundo sufocante, em que tudo é igualado a mercadoria, tudo é tratado como matéria de consumo. Em meio a essa angústia, a existência corre o risco de se mostrar inútil, insignificante, o que justificaria a náusea, o mal-estar. Tudo se torna baixo, vil, marcado por “fezes, maus poemas, alucinações”.
No entanto, em meio a essa clausura sócio-existencial (que pode ser representada pela imagem, na terceira estrofe, do muro), o poeta vislumbra uma saída. Não se trata de idealismo ou mesmo de alienação – o poeta já deu sinais claros no texto de que não é capaz disso. Ou seja, não está imaginando, fantasiando uma mudança – ela de fato está para ocorrer, tanto que já é vislumbrada na última estrofe, com o anúncio de nuvens avolumando-se e das galinhas em pânico. É o nascimento da rosa, símbolo do desabrochar de um mundo novo, o que mantém o poeta vivo em meio a tanto desencanto.
Dois pontos ainda merecem ser observados no presente poema. O primeiro é o fato de que ele, além de ser o resumo das grandes temáticas da obra, acaba por explicar o seu título. Basta notar que, conforme dito no parágrafo anterior, a rosa indica o desabrochar de uma nova realidade, tão esperada pelo poeta. E a expressão “do povo” pode estar ligada a uma tendência esquerdista, socialista, muito presente em vários momentos do livro e anunciadas pela crítica ao universo capitalista na primeira (“Melancolias, mercadorias espreitam-me.”) e terceira estrofes (“Sob a pele das palavras há cifras e códigos.”). O novo mundo, portanto, teria características socialistas.
O outro item é visto pelo estreito relacionamento que “A Flor e a Náusea” estabelece com o poema a seguir, “Áporo”, um dos mais estudados, densos, complexos e enigmáticos da Literatura Brasileira.
Organiação: Professor Francisco Muriel
Análise: O Romanceiro da Inconfidência - Cecília Meireles (Vestibular UEL 2007)
O Romanceiro da Inconfidência
Aaautora
Nasceu no Rio de Janeiro em 1901, e faleceu em 1964. A própria Cecília nos conta seus primeiros contatos com a vida e a morte. "Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a morte que docentemente aprendi essas relações entre o efêmero e o eterno (...) Em toda a minha vida , nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade".
Em 1953, após anos de minuciosa pesquisa histórica, vem à luz, O Romanceiro da Inconfidência. Pouco depois, viaja para a Índia onde toma parte de um simpósio sobre Gandhi. Desse contato com o Oriente, surgem Poemas Escritos na Índia e parte das crônicas de Girofla, além da Elegia a Gandhi, traduzida para várias línguas. Conhece ainda Itália, Israel e Porto Rico.
Obra
A) Poesia
Espectros (1919)
Nunca Mais... e Poema dos Poemas (1923)
Baladas para El-Rei (1925)
Viagem (1939)
Vaga Música (1942)
Mar Absoluto (1945)
Retrato Natural (1949)
Amor em Leonoreta (1952)
Doze Noturnos de Holanda e O Aeronauta (1952)
Romanceiro da Inconfidência (1953)
Considerações Gerais
Como o nome sugere, romanceiro é uma coleção de romances.
Romance deve ser entendido, nesse caso, como um gênero de origem medieval, muito característico na península Ibérica, constituído de narrativas breves, sob forma de poemas épico-líricos, que originalmente eram cantados ao som de um instrumento, celebrando as aventuras e proezas de um herói de cavalaria ou fatos da nacionalidade de um povo. Preservadas pela memória popular, oralizados de forma fragmentária pelo povo, algumas ações mudavam de natureza e tomavam vida independente: ao lado das imagens objetivas e da narração, peculiares ao gênero épico-lírico, no qual se impõem notas de emoção e subjetividade, e o gênero dramático-lírico, no qual predominam os diálogos. Etimologicamente, o termo origina-se do latim romanice, ou seja, as narrativas eram feitas no loqui romanice (falar à maneira de Roma).
Segundo Cecília Meireles, anos depois da publicação do Romanceiro, em Ouro Preto, no I Festival da cidade onde se deu a Inconfidência: Muitas vezes me perguntei porque não teria existido um escritor do século XVIII - e houve tantos, em Minas! - que pudesse por escrito essa grandiosa e comovente história. Mas há duzentos anos de distância pode-se entender por que isso não aconteceu, principalmente se levarmos em conta o traumatismo provocado por um episódio desses, em tempos de duros castigos, severas perseguições, lutas sangrentas pela transformação do mundo, em grande parte estruturada por instituições secretas, de invioláveis arquivos.
Também muitas vezes me perguntei se devia obedecer a esse apelo dos meus fantasmas, e tomar o encargo de narrar a estranha história de que haviam participado e de que me obrigaram a participar também, tantos anos depois, de modo tão diferente, porém, com a mesma, ou talvez maior, intensidade.
Sem sombra de pessimismo, posso, no entanto, confirmar por experiência a verdade de que somos sempre e cada vez mais governados pelos mortos.
No decorrer das minhas incertezas e dos meus escrúpulos em aproximar-me de tema tão grave, os fantasmas começaram a repetir suas próprias palavras de outrora: as palavras registradas no depoimento do processo, ou na memória tradicional, vinham muitas vezes e inesperadamente, já metrificadas.(...) Até os nomes de alguns personagens foram versos perfeitos:
"To/más/An/tô/nio/Gon/za/ga"
1 2 3 4 5 6 7
"Do/na/Bár/ba/ra E/lio/do/ra"
1 2 3 4 5 6 7
"Joa/quim/Jo/sé/da/Sil/va/Xa/vi/er"
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Assim, a primeira tentação diante do tema insigne, e conhecendo-se, tanto quanto possível, através dos documentos do tempo, seus pensamentos e sua fala, seria reconstituir a tragédia na forma dramática em que foi vivida, redistribuindo a cada figura o seu verdadeiro papel. Mas se isso bastasse, os documentos oficiais com seus interrogatórios e respostas, suas cartas, sentenças e defesas realizariam a obra de arte ambicionada, e os fantasmas sossegariam, satisfeitos.
Os "Cenários", os "Romances" e as "Falas"
Há três estruturas que se alternam no poema: os romances, os cenários e as falas. Os romances , em número de oitenta e cinco, reconstituem a história, compondo o fio narrativo; os cenários situam os ambientes, marcando as mudanças de atmosfera e localizando os acontecimentos; e as falas representam uma intervenção do poeta-narrador , tecendo comentários e convidando o leitor a refletir sobre os fatos revividos no relato.
Os romances não são dispostos na seqüência cronológica dos acontecimentos; ora aparecem isolados, ora constituem-se em verdadeiros ciclos (o de Chica da Silva, o do Alferes, o de Gonzaga, o da Morte de Tiradentes, o de Gonzaga no exílio, o de Bárbara Heliodora, o da Rainha D. Maria).
Características do Romanceiro
a) A herança simbolista e o espiritualismo: um ar de mistério, de crença no imaterial, no extraterreno, perpassa todo o poema. O culto do etéreo, das palavras aéreas marca a ânsia de dar forma ao informe. Expressões como: atroz labirinto de esquecimento, mistério , esquema sobre-humano, silenciosas vertentes, inexplicáveis torrentes instauram um halo espiritualista de crença no imaterial.
b) A utilização do redondilho maior (verso heptassilábico), sem rimas externas regulares (versos brancos), e a exploração da camada sonora, através de aliterações e assonâncias, conferem à Fala Inicial um tom enfático, declaratório, reforçado pelas exclamações e interrogações.
c) O tom evocativo: o mergulho no passado, no atroz labirinto do tempo, nas ressonâncias incansáveis de Vila Rica revela a ânsia da procura de um significado para os fatos: Ó meio-dia confuso / ó vinte-e-um de abril sinistro, / que intrigas de ouro e de sonho / houve em tua formação? / Quem condena, julga e pune? Quem é culpado e inocente?. É como se a poetisa, evocando Tiradentes na força, questionasse a casa do martírio. Foi a ambição do ouro? Foi o sonho de liberdade que iluminou aquela gente?
d) O tom inquiridor: o clima de mistério e ansiedade, as lacunas históricas incontornáveis e a busca de um sentido para os fatos projetam-se nas interrogativas que surgem a cada momento. Revelando o mistério que envolve até hoje o "embuçado" e a morte de Cláudio Manuel da Costa, o Romance XXXVIII é composto só de interrogações. O embuçado teria sido um mensageiro mascarado, disfaçado, que viera para tentar salvar Cláudio Manuel da Costa: Homem ou mulher? Quem soube? / Veio por si? Foi mandado? / A que horas foi? De que noite? / Visto ou sonhado?.
e) A dualidade: reflete a ambivalência ou ambigüidade que caracterizam as ações do homem - herói e traidor, ódio e amor, punhal e flor, bons e maus, riqueza e miséria. Observe, na Fala Inicial: amores x ódios (v.4); intrigas de outo e de sonho; (v.19); culpado x inocente (v.22); castigo x perdão (v.24), coroas x machados (v.31); mentira x verdade (v.32); ruínas x exaltação (v.43).
Resumo
Podemos dividir os fatos que compõem o Romanceiro em três partes ou ciclos:
a) ciclo do ouro;
b) ciclo do diamante;
c) ciclo da liberdade ou inconfidência com sua ascensão e queda. Aí parece haver uma gradação proposital: ouro/diamante/liberdade.
Como o ouro e o diamante, a liberdade brilhou intensamente nas Minas Gerais, mas como o ouro e o diamante, a liberdade só trouxe desgraças, masmorras e mortes....
a) Ciclo do ouro - O cenário colocado para o ciclo do ouro prenuncia também o ciclo da liberdade, no qual "a mão do Alferes de longe acena" como a querer dizer:
b) Ciclo do diamante - Continua a corrida alucinante. Agora é a vez do diamante nas regiões do Serro Frio e do Tejuco, onde vive o contratador João Fernandes, "dono da terra opulenta". Chega às suas terras, com o fim de persegui-lo, o Conde de Valadares, homem enganoso e fingido. Hospeda na casa de João, que lhe abre a casa e o coração das mulatas, menos o de Chica da Silva. Sua riqueza é imensa e o fingido conde suspira de cobiça:
c) Ciclo da liberdade - A poesia apresenta o cenário onde vão se desenrolar os fatos: enumeração, sobretudo, dos lugares e fixação na névoa que chega às ruas, move a ilusão de tempo e figuras e que trará, fatalmente, o pranto e a saudade.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Aaautora
Nasceu no Rio de Janeiro em 1901, e faleceu em 1964. A própria Cecília nos conta seus primeiros contatos com a vida e a morte. "Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a morte que docentemente aprendi essas relações entre o efêmero e o eterno (...) Em toda a minha vida , nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade".
Em 1953, após anos de minuciosa pesquisa histórica, vem à luz, O Romanceiro da Inconfidência. Pouco depois, viaja para a Índia onde toma parte de um simpósio sobre Gandhi. Desse contato com o Oriente, surgem Poemas Escritos na Índia e parte das crônicas de Girofla, além da Elegia a Gandhi, traduzida para várias línguas. Conhece ainda Itália, Israel e Porto Rico.
Obra
A) Poesia
Espectros (1919)
Nunca Mais... e Poema dos Poemas (1923)
Baladas para El-Rei (1925)
Viagem (1939)
Vaga Música (1942)
Mar Absoluto (1945)
Retrato Natural (1949)
Amor em Leonoreta (1952)
Doze Noturnos de Holanda e O Aeronauta (1952)
Romanceiro da Inconfidência (1953)
Considerações Gerais
Como o nome sugere, romanceiro é uma coleção de romances.
Romance deve ser entendido, nesse caso, como um gênero de origem medieval, muito característico na península Ibérica, constituído de narrativas breves, sob forma de poemas épico-líricos, que originalmente eram cantados ao som de um instrumento, celebrando as aventuras e proezas de um herói de cavalaria ou fatos da nacionalidade de um povo. Preservadas pela memória popular, oralizados de forma fragmentária pelo povo, algumas ações mudavam de natureza e tomavam vida independente: ao lado das imagens objetivas e da narração, peculiares ao gênero épico-lírico, no qual se impõem notas de emoção e subjetividade, e o gênero dramático-lírico, no qual predominam os diálogos. Etimologicamente, o termo origina-se do latim romanice, ou seja, as narrativas eram feitas no loqui romanice (falar à maneira de Roma).
Segundo Cecília Meireles, anos depois da publicação do Romanceiro, em Ouro Preto, no I Festival da cidade onde se deu a Inconfidência: Muitas vezes me perguntei porque não teria existido um escritor do século XVIII - e houve tantos, em Minas! - que pudesse por escrito essa grandiosa e comovente história. Mas há duzentos anos de distância pode-se entender por que isso não aconteceu, principalmente se levarmos em conta o traumatismo provocado por um episódio desses, em tempos de duros castigos, severas perseguições, lutas sangrentas pela transformação do mundo, em grande parte estruturada por instituições secretas, de invioláveis arquivos.
Também muitas vezes me perguntei se devia obedecer a esse apelo dos meus fantasmas, e tomar o encargo de narrar a estranha história de que haviam participado e de que me obrigaram a participar também, tantos anos depois, de modo tão diferente, porém, com a mesma, ou talvez maior, intensidade.
Sem sombra de pessimismo, posso, no entanto, confirmar por experiência a verdade de que somos sempre e cada vez mais governados pelos mortos.
No decorrer das minhas incertezas e dos meus escrúpulos em aproximar-me de tema tão grave, os fantasmas começaram a repetir suas próprias palavras de outrora: as palavras registradas no depoimento do processo, ou na memória tradicional, vinham muitas vezes e inesperadamente, já metrificadas.(...) Até os nomes de alguns personagens foram versos perfeitos:
"To/más/An/tô/nio/Gon/za/ga"
1 2 3 4 5 6 7
"Do/na/Bár/ba/ra E/lio/do/ra"
1 2 3 4 5 6 7
"Joa/quim/Jo/sé/da/Sil/va/Xa/vi/er"
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Assim, a primeira tentação diante do tema insigne, e conhecendo-se, tanto quanto possível, através dos documentos do tempo, seus pensamentos e sua fala, seria reconstituir a tragédia na forma dramática em que foi vivida, redistribuindo a cada figura o seu verdadeiro papel. Mas se isso bastasse, os documentos oficiais com seus interrogatórios e respostas, suas cartas, sentenças e defesas realizariam a obra de arte ambicionada, e os fantasmas sossegariam, satisfeitos.
Os "Cenários", os "Romances" e as "Falas"
Há três estruturas que se alternam no poema: os romances, os cenários e as falas. Os romances , em número de oitenta e cinco, reconstituem a história, compondo o fio narrativo; os cenários situam os ambientes, marcando as mudanças de atmosfera e localizando os acontecimentos; e as falas representam uma intervenção do poeta-narrador , tecendo comentários e convidando o leitor a refletir sobre os fatos revividos no relato.
Os romances não são dispostos na seqüência cronológica dos acontecimentos; ora aparecem isolados, ora constituem-se em verdadeiros ciclos (o de Chica da Silva, o do Alferes, o de Gonzaga, o da Morte de Tiradentes, o de Gonzaga no exílio, o de Bárbara Heliodora, o da Rainha D. Maria).
Características do Romanceiro
a) A herança simbolista e o espiritualismo: um ar de mistério, de crença no imaterial, no extraterreno, perpassa todo o poema. O culto do etéreo, das palavras aéreas marca a ânsia de dar forma ao informe. Expressões como: atroz labirinto de esquecimento, mistério , esquema sobre-humano, silenciosas vertentes, inexplicáveis torrentes instauram um halo espiritualista de crença no imaterial.
b) A utilização do redondilho maior (verso heptassilábico), sem rimas externas regulares (versos brancos), e a exploração da camada sonora, através de aliterações e assonâncias, conferem à Fala Inicial um tom enfático, declaratório, reforçado pelas exclamações e interrogações.
c) O tom evocativo: o mergulho no passado, no atroz labirinto do tempo, nas ressonâncias incansáveis de Vila Rica revela a ânsia da procura de um significado para os fatos: Ó meio-dia confuso / ó vinte-e-um de abril sinistro, / que intrigas de ouro e de sonho / houve em tua formação? / Quem condena, julga e pune? Quem é culpado e inocente?. É como se a poetisa, evocando Tiradentes na força, questionasse a casa do martírio. Foi a ambição do ouro? Foi o sonho de liberdade que iluminou aquela gente?
d) O tom inquiridor: o clima de mistério e ansiedade, as lacunas históricas incontornáveis e a busca de um sentido para os fatos projetam-se nas interrogativas que surgem a cada momento. Revelando o mistério que envolve até hoje o "embuçado" e a morte de Cláudio Manuel da Costa, o Romance XXXVIII é composto só de interrogações. O embuçado teria sido um mensageiro mascarado, disfaçado, que viera para tentar salvar Cláudio Manuel da Costa: Homem ou mulher? Quem soube? / Veio por si? Foi mandado? / A que horas foi? De que noite? / Visto ou sonhado?.
e) A dualidade: reflete a ambivalência ou ambigüidade que caracterizam as ações do homem - herói e traidor, ódio e amor, punhal e flor, bons e maus, riqueza e miséria. Observe, na Fala Inicial: amores x ódios (v.4); intrigas de outo e de sonho; (v.19); culpado x inocente (v.22); castigo x perdão (v.24), coroas x machados (v.31); mentira x verdade (v.32); ruínas x exaltação (v.43).
Resumo
Podemos dividir os fatos que compõem o Romanceiro em três partes ou ciclos:
a) ciclo do ouro;
b) ciclo do diamante;
c) ciclo da liberdade ou inconfidência com sua ascensão e queda. Aí parece haver uma gradação proposital: ouro/diamante/liberdade.
Como o ouro e o diamante, a liberdade brilhou intensamente nas Minas Gerais, mas como o ouro e o diamante, a liberdade só trouxe desgraças, masmorras e mortes....
a) Ciclo do ouro - O cenário colocado para o ciclo do ouro prenuncia também o ciclo da liberdade, no qual "a mão do Alferes de longe acena" como a querer dizer:
b) Ciclo do diamante - Continua a corrida alucinante. Agora é a vez do diamante nas regiões do Serro Frio e do Tejuco, onde vive o contratador João Fernandes, "dono da terra opulenta". Chega às suas terras, com o fim de persegui-lo, o Conde de Valadares, homem enganoso e fingido. Hospeda na casa de João, que lhe abre a casa e o coração das mulatas, menos o de Chica da Silva. Sua riqueza é imensa e o fingido conde suspira de cobiça:
c) Ciclo da liberdade - A poesia apresenta o cenário onde vão se desenrolar os fatos: enumeração, sobretudo, dos lugares e fixação na névoa que chega às ruas, move a ilusão de tempo e figuras e que trará, fatalmente, o pranto e a saudade.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Análise: Mensagem - Fernando Pessoa (Vestibular UEL 2007)
“ Mensagem” de Fernando Pessoa.
Mensagem (1934), foi o único livro em língua portuguesa publicado por Pessoa.
Os poemas do livro estão organizados de forma a compor uma epopéia fragmentária, em que o conjunto dos textos líricos acaba formando um elogio de teor épico a Portugal. Traçando a história do seu país, Pessoa segue por um nacionalismo místico de caráter sebastianista.
O livro Mensagem está dividido em três partes: Brasão, Mar português e O Encoberto.
Na primeira, conta-se a história das glórias portuguesas. Na segunda, são apresentadas as navegações e conquistas marítimas de Portugal. Na terceira, é apresentado o mito sebastianista de retorno de Portugal às épocas de glória.
A primeira parte de Mensagem, Brasão, se estrutura como o brasão português, que é formado por dois campos: um apresenta sete castelos, o outro, cinco quinas. No topo do brasão, estão a coroa e o timbre, que apresenta o grifo, animal mitológico que tem cabeça de leão e asas de águia. Assim se dividem os poemas desta parte, remetendo ao brasão de Portugal. Versam sobre as grandes figuras da história de Portugal, desde Dom Henrique, fundador do Condado Portucalenses, passando por sua esposa, Dona Tareja, e seu filho, primeiro rei de Portugal, Dom Afonso Henriques, até o infante Dom Henrique (1394-1460), fundador da Escola de Sagres e grande fomentador da expansão ultramarina portuguesa, e Afonso de Albuquerque (1462-1515), dominador português do Oriente. Até o mito de Ulisses, que teria fundado a cidade de Ulissepona, depois Lisboa, é apresentado:
"O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo."
A segunda parte, Mar português, apresenta as principais etapas da expansão ultramarina que levou Portugal a ocupar um lugar de destaque no mundo durante os séculos XV e XVI:
"E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é português."
Já a última parte, O Encoberto, apresenta o misticismo em torno da figura de Dom Sebastião, rei de Portugal cuja frota foi dizimada em ataque aos mouros em 1578. Muitas previsões, como a do sapateiro Bandarra e a do padre Antônio Vieira, prevêem o retorno de Dom Sebastião para resgatar o poderio de Portugal, criando o Quinto Império, marcando a supremacia de Portugal sobre o mundo:
"Grécia, Roma, Cristandade,
Europa, os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu dom Sebastião?"
3 – Disserte sobre os conflitos espelhados na poesia de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa.
Heterônimo mais próximo do Ortônimo de pessoa , Álvaro de Campos representa e simboliza o homem de sua época. Em uma relação que aparece na obra de Antônio Quadros, estudioso e critico literário, em que heterônimos e ortônimos são comparados aos quatros elementos, Álvaro de Campos simboliza a água.
Em sua poesia, teremos a representação desse homem moderno, que reflete e exalta o progresso e a modernidade. Tais como: as máquinas, indústrias, grandes construções, avanços laboratoriais e a nova ordem política.
“ Eh-lá-hô fachadas das grandes loja!,
Eh-lás-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!”
Porém, ele analisa as conseqüências causadas por esse novo modo de vida, a mudança comportamental das pessoas, com suas novas profissões, sempre apressadas, a lotar e esvaziar os ônibus, e tendo que gastar seu tempo e dinheiro nas grandes lojas de fachadas luminosas. E como uma visão profética descreve qual será o fim desse avanço.
“ (...) E cuja filha aos oito anos(....)
Masturbam homens de aspectos decente nos vão de escada.(...)
Eh-lá grandes desastres de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágio delicioso dos grandes transatlântico!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali ,acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões(...)
Por isso, vemos espelhado na poesia de Campos, a solidão do homem moderno, impotente e incapaz de se adaptar a esse novo modo de vida, a tristeza de perder sua autonomia e ser transformado em números nas fábricas, rosto na multidão que passa com pressa, quase o atropelando, um homem que vê o mundo atrás de sua
janela, enquanto ninguém sabe que ele está ali. Assim, o poeta torna-se agressivo e viril, cheio de melancolia, preso ao isolamento voluntário.
No plano da Metafísica, Campos assemelha-se a Pessoa ortônimo, pois como ele, acredita na existência da alma, e o corpo é visto como uma prisão onde só há sofrimento, e só a morte pode libertá-lo.
Quanto a linguagem, notamos em sua poesia o uso de onomatopéias, “r-r-r-r-r das engrenagens”, z-z-z-z-z das máquina”, e também das palavras estrangeiras, “Canadian-Pacific, foule, souteneur, etc...”.
Seus versos assumem as características dos versos modernos, desprovidos de metrificação, quase sem rimas, variações das sílabas e das estrofes.
4 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Guardador de Rebanhos”, de Alberto Caeiro.
Heterônimo que mais se distancia do ortônimo de Pessoa, destaca-se por sua afinidade com as coisas naturais e seu único desejo, o de ser poeta.
“Ser poeta não é uma ambição minha,
É minha maneira de estar sozinho”.
É classificado por Antônio Quadros, em sua relação com os quatros elementos como sendo a terra, que tanto será exaltada em seus versos.
Caeiro em sua poesia se mostra tipicamente mundano, ligado as experiência sensoriais, sua felicidade é alcançada quando ele vê e sente as coisas simples do mundo. O poeta nega a metafísica das coisas e diz que misterioso é haver quem pense no mistério e que não devemos pensar nas coisas e sim senti-las
“ Pensar incomoda como andar à chuva.
Quando o vento cresce e parece que chove mais(...)
Pensar é estar doentes dos olhos(...)
Pensar uma flor é vê-la, cheirá-la”
Por negar a existência da metafísica, podemos considera-lo pagão, pois ele não acredita no que não possa ver, logo não acredita em Deus e diz que só acreditaria nele se ele entrasse pela porta de seu quarto e dissesse: “Aqui estou”. Porém adverte.
“Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e o luar
Então acredito nele(...)
Para que chamo-lhe Deus?
Chamo-lhe flores e arvores e montes e luar”
Em perfeita consonância com sua busca de simplicidade e espontaneidade, Alberto Caeiro escreve versos livres (sem métrica regular) e brancos (sem rimas).
5 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Cancioneiro”, de Pessoa ortônimo.
Em o Cancioneiro de Fernando Pessoa Ortônimo ( orto – reto , próprio + nimo- referente à nome), encontraremos uma reflexão que é própria do “homem” Pessoa. Comecemos pela tristeza que nos é revelada nos versos de seu cancioneiro, como algo que é imposto aos homens, e essa, só passa com a morte ou instantaneamente com o sono. Para Antônio Quadros, Pessoa ortonimo, classifica-se como o fogo.
Lembremos de quem foi o “homem” Pessoa, verdadeiro caçador da verdade ( Metafísica) , e isso, segundo seus biógrafos, ele foi buscar no espiritismo, na alquimia, na gnose, e por último no álcool e nas drogas. Em sua poesia também não podia ser diferente. O poeta coloca-se como alguém que é controlado por algo maior, a alma .
“De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo”
E assim, na sua busca insensante, o poeta acaba apegando-se à solidão, onde só a reflexão e a observação parece aliar-se a seu intento dando um tom de efemeridade às coisa mundana.
Um tom de saudosismo de algo ainda não conhecida transborda a alma do poeta.
“Nesta hora mais que em outra choro
O que perdi
Em cinza e ouro rememoro
E nuca eu o vi”.
Essa busca só terá um final na hora derradeira, para quem o poeta clama.
“Toma-me, ó noite eterna
Nos teus braços
E chama-me teu filho”.
Pessoa , apesar de modernista, apresenta em sua poesia, características do Simbolismo, tais como: o saudosismo em seu tema; a beleza métrica com sua rimas perfeitas, abundância de paralelismo e aliterações, e sua maneira intelectualizada de compor.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Mensagem (1934), foi o único livro em língua portuguesa publicado por Pessoa.
Os poemas do livro estão organizados de forma a compor uma epopéia fragmentária, em que o conjunto dos textos líricos acaba formando um elogio de teor épico a Portugal. Traçando a história do seu país, Pessoa segue por um nacionalismo místico de caráter sebastianista.
O livro Mensagem está dividido em três partes: Brasão, Mar português e O Encoberto.
Na primeira, conta-se a história das glórias portuguesas. Na segunda, são apresentadas as navegações e conquistas marítimas de Portugal. Na terceira, é apresentado o mito sebastianista de retorno de Portugal às épocas de glória.
A primeira parte de Mensagem, Brasão, se estrutura como o brasão português, que é formado por dois campos: um apresenta sete castelos, o outro, cinco quinas. No topo do brasão, estão a coroa e o timbre, que apresenta o grifo, animal mitológico que tem cabeça de leão e asas de águia. Assim se dividem os poemas desta parte, remetendo ao brasão de Portugal. Versam sobre as grandes figuras da história de Portugal, desde Dom Henrique, fundador do Condado Portucalenses, passando por sua esposa, Dona Tareja, e seu filho, primeiro rei de Portugal, Dom Afonso Henriques, até o infante Dom Henrique (1394-1460), fundador da Escola de Sagres e grande fomentador da expansão ultramarina portuguesa, e Afonso de Albuquerque (1462-1515), dominador português do Oriente. Até o mito de Ulisses, que teria fundado a cidade de Ulissepona, depois Lisboa, é apresentado:
"O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo."
A segunda parte, Mar português, apresenta as principais etapas da expansão ultramarina que levou Portugal a ocupar um lugar de destaque no mundo durante os séculos XV e XVI:
"E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é português."
Já a última parte, O Encoberto, apresenta o misticismo em torno da figura de Dom Sebastião, rei de Portugal cuja frota foi dizimada em ataque aos mouros em 1578. Muitas previsões, como a do sapateiro Bandarra e a do padre Antônio Vieira, prevêem o retorno de Dom Sebastião para resgatar o poderio de Portugal, criando o Quinto Império, marcando a supremacia de Portugal sobre o mundo:
"Grécia, Roma, Cristandade,
Europa, os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu dom Sebastião?"
3 – Disserte sobre os conflitos espelhados na poesia de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa.
Heterônimo mais próximo do Ortônimo de pessoa , Álvaro de Campos representa e simboliza o homem de sua época. Em uma relação que aparece na obra de Antônio Quadros, estudioso e critico literário, em que heterônimos e ortônimos são comparados aos quatros elementos, Álvaro de Campos simboliza a água.
Em sua poesia, teremos a representação desse homem moderno, que reflete e exalta o progresso e a modernidade. Tais como: as máquinas, indústrias, grandes construções, avanços laboratoriais e a nova ordem política.
“ Eh-lá-hô fachadas das grandes loja!,
Eh-lás-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!”
Porém, ele analisa as conseqüências causadas por esse novo modo de vida, a mudança comportamental das pessoas, com suas novas profissões, sempre apressadas, a lotar e esvaziar os ônibus, e tendo que gastar seu tempo e dinheiro nas grandes lojas de fachadas luminosas. E como uma visão profética descreve qual será o fim desse avanço.
“ (...) E cuja filha aos oito anos(....)
Masturbam homens de aspectos decente nos vão de escada.(...)
Eh-lá grandes desastres de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágio delicioso dos grandes transatlântico!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali ,acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões(...)
Por isso, vemos espelhado na poesia de Campos, a solidão do homem moderno, impotente e incapaz de se adaptar a esse novo modo de vida, a tristeza de perder sua autonomia e ser transformado em números nas fábricas, rosto na multidão que passa com pressa, quase o atropelando, um homem que vê o mundo atrás de sua
janela, enquanto ninguém sabe que ele está ali. Assim, o poeta torna-se agressivo e viril, cheio de melancolia, preso ao isolamento voluntário.
No plano da Metafísica, Campos assemelha-se a Pessoa ortônimo, pois como ele, acredita na existência da alma, e o corpo é visto como uma prisão onde só há sofrimento, e só a morte pode libertá-lo.
Quanto a linguagem, notamos em sua poesia o uso de onomatopéias, “r-r-r-r-r das engrenagens”, z-z-z-z-z das máquina”, e também das palavras estrangeiras, “Canadian-Pacific, foule, souteneur, etc...”.
Seus versos assumem as características dos versos modernos, desprovidos de metrificação, quase sem rimas, variações das sílabas e das estrofes.
4 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Guardador de Rebanhos”, de Alberto Caeiro.
Heterônimo que mais se distancia do ortônimo de Pessoa, destaca-se por sua afinidade com as coisas naturais e seu único desejo, o de ser poeta.
“Ser poeta não é uma ambição minha,
É minha maneira de estar sozinho”.
É classificado por Antônio Quadros, em sua relação com os quatros elementos como sendo a terra, que tanto será exaltada em seus versos.
Caeiro em sua poesia se mostra tipicamente mundano, ligado as experiência sensoriais, sua felicidade é alcançada quando ele vê e sente as coisas simples do mundo. O poeta nega a metafísica das coisas e diz que misterioso é haver quem pense no mistério e que não devemos pensar nas coisas e sim senti-las
“ Pensar incomoda como andar à chuva.
Quando o vento cresce e parece que chove mais(...)
Pensar é estar doentes dos olhos(...)
Pensar uma flor é vê-la, cheirá-la”
Por negar a existência da metafísica, podemos considera-lo pagão, pois ele não acredita no que não possa ver, logo não acredita em Deus e diz que só acreditaria nele se ele entrasse pela porta de seu quarto e dissesse: “Aqui estou”. Porém adverte.
“Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e o luar
Então acredito nele(...)
Para que chamo-lhe Deus?
Chamo-lhe flores e arvores e montes e luar”
Em perfeita consonância com sua busca de simplicidade e espontaneidade, Alberto Caeiro escreve versos livres (sem métrica regular) e brancos (sem rimas).
5 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Cancioneiro”, de Pessoa ortônimo.
Em o Cancioneiro de Fernando Pessoa Ortônimo ( orto – reto , próprio + nimo- referente à nome), encontraremos uma reflexão que é própria do “homem” Pessoa. Comecemos pela tristeza que nos é revelada nos versos de seu cancioneiro, como algo que é imposto aos homens, e essa, só passa com a morte ou instantaneamente com o sono. Para Antônio Quadros, Pessoa ortonimo, classifica-se como o fogo.
Lembremos de quem foi o “homem” Pessoa, verdadeiro caçador da verdade ( Metafísica) , e isso, segundo seus biógrafos, ele foi buscar no espiritismo, na alquimia, na gnose, e por último no álcool e nas drogas. Em sua poesia também não podia ser diferente. O poeta coloca-se como alguém que é controlado por algo maior, a alma .
“De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo”
E assim, na sua busca insensante, o poeta acaba apegando-se à solidão, onde só a reflexão e a observação parece aliar-se a seu intento dando um tom de efemeridade às coisa mundana.
Um tom de saudosismo de algo ainda não conhecida transborda a alma do poeta.
“Nesta hora mais que em outra choro
O que perdi
Em cinza e ouro rememoro
E nuca eu o vi”.
Essa busca só terá um final na hora derradeira, para quem o poeta clama.
“Toma-me, ó noite eterna
Nos teus braços
E chama-me teu filho”.
Pessoa , apesar de modernista, apresenta em sua poesia, características do Simbolismo, tais como: o saudosismo em seu tema; a beleza métrica com sua rimas perfeitas, abundância de paralelismo e aliterações, e sua maneira intelectualizada de compor.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Análise: Mensagem - Fernando Pessoa (Vestibular UEL 2007)
“ Mensagem” de Fernando Pessoa.
Mensagem (1934), foi o único livro em língua portuguesa publicado por Pessoa.
Os poemas do livro estão organizados de forma a compor uma epopéia fragmentária, em que o conjunto dos textos líricos acaba formando um elogio de teor épico a Portugal. Traçando a história do seu país, Pessoa segue por um nacionalismo místico de caráter sebastianista.
O livro Mensagem está dividido em três partes: Brasão, Mar português e O Encoberto.
Na primeira, conta-se a história das glórias portuguesas. Na segunda, são apresentadas as navegações e conquistas marítimas de Portugal. Na terceira, é apresentado o mito sebastianista de retorno de Portugal às épocas de glória.
A primeira parte de Mensagem, Brasão, se estrutura como o brasão português, que é formado por dois campos: um apresenta sete castelos, o outro, cinco quinas. No topo do brasão, estão a coroa e o timbre, que apresenta o grifo, animal mitológico que tem cabeça de leão e asas de águia. Assim se dividem os poemas desta parte, remetendo ao brasão de Portugal. Versam sobre as grandes figuras da história de Portugal, desde Dom Henrique, fundador do Condado Portucalenses, passando por sua esposa, Dona Tareja, e seu filho, primeiro rei de Portugal, Dom Afonso Henriques, até o infante Dom Henrique (1394-1460), fundador da Escola de Sagres e grande fomentador da expansão ultramarina portuguesa, e Afonso de Albuquerque (1462-1515), dominador português do Oriente. Até o mito de Ulisses, que teria fundado a cidade de Ulissepona, depois Lisboa, é apresentado:
"O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo."
A segunda parte, Mar português, apresenta as principais etapas da expansão ultramarina que levou Portugal a ocupar um lugar de destaque no mundo durante os séculos XV e XVI:
"E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é português."
Já a última parte, O Encoberto, apresenta o misticismo em torno da figura de Dom Sebastião, rei de Portugal cuja frota foi dizimada em ataque aos mouros em 1578. Muitas previsões, como a do sapateiro Bandarra e a do padre Antônio Vieira, prevêem o retorno de Dom Sebastião para resgatar o poderio de Portugal, criando o Quinto Império, marcando a supremacia de Portugal sobre o mundo:
"Grécia, Roma, Cristandade,
Europa, os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu dom Sebastião?"
3 – Disserte sobre os conflitos espelhados na poesia de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa.
Heterônimo mais próximo do Ortônimo de pessoa , Álvaro de Campos representa e simboliza o homem de sua época. Em uma relação que aparece na obra de Antônio Quadros, estudioso e critico literário, em que heterônimos e ortônimos são comparados aos quatros elementos, Álvaro de Campos simboliza a água.
Em sua poesia, teremos a representação desse homem moderno, que reflete e exalta o progresso e a modernidade. Tais como: as máquinas, indústrias, grandes construções, avanços laboratoriais e a nova ordem política.
“ Eh-lá-hô fachadas das grandes loja!,
Eh-lás-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!”
Porém, ele analisa as conseqüências causadas por esse novo modo de vida, a mudança comportamental das pessoas, com suas novas profissões, sempre apressadas, a lotar e esvaziar os ônibus, e tendo que gastar seu tempo e dinheiro nas grandes lojas de fachadas luminosas. E como uma visão profética descreve qual será o fim desse avanço.
“ (...) E cuja filha aos oito anos(....)
Masturbam homens de aspectos decente nos vão de escada.(...)
Eh-lá grandes desastres de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágio delicioso dos grandes transatlântico!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali ,acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões(...)
Por isso, vemos espelhado na poesia de Campos, a solidão do homem moderno, impotente e incapaz de se adaptar a esse novo modo de vida, a tristeza de perder sua autonomia e ser transformado em números nas fábricas, rosto na multidão que passa com pressa, quase o atropelando, um homem que vê o mundo atrás de sua
janela, enquanto ninguém sabe que ele está ali. Assim, o poeta torna-se agressivo e viril, cheio de melancolia, preso ao isolamento voluntário.
No plano da Metafísica, Campos assemelha-se a Pessoa ortônimo, pois como ele, acredita na existência da alma, e o corpo é visto como uma prisão onde só há sofrimento, e só a morte pode libertá-lo.
Quanto a linguagem, notamos em sua poesia o uso de onomatopéias, “r-r-r-r-r das engrenagens”, z-z-z-z-z das máquina”, e também das palavras estrangeiras, “Canadian-Pacific, foule, souteneur, etc...”.
Seus versos assumem as características dos versos modernos, desprovidos de metrificação, quase sem rimas, variações das sílabas e das estrofes.
4 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Guardador de Rebanhos”, de Alberto Caeiro.
Heterônimo que mais se distancia do ortônimo de Pessoa, destaca-se por sua afinidade com as coisas naturais e seu único desejo, o de ser poeta.
“Ser poeta não é uma ambição minha,
É minha maneira de estar sozinho”.
É classificado por Antônio Quadros, em sua relação com os quatros elementos como sendo a terra, que tanto será exaltada em seus versos.
Caeiro em sua poesia se mostra tipicamente mundano, ligado as experiência sensoriais, sua felicidade é alcançada quando ele vê e sente as coisas simples do mundo. O poeta nega a metafísica das coisas e diz que misterioso é haver quem pense no mistério e que não devemos pensar nas coisas e sim senti-las
“ Pensar incomoda como andar à chuva.
Quando o vento cresce e parece que chove mais(...)
Pensar é estar doentes dos olhos(...)
Pensar uma flor é vê-la, cheirá-la”
Por negar a existência da metafísica, podemos considera-lo pagão, pois ele não acredita no que não possa ver, logo não acredita em Deus e diz que só acreditaria nele se ele entrasse pela porta de seu quarto e dissesse: “Aqui estou”. Porém adverte.
“Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e o luar
Então acredito nele(...)
Para que chamo-lhe Deus?
Chamo-lhe flores e arvores e montes e luar”
Em perfeita consonância com sua busca de simplicidade e espontaneidade, Alberto Caeiro escreve versos livres (sem métrica regular) e brancos (sem rimas).
5 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Cancioneiro”, de Pessoa ortônimo.
Em o Cancioneiro de Fernando Pessoa Ortônimo ( orto – reto , próprio + nimo- referente à nome), encontraremos uma reflexão que é própria do “homem” Pessoa. Comecemos pela tristeza que nos é revelada nos versos de seu cancioneiro, como algo que é imposto aos homens, e essa, só passa com a morte ou instantaneamente com o sono. Para Antônio Quadros, Pessoa ortonimo, classifica-se como o fogo.
Lembremos de quem foi o “homem” Pessoa, verdadeiro caçador da verdade ( Metafísica) , e isso, segundo seus biógrafos, ele foi buscar no espiritismo, na alquimia, na gnose, e por último no álcool e nas drogas. Em sua poesia também não podia ser diferente. O poeta coloca-se como alguém que é controlado por algo maior, a alma .
“De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo”
E assim, na sua busca insensante, o poeta acaba apegando-se à solidão, onde só a reflexão e a observação parece aliar-se a seu intento dando um tom de efemeridade às coisa mundana.
Um tom de saudosismo de algo ainda não conhecida transborda a alma do poeta.
“Nesta hora mais que em outra choro
O que perdi
Em cinza e ouro rememoro
E nuca eu o vi”.
Essa busca só terá um final na hora derradeira, para quem o poeta clama.
“Toma-me, ó noite eterna
Nos teus braços
E chama-me teu filho”.
Pessoa , apesar de modernista, apresenta em sua poesia, características do Simbolismo, tais como: o saudosismo em seu tema; a beleza métrica com sua rimas perfeitas, abundância de paralelismo e aliterações, e sua maneira intelectualizada de compor.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Mensagem (1934), foi o único livro em língua portuguesa publicado por Pessoa.
Os poemas do livro estão organizados de forma a compor uma epopéia fragmentária, em que o conjunto dos textos líricos acaba formando um elogio de teor épico a Portugal. Traçando a história do seu país, Pessoa segue por um nacionalismo místico de caráter sebastianista.
O livro Mensagem está dividido em três partes: Brasão, Mar português e O Encoberto.
Na primeira, conta-se a história das glórias portuguesas. Na segunda, são apresentadas as navegações e conquistas marítimas de Portugal. Na terceira, é apresentado o mito sebastianista de retorno de Portugal às épocas de glória.
A primeira parte de Mensagem, Brasão, se estrutura como o brasão português, que é formado por dois campos: um apresenta sete castelos, o outro, cinco quinas. No topo do brasão, estão a coroa e o timbre, que apresenta o grifo, animal mitológico que tem cabeça de leão e asas de águia. Assim se dividem os poemas desta parte, remetendo ao brasão de Portugal. Versam sobre as grandes figuras da história de Portugal, desde Dom Henrique, fundador do Condado Portucalenses, passando por sua esposa, Dona Tareja, e seu filho, primeiro rei de Portugal, Dom Afonso Henriques, até o infante Dom Henrique (1394-1460), fundador da Escola de Sagres e grande fomentador da expansão ultramarina portuguesa, e Afonso de Albuquerque (1462-1515), dominador português do Oriente. Até o mito de Ulisses, que teria fundado a cidade de Ulissepona, depois Lisboa, é apresentado:
"O mito é o nada que é tudo.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo."
A segunda parte, Mar português, apresenta as principais etapas da expansão ultramarina que levou Portugal a ocupar um lugar de destaque no mundo durante os séculos XV e XVI:
"E ao imenso e possível oceano
Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
Que o mar com fim será grego ou romano:
O mar sem fim é português."
Já a última parte, O Encoberto, apresenta o misticismo em torno da figura de Dom Sebastião, rei de Portugal cuja frota foi dizimada em ataque aos mouros em 1578. Muitas previsões, como a do sapateiro Bandarra e a do padre Antônio Vieira, prevêem o retorno de Dom Sebastião para resgatar o poderio de Portugal, criando o Quinto Império, marcando a supremacia de Portugal sobre o mundo:
"Grécia, Roma, Cristandade,
Europa, os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu dom Sebastião?"
3 – Disserte sobre os conflitos espelhados na poesia de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa.
Heterônimo mais próximo do Ortônimo de pessoa , Álvaro de Campos representa e simboliza o homem de sua época. Em uma relação que aparece na obra de Antônio Quadros, estudioso e critico literário, em que heterônimos e ortônimos são comparados aos quatros elementos, Álvaro de Campos simboliza a água.
Em sua poesia, teremos a representação desse homem moderno, que reflete e exalta o progresso e a modernidade. Tais como: as máquinas, indústrias, grandes construções, avanços laboratoriais e a nova ordem política.
“ Eh-lá-hô fachadas das grandes loja!,
Eh-lás-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!”
Porém, ele analisa as conseqüências causadas por esse novo modo de vida, a mudança comportamental das pessoas, com suas novas profissões, sempre apressadas, a lotar e esvaziar os ônibus, e tendo que gastar seu tempo e dinheiro nas grandes lojas de fachadas luminosas. E como uma visão profética descreve qual será o fim desse avanço.
“ (...) E cuja filha aos oito anos(....)
Masturbam homens de aspectos decente nos vão de escada.(...)
Eh-lá grandes desastres de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágio delicioso dos grandes transatlântico!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali ,acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões(...)
Por isso, vemos espelhado na poesia de Campos, a solidão do homem moderno, impotente e incapaz de se adaptar a esse novo modo de vida, a tristeza de perder sua autonomia e ser transformado em números nas fábricas, rosto na multidão que passa com pressa, quase o atropelando, um homem que vê o mundo atrás de sua
janela, enquanto ninguém sabe que ele está ali. Assim, o poeta torna-se agressivo e viril, cheio de melancolia, preso ao isolamento voluntário.
No plano da Metafísica, Campos assemelha-se a Pessoa ortônimo, pois como ele, acredita na existência da alma, e o corpo é visto como uma prisão onde só há sofrimento, e só a morte pode libertá-lo.
Quanto a linguagem, notamos em sua poesia o uso de onomatopéias, “r-r-r-r-r das engrenagens”, z-z-z-z-z das máquina”, e também das palavras estrangeiras, “Canadian-Pacific, foule, souteneur, etc...”.
Seus versos assumem as características dos versos modernos, desprovidos de metrificação, quase sem rimas, variações das sílabas e das estrofes.
4 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Guardador de Rebanhos”, de Alberto Caeiro.
Heterônimo que mais se distancia do ortônimo de Pessoa, destaca-se por sua afinidade com as coisas naturais e seu único desejo, o de ser poeta.
“Ser poeta não é uma ambição minha,
É minha maneira de estar sozinho”.
É classificado por Antônio Quadros, em sua relação com os quatros elementos como sendo a terra, que tanto será exaltada em seus versos.
Caeiro em sua poesia se mostra tipicamente mundano, ligado as experiência sensoriais, sua felicidade é alcançada quando ele vê e sente as coisas simples do mundo. O poeta nega a metafísica das coisas e diz que misterioso é haver quem pense no mistério e que não devemos pensar nas coisas e sim senti-las
“ Pensar incomoda como andar à chuva.
Quando o vento cresce e parece que chove mais(...)
Pensar é estar doentes dos olhos(...)
Pensar uma flor é vê-la, cheirá-la”
Por negar a existência da metafísica, podemos considera-lo pagão, pois ele não acredita no que não possa ver, logo não acredita em Deus e diz que só acreditaria nele se ele entrasse pela porta de seu quarto e dissesse: “Aqui estou”. Porém adverte.
“Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e o luar
Então acredito nele(...)
Para que chamo-lhe Deus?
Chamo-lhe flores e arvores e montes e luar”
Em perfeita consonância com sua busca de simplicidade e espontaneidade, Alberto Caeiro escreve versos livres (sem métrica regular) e brancos (sem rimas).
5 – Disserte sobre as reflexões presentes em “O Cancioneiro”, de Pessoa ortônimo.
Em o Cancioneiro de Fernando Pessoa Ortônimo ( orto – reto , próprio + nimo- referente à nome), encontraremos uma reflexão que é própria do “homem” Pessoa. Comecemos pela tristeza que nos é revelada nos versos de seu cancioneiro, como algo que é imposto aos homens, e essa, só passa com a morte ou instantaneamente com o sono. Para Antônio Quadros, Pessoa ortonimo, classifica-se como o fogo.
Lembremos de quem foi o “homem” Pessoa, verdadeiro caçador da verdade ( Metafísica) , e isso, segundo seus biógrafos, ele foi buscar no espiritismo, na alquimia, na gnose, e por último no álcool e nas drogas. Em sua poesia também não podia ser diferente. O poeta coloca-se como alguém que é controlado por algo maior, a alma .
“De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo”
E assim, na sua busca insensante, o poeta acaba apegando-se à solidão, onde só a reflexão e a observação parece aliar-se a seu intento dando um tom de efemeridade às coisa mundana.
Um tom de saudosismo de algo ainda não conhecida transborda a alma do poeta.
“Nesta hora mais que em outra choro
O que perdi
Em cinza e ouro rememoro
E nuca eu o vi”.
Essa busca só terá um final na hora derradeira, para quem o poeta clama.
“Toma-me, ó noite eterna
Nos teus braços
E chama-me teu filho”.
Pessoa , apesar de modernista, apresenta em sua poesia, características do Simbolismo, tais como: o saudosismo em seu tema; a beleza métrica com sua rimas perfeitas, abundância de paralelismo e aliterações, e sua maneira intelectualizada de compor.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Análise: Dom Casmurro - Machado de Assis (Vestibular UEL 2007)
Dom Casmurro - Machado de Assis
Vivendo no Engenho Novo, um subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, quase recluso em sua casa, construída segundo o molde da que fora a de sua infância, na Rua de Matacavalos, Bento de Albuquerque Santiago, com cerca de 54 anos e conhecido pela alcunha de Dom Casmurro por seu gosto pelo isolamento, decide escrever sua vida.Alternando a narração dos fatos passados com a reflexão sobre os mesmos, no presente, o protagonista/narrador informa ter nascido em 1842 e ser filho de Pedro de Albuquerque Santiago e de D. Maria da Glória Fernandes Santiago. O pai, dono de uma fazendola em ltaguaí, mudara-se para a cidade do Rio de Janeiro por volta de 1844, ao ser eleito deputado. Alguns anos depois falece e a viúva, preferindo ficar na cidade a retornar a ltaguaí, vende a fazendola e os escravos, aplica seu dinheiro em imóveis e apólices e passa a viver de rendas, permanecendo na casa de Matacavalos, onde vivera com o marido desde a mudança para o Rio de Janeiro.A vida do protagonista/narrador transcorre sem maiores incidentes até a "célebre tarde de novembro" de 1857, quando, ao entrar em casa, ouve pronunciarem seu nome e esconde-se rapidamente atrás da porta. Na conversa entre sua mãe e o agregado José Dias, que morava com a família desde os tempos de ltaguaí, Bentinho, como era então chamado, fica sabendo que sua mãe se mantém firme na intenção de colocá-lo no seminário a fim de seguir a carreira eclesiástica, segundo promessa que fizera a Deus caso tivesse um segundo filho varão, já que o primeiro morrera ao nascer.Bentinho, que há muito tinha conhecimento das intenções de sua mãe, sofre violento abalo, pois fica sabendo que a reativação da promessa, que parecia esquecida, devia-se ao fato de José Dias ter informado D. Glória a respeito de seu incipiente namoro com Capitolina Pádua, que morava na casa ao lado. Capitu, como era chamada, tinha então catorze anos e era filha de um tal de Pádua, burocrata de uma repartição do Ministério da Guerra. A proximidade, a convivência e a idade haviam feito com que os dois adolescentes criassem afeição um pelo outro. D. Glória, ao saber disto, fica alarmada e decide apressar o cumprimento da promessa. Os planos de Capitu, informada do assunto, e Bentinho para, com a ajuda de José Dias, impedir que D. Glória cumprisse a decisão ou que, pelo menos, a adiasse, fracassam. Como último recurso, o próprio Bentinho revela à mãe não ter vocação, o que também não a faz voltar atrás. Tio Cosme, um viúvo, irmão de D. Glória e advogado aposentado que vivia na casa desde que seu cunhado falecera, e a prima Justina, também viúva, que, há muitos anos, morava com a mãe de Bentinho, procuram não se envolver no problema. Assim, a última palavra fica com D. Glória, que, com o apoio do padre Cabral, um amigo de Tio Cosme, decide finalmente cumprir a promessa e o envia ao seminário, prometendo, contudo, que se dentro de dois anos não revelasse vocação para o sacerdócio estaria livre para seguir outra carreira. Antes da partida de Bentinho, este e Capitu juram casar-se.No seminário, Bentinho conhece Ezequiel de Sousa Escobar, filho de um advogado de Curitiba. Os dois tornam-se amigos e confidentes. Em um fim de semana em que Bentinho visita D. Glória, Escobar o acompanha e é apresentado a todos, inclusive a Capitu. Esta, depois da partida de Bentinho, começara a freqüentar assiduamente a casa de D. Glória, do que nascera aos poucos grande afeição recíproca, a ponto de D. Glória começar a pensar que se Bentinho se apaixonasse por Capitu e casasse com ela a questão da promessa estaria resolvida a contento de todos, pois Bentinho, que a quebraria, não a fizera, e ela, que a fizera, não a quebraria.Enquanto isto, Bentinho continuava seus esforços junto a José Dias, que, tendo fracassado em seu plano de fazê-lo estudar medicina na Europa, sugeria agora que ambos fossem a Roma pedir ao Papa a revogação da promessa. A solução definitiva, contudo, partiu de Escobar. Segundo este, D. Glória prometera a Deus dar-lhe um sacerdote, mas isto não queria dizer que o mesmo deveria ser necessariamente seu filho. Sugeriu então que ela adotasse algum órfão e lhe custeasse os estudos. D. Glória consultou o padre Cabral, este foi consultar o bispo e a solução foi considerada satisfatória. Livre do problema, Bentinho deixa o seminário com cerca de 17 anos e vai a São Paulo estudar, tornando-se, cinco anos depois, o advogado Bento de Albuquerque Santiago. Por sua parte, Escobar, que também saíra do seminário, tornara-se um comerciante bem-sucedido, vindo a casar com Sancha, amiga e colega de escola de Capitu. Em 1865, Bento e Capitu finalmente casam, passando a morar no bairro da Glória. O escritório de advocacia progride e a felicidade do casal seria completa não fosse a demora em nascer um filho. Isto faz com que ambos sintam inveja de Escobar e Sancha, que tinham tido uma filha, batizada com o nome de Capitolina. Depois de alguns anos, nasce Ezequiel, assim chamado para retribuir a gentileza do casal de amigos, que dera à filha o nome da amiga de Sancha.Ezequiel revela-se muito cedo um criança inquieta e curiosa, tornando-se a alegria dos pais e servindo para estreitar ainda mais as relações de amizade entre os dois casais. A partir do momento em que Escobar e Sancha, que moravam em Andaraí, resolvem fixar residência no Flamengo, a convivência entre as duas famílias torna-se completa e os pais chegam a falar na possibilidade de Ezequiel e Capituzinha, como era chamada a pequena Capitolina, virem a se casar.Em 1871 Escobar, que gostava de nadar, morre afogado. No enterro, Capitu, que amparava Sancha, olha tão fixamente e com tal expressão para Escobar morto que Bento fica abalado e quase não consegue pronunciar o discurso fúnebre. A perturbação, contudo, desaparece rapidamente. Sancha retira-se em seguida para a casa dos parentes no Paraná, o escritório de Bento continua a progredir e a união entre o casal segue crescendo. Até o momento em que, cerca de um anos depois, advertido pela própria Capitu, Bento começa a perceber as semelhanças de Ezequiel com Escobar. À medida que o menino cresce, estas semelhanças aumentam a tal ponto que em Ezequiel parece ressurgir fisicamente o velho companheiro de seminário. As relações entre Bento e Capitu deterioram-se rapidamente. A solução de colocar Ezequiel num internato não se revela eficaz, já que Bento não suporta mais ver o filho, o qual, por sua vez, se apega a ele cada vez mais, tomando a situação ainda mais crítica.Num gesto extremo, Bento decide suicidar-se com veneno, colocado numa xícara de café. Interrompido pela chegada de Ezequiel, altera intempestivamente seu plano e decide dar o café envenenado ao filho mas, no último instante, recua e em seguida desabafa, dizendo a Ezequiel que não é seu pai. Neste momento Capitu entra na sala e quer saber o que está acontecendo. Bento repete que não é pai de Ezequiel e Capitu exige que diga por que pensa assim. Apesar de Bento não conseguir expor claramente suas idéias, Capitu diz saber que a origem de tudo é a casualidade da semelhança, argumentando em seguida que tudo de deve à vontade de Deus. Capitu retira-se e vai à missa com o filho. Bento desiste do suicídio.Durante a discussão fica decidido que a separação seria o melhor caminho. Para manter as aparências, o casal parte pouco depois rumo à Europa, acompanhado do filho. Bento retorna a seguir, sozinho. Trocam algumas cartas e Bento viaja outras vezes à Europa, sempre com o objetivo de manter as aparências, mas nunca mais chega a encontrar-se com Capitu. Tempos depois morrem D. Glória e José Dias.Bento retira-se para o Engenho Novo. Ali, certo dia, recebe a visita de Ezequiel de Albuquerque Santiago, que era então a imagem perfeita de seu velho colega de seminário. Capitu morrera e fora enterrada na Europa. Ezequiel permanece alguns meses no Rio e depois parte para uma viagem de estudos científicos no Oriente Médio, já que era apaixonado pela arqueologia. Onze meses depois morre de febre tifóide em Jerusalém e é ali enterrado.O adultério de Capitu não está bem esclarecido para o leitor, já que o próprio narrador-personagem, no decorrer da história, apresenta uma série de indícios, provas e contraprovas, como o fato de Capitu ser parecidíssima com a mãe de Sancha, sem haver, com toda certeza, qualquer parentesco entre elas.Mortos todos, familiares e velhos conhecidos, Bento/Dom Casmurro fecha-se em si próprio, mas não se isola e encontra muitas amigas que o consolam. Jamais, porém, alguma delas o faz esquecer a primeira amada de seu coração, que o traíra com seu melhor amigo. Assim quisera o destino. Decide escrever um livro de memórias na tentativa de atar passado e presente, da "construção ou reconstrução" de si mesmo. É certo que, antes da narrativa, tenta recompor seu passado construindo uma casa em tudo semelhante à de sua adolescência, todavia esse artifício mostra-se inútil e frustrante. Por isso, passa a essa outra alternativa: a da narrativa, que se mostra eficaz. E após seu término, para esquecer tudo, nada melhor que escrever, segundo decide, um outro livro: uma História dos subúrbios do Rio de Janeiro.
Breves Comentários – personagens, narrador, narratário, fábula e trama
Em Dom Casmurro, as personagens são apresentadas a partir das descrições de seus dotes físicos Temos, portanto, a descrição, funcional, bastante comum no Realismo.
As personagens principais são :
Capitu, "criatura de 14 anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, ... morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo ... calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos". Personagem que tem o poder de surpreender : "Fiquei aturdido. Capitu gostava tanto de minha mãe, e minha mãe dela, que eu não podia entender tamanha explosão". Segundo José Dias, Capitu possuía "olhos de cigana oblíqua e dissimulada", mas para Bentinho os olhos pareciam "olhos de ressaca"; "Traziam não sei que fluido misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, com a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca".
Bentinho, também protagonista, que ocupa uma postura de anti-herói. Não pretendia ser padre como determinara sua mãe, mas tencionava casar-se com Capitu, sua amiga de infância. Um fato interessante é que os planos, para não entrar no seminário, eram sempre elaborados por Capitu.
As personagens secundárias são descritas pelo narrador :
Dona Glória, mãe de Bentinho, que desejava fazer do filho um padre, devido a uma antiga promessa, mas, ao mesmo tempo, desejava tê-lo perto de si, retardando a sua decisão de mandá-lo para o Seminário. Portanto, no início encontra-se como opositora, tornando-se depois, adjuvante. As suas qualidades físicas e espirituais...
Tio Cosme, irmão de Dona Glória, advogado, viúvo, "tinha escritório na antiga Rua das Violas, perto do júri... trabalhava no crime"; "Era gordo e pesado, tinha a respiração curta e os olhos dorminhocos". Ocupa uma posição neutra : não se opunha ao plano de Bentinho, mas também não intervinha como adjuvante.
José Dias, agregado, "amava os superlativos", "ria largo, se era preciso, de um grande riso sem vontade, mas comunicativo ... nos lances graves, gravíssimo", "como o tempo adquiriu curta autoridade na família, certa audiência, ao menos; não abusava, e sabia opinar obedecendo", "as cortesias que fizesse vinham antes do cálculo que da índole". Tenta, no início, persuadir Dona Glória à mandar Bentinho para o Seminário, passando-se, depois, para adjuvante.
Prima Justina, prima de Dona Glória. Parece opor-se por ser muito egoísta, ciumenta e intrigante. Viúva, e segundo as palavras do narrador : "vivia conosco por favor de minha mãe, e também por interesse", "dizia francamente a Pedro o mal que pensava de Paulo, e a Paulo o que pensava de Pedro".
Pedro de Albuquerque Santiago, falecido, pai de Bentinho. A respeito do pai o narrador coloca : "Não me lembro nada dele, a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande; o retrato mostra uns olhos redondos, que me acompanham para todos os lados..."
Sr. Pádua e Dona Fortunata, pais de Capitu. O primeiro, "era empregado em repartição dependente do Ministério da Guerra" e a mãe "alta, forte, cheia, como a filha, a mesma cabeça, os mesmos olhos claros". Jamais opuseram-se à amizade de Capitu e Bentinho.
Padre Cabral, personagem que encontra a solução para o caso de Bentinho; se a mãe do menino sustentasse um outro, que quisesse ser padre, no Seminário, estaria cumprida a promessa.
Escobar, amigo de Bentinho, seminarista, "era um rapaz esbelto, olhos claros, um pouco fugitivos, como as mãos, ... como tudo".
Sancha, companheira de Colégio de Capitu, que mais tarde casa-se com Escobar.
Ezequiel, filho de Capitu e Bentinho (Será ?). Tem o primeiro nome de Escobar (idéia de Bentinho, em colocar o mesmo). Vai para a Europa com a mãe, sendo que mais tarde, já moço, volta ao Brasil para rever o pai. Morre na Ásia.
Através das descrições que se faz das personagens, percebe-se um fato comum: os olhos, tão bem explorados por Machado de Assis, como nos exemplos "Olhos de cigana oblíqua e dissimulada", "olhos de ressaca", "olhos dorminhocos", "olhos redondos, que me acompanham para todos os lados". Na verdade, esses elementos físicos, muitas vezes, destacam o estado interior; tem-se um retrato íntimo das personagens. Em "olhos redondos" percebe-se uma característica física, mas, logo após, verifica-se um importante traço psicológico: "...que me acompanham para todos os lados"; que me observam, me estudam. Quanto ao narrador, é homodiegético (aquele narrador que conta e participa da história) e, também, por se tratar do personagem principal, autodiegético. Já em relação ao narratário (o receptor do texto narrativo, a criatura ficcional ou não a quem se dirige o emissor-narrador), vê-se que é extradiegético mencionado, leitor virtual não ficcional. O personagem-narrador dialoga constantemente com os leitores: "Não me tenhas por sacrilégio, leitora minha devota, a limpeza da intenção...", "Por outro lado, leitor amigo, nota que eu queria...", "Sim, leitora castíssima, como diria o meu finado...".Percebe-se claramente a fábula, conjunto de acontecimentos ligados entre si e narrados no decorrer da obra, e a trama, constituída pelos mesmos acontecimentos da fábula, mas caracterizada mais por um procedimento estético, em que o artista revolve com os fatos, não precisando se preocupar em seguir a ordem cronológica da fábula. Em Dom Casmurro, a narrativa encontra-se "in ultimas res", com a presença de analepses, quando o artista volta no tempo, no passado. A fábula é a história em si, a que o narrador quer nos contar, e a trama é o modo como ele nos narra a fábula; a ordem dos fatos na trama é diferente da ordem dos fatos na fábula.
A questão do adultério
Não se sabe ao certo se houve ou não adultério por parte de Capitu e Escobar, já que o personagem-narrador apresenta, no decorrer da narrativa, vários indícios, provas e até contraprovas. Os leitores podem até pender para o lado de um (Bentinho) ou para o de outra (Capitu), entretanto a dúvida sobre o adultério permanece. Machado de Assis, talvez com a intenção de entregar ao leitor este difícil julgamento, foi brilhante ao estruturar sua obra com a apresentação tanto de provas quanto de contraprovas.Primeiramente, atenta-se para a escolha de uma narrativa em primeira pessoa e, portanto, do personagem-narrador, o marido atormentado pela dúvida. Tudo o que se sabe é através de Bentinho, que narra os fatos; além da limitação, pois o leitor é informado apenas sobre o que o narrador conhece ou presencia, há também a possibilidade de Bentinho passar a sua visão das coisas, movido pelo ciúmes e pela imaginação. Desse modo, não se sabe o que é verdadeiramente concreto, real, dentro do romance, ou o que seja imaginado por Bentinho; dedução sua na observação dos fatos. Ele mesmo afirma "A imaginação foi a companheira de toda a minha existência ...".O ciúme generalizado de Bentinho por Capitu toma espaço na narrativa, permitindo-se concluir que Dom Casmurro foi precipitado ao deduzir que Capitu amava Escobar. Desde o início, fica claro o ciúme: "Diante dessa fagulha, que bem podia ser uma maldade do agregado ou pura provocação, Bentinho se vê possuído de "um sentimento cruel e desconhecido, o puro ciúme". Ou ainda quando conversando com Capitu na janela, um jovem passa e olha para ela, que retribui o olhar. Já casados, o ciúme continua presente; Bentinho tem ciúme do mar, quando Capitu permanece com o olhar perdido no mar: "Venho explicar-te que tive tais ciúmes pelo que podia estar na cabeça de minha mulher, não fora ou acima dela".O ciúme é tanto que chega a declarar, em determinado ponto da narrativa, que chegou a tê-lo "de tudo e de todos" e acrescenta "Um vizinho, um par de valsa, qualquer homem, qualquer moço ou maduro, me enchia de terror ou desconfiança".Outras passagens já põem em evidência o clima de traição. É o caso do comentário feito a respeito da teoria do velho tenor italiano – "a vida é uma ópera" -, quando Bento afirma, que em sua ópera, ele cantou "um duo terníssimo, depois um trio, depois um quatuor..." como referência ao seu drama-ópera: o duo, composto de Bento e Capitu; o trio, Bento, Capitu e Escobar, o quatuor, quarteto formado por Bento, Capitu, Escobar e Ezequiel. Mesmo assim, cada vez que se apresenta uma prova, sugerindo o adultério, imediatamente lança-se uma contraprova.Outra sugestão seria a citação, na narrativa, de um velha expressão do povo de que "O filho é a cara do pai". Como contraprova imediata e eficiente, surge a semelhança de Capitu com a mãe de Sancha, parecidíssimas sem qualquer grau de parentesco entre as duas. O próprio pai de Sancha afirma: "Na vida há dessas semelhanças assim esquisitas".Outras duas ocorrências poderiam ser tomadas como provas de adultério: as duas vezes em que Escobar visita Capitu em casa, na ausência de Bentinho. Essas visitas, ao mesmo tempo, não provam nada ou induzem a tudo, principalmente quando Capitu se vê obrigada a contar ao marido sobre a primeira visita do amigo e comenta: "Pouco antes de você chegar; eu não disse para que você não desconfiasse". Desconfiasse do quê? Certamente Capitu já conhecia o ciúme do marido e não queria provocá-lo. Na Segunda, então, Bento, ao voltar da estréia de uma ópera, encontra Escobar no corredor, de saída. Como desculpa, o amigo lhe apresenta um motivo jurídico importante que para Bento não era nada. Isso faz com que ele questione o porquê de Capitu não querer acompanhá-lo ao teatro, alegando estar adoecida e insistindo para que fosse sozinho. Quando chega em casa e se depara com Escobar, constata também que a esposa já "estava melhor e até boa".Assim nada é esclarecido sobre o possível adultério, e o próprio Bentinho afirma: "Não é claro isto, mas nem tudo é claro na vida ou nos livros". Ele ainda atenta para que o leitor considere a sua "fraca memória"; confessa não ter boa memória e por esse motivo diz que "nada se emenda bem nos livros confusos, mas tudo se pode meter nos livros omissos". Ou seja, uma narrativa que apresenta falhas, lacunas a serem preenchidas pelo leitor.
Cabe, então, ao leitor esclarecer tal questão do adultério. O leitor, analisando todas as provas e contraprovas apresentadas, poderá opinar em favor do adultério ou contra ele, ou ainda permanecer na infinita dúvida.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Vivendo no Engenho Novo, um subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, quase recluso em sua casa, construída segundo o molde da que fora a de sua infância, na Rua de Matacavalos, Bento de Albuquerque Santiago, com cerca de 54 anos e conhecido pela alcunha de Dom Casmurro por seu gosto pelo isolamento, decide escrever sua vida.Alternando a narração dos fatos passados com a reflexão sobre os mesmos, no presente, o protagonista/narrador informa ter nascido em 1842 e ser filho de Pedro de Albuquerque Santiago e de D. Maria da Glória Fernandes Santiago. O pai, dono de uma fazendola em ltaguaí, mudara-se para a cidade do Rio de Janeiro por volta de 1844, ao ser eleito deputado. Alguns anos depois falece e a viúva, preferindo ficar na cidade a retornar a ltaguaí, vende a fazendola e os escravos, aplica seu dinheiro em imóveis e apólices e passa a viver de rendas, permanecendo na casa de Matacavalos, onde vivera com o marido desde a mudança para o Rio de Janeiro.A vida do protagonista/narrador transcorre sem maiores incidentes até a "célebre tarde de novembro" de 1857, quando, ao entrar em casa, ouve pronunciarem seu nome e esconde-se rapidamente atrás da porta. Na conversa entre sua mãe e o agregado José Dias, que morava com a família desde os tempos de ltaguaí, Bentinho, como era então chamado, fica sabendo que sua mãe se mantém firme na intenção de colocá-lo no seminário a fim de seguir a carreira eclesiástica, segundo promessa que fizera a Deus caso tivesse um segundo filho varão, já que o primeiro morrera ao nascer.Bentinho, que há muito tinha conhecimento das intenções de sua mãe, sofre violento abalo, pois fica sabendo que a reativação da promessa, que parecia esquecida, devia-se ao fato de José Dias ter informado D. Glória a respeito de seu incipiente namoro com Capitolina Pádua, que morava na casa ao lado. Capitu, como era chamada, tinha então catorze anos e era filha de um tal de Pádua, burocrata de uma repartição do Ministério da Guerra. A proximidade, a convivência e a idade haviam feito com que os dois adolescentes criassem afeição um pelo outro. D. Glória, ao saber disto, fica alarmada e decide apressar o cumprimento da promessa. Os planos de Capitu, informada do assunto, e Bentinho para, com a ajuda de José Dias, impedir que D. Glória cumprisse a decisão ou que, pelo menos, a adiasse, fracassam. Como último recurso, o próprio Bentinho revela à mãe não ter vocação, o que também não a faz voltar atrás. Tio Cosme, um viúvo, irmão de D. Glória e advogado aposentado que vivia na casa desde que seu cunhado falecera, e a prima Justina, também viúva, que, há muitos anos, morava com a mãe de Bentinho, procuram não se envolver no problema. Assim, a última palavra fica com D. Glória, que, com o apoio do padre Cabral, um amigo de Tio Cosme, decide finalmente cumprir a promessa e o envia ao seminário, prometendo, contudo, que se dentro de dois anos não revelasse vocação para o sacerdócio estaria livre para seguir outra carreira. Antes da partida de Bentinho, este e Capitu juram casar-se.No seminário, Bentinho conhece Ezequiel de Sousa Escobar, filho de um advogado de Curitiba. Os dois tornam-se amigos e confidentes. Em um fim de semana em que Bentinho visita D. Glória, Escobar o acompanha e é apresentado a todos, inclusive a Capitu. Esta, depois da partida de Bentinho, começara a freqüentar assiduamente a casa de D. Glória, do que nascera aos poucos grande afeição recíproca, a ponto de D. Glória começar a pensar que se Bentinho se apaixonasse por Capitu e casasse com ela a questão da promessa estaria resolvida a contento de todos, pois Bentinho, que a quebraria, não a fizera, e ela, que a fizera, não a quebraria.Enquanto isto, Bentinho continuava seus esforços junto a José Dias, que, tendo fracassado em seu plano de fazê-lo estudar medicina na Europa, sugeria agora que ambos fossem a Roma pedir ao Papa a revogação da promessa. A solução definitiva, contudo, partiu de Escobar. Segundo este, D. Glória prometera a Deus dar-lhe um sacerdote, mas isto não queria dizer que o mesmo deveria ser necessariamente seu filho. Sugeriu então que ela adotasse algum órfão e lhe custeasse os estudos. D. Glória consultou o padre Cabral, este foi consultar o bispo e a solução foi considerada satisfatória. Livre do problema, Bentinho deixa o seminário com cerca de 17 anos e vai a São Paulo estudar, tornando-se, cinco anos depois, o advogado Bento de Albuquerque Santiago. Por sua parte, Escobar, que também saíra do seminário, tornara-se um comerciante bem-sucedido, vindo a casar com Sancha, amiga e colega de escola de Capitu. Em 1865, Bento e Capitu finalmente casam, passando a morar no bairro da Glória. O escritório de advocacia progride e a felicidade do casal seria completa não fosse a demora em nascer um filho. Isto faz com que ambos sintam inveja de Escobar e Sancha, que tinham tido uma filha, batizada com o nome de Capitolina. Depois de alguns anos, nasce Ezequiel, assim chamado para retribuir a gentileza do casal de amigos, que dera à filha o nome da amiga de Sancha.Ezequiel revela-se muito cedo um criança inquieta e curiosa, tornando-se a alegria dos pais e servindo para estreitar ainda mais as relações de amizade entre os dois casais. A partir do momento em que Escobar e Sancha, que moravam em Andaraí, resolvem fixar residência no Flamengo, a convivência entre as duas famílias torna-se completa e os pais chegam a falar na possibilidade de Ezequiel e Capituzinha, como era chamada a pequena Capitolina, virem a se casar.Em 1871 Escobar, que gostava de nadar, morre afogado. No enterro, Capitu, que amparava Sancha, olha tão fixamente e com tal expressão para Escobar morto que Bento fica abalado e quase não consegue pronunciar o discurso fúnebre. A perturbação, contudo, desaparece rapidamente. Sancha retira-se em seguida para a casa dos parentes no Paraná, o escritório de Bento continua a progredir e a união entre o casal segue crescendo. Até o momento em que, cerca de um anos depois, advertido pela própria Capitu, Bento começa a perceber as semelhanças de Ezequiel com Escobar. À medida que o menino cresce, estas semelhanças aumentam a tal ponto que em Ezequiel parece ressurgir fisicamente o velho companheiro de seminário. As relações entre Bento e Capitu deterioram-se rapidamente. A solução de colocar Ezequiel num internato não se revela eficaz, já que Bento não suporta mais ver o filho, o qual, por sua vez, se apega a ele cada vez mais, tomando a situação ainda mais crítica.Num gesto extremo, Bento decide suicidar-se com veneno, colocado numa xícara de café. Interrompido pela chegada de Ezequiel, altera intempestivamente seu plano e decide dar o café envenenado ao filho mas, no último instante, recua e em seguida desabafa, dizendo a Ezequiel que não é seu pai. Neste momento Capitu entra na sala e quer saber o que está acontecendo. Bento repete que não é pai de Ezequiel e Capitu exige que diga por que pensa assim. Apesar de Bento não conseguir expor claramente suas idéias, Capitu diz saber que a origem de tudo é a casualidade da semelhança, argumentando em seguida que tudo de deve à vontade de Deus. Capitu retira-se e vai à missa com o filho. Bento desiste do suicídio.Durante a discussão fica decidido que a separação seria o melhor caminho. Para manter as aparências, o casal parte pouco depois rumo à Europa, acompanhado do filho. Bento retorna a seguir, sozinho. Trocam algumas cartas e Bento viaja outras vezes à Europa, sempre com o objetivo de manter as aparências, mas nunca mais chega a encontrar-se com Capitu. Tempos depois morrem D. Glória e José Dias.Bento retira-se para o Engenho Novo. Ali, certo dia, recebe a visita de Ezequiel de Albuquerque Santiago, que era então a imagem perfeita de seu velho colega de seminário. Capitu morrera e fora enterrada na Europa. Ezequiel permanece alguns meses no Rio e depois parte para uma viagem de estudos científicos no Oriente Médio, já que era apaixonado pela arqueologia. Onze meses depois morre de febre tifóide em Jerusalém e é ali enterrado.O adultério de Capitu não está bem esclarecido para o leitor, já que o próprio narrador-personagem, no decorrer da história, apresenta uma série de indícios, provas e contraprovas, como o fato de Capitu ser parecidíssima com a mãe de Sancha, sem haver, com toda certeza, qualquer parentesco entre elas.Mortos todos, familiares e velhos conhecidos, Bento/Dom Casmurro fecha-se em si próprio, mas não se isola e encontra muitas amigas que o consolam. Jamais, porém, alguma delas o faz esquecer a primeira amada de seu coração, que o traíra com seu melhor amigo. Assim quisera o destino. Decide escrever um livro de memórias na tentativa de atar passado e presente, da "construção ou reconstrução" de si mesmo. É certo que, antes da narrativa, tenta recompor seu passado construindo uma casa em tudo semelhante à de sua adolescência, todavia esse artifício mostra-se inútil e frustrante. Por isso, passa a essa outra alternativa: a da narrativa, que se mostra eficaz. E após seu término, para esquecer tudo, nada melhor que escrever, segundo decide, um outro livro: uma História dos subúrbios do Rio de Janeiro.
Breves Comentários – personagens, narrador, narratário, fábula e trama
Em Dom Casmurro, as personagens são apresentadas a partir das descrições de seus dotes físicos Temos, portanto, a descrição, funcional, bastante comum no Realismo.
As personagens principais são :
Capitu, "criatura de 14 anos, alta, forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, ... morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo ... calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos". Personagem que tem o poder de surpreender : "Fiquei aturdido. Capitu gostava tanto de minha mãe, e minha mãe dela, que eu não podia entender tamanha explosão". Segundo José Dias, Capitu possuía "olhos de cigana oblíqua e dissimulada", mas para Bentinho os olhos pareciam "olhos de ressaca"; "Traziam não sei que fluido misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, com a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca".
Bentinho, também protagonista, que ocupa uma postura de anti-herói. Não pretendia ser padre como determinara sua mãe, mas tencionava casar-se com Capitu, sua amiga de infância. Um fato interessante é que os planos, para não entrar no seminário, eram sempre elaborados por Capitu.
As personagens secundárias são descritas pelo narrador :
Dona Glória, mãe de Bentinho, que desejava fazer do filho um padre, devido a uma antiga promessa, mas, ao mesmo tempo, desejava tê-lo perto de si, retardando a sua decisão de mandá-lo para o Seminário. Portanto, no início encontra-se como opositora, tornando-se depois, adjuvante. As suas qualidades físicas e espirituais...
Tio Cosme, irmão de Dona Glória, advogado, viúvo, "tinha escritório na antiga Rua das Violas, perto do júri... trabalhava no crime"; "Era gordo e pesado, tinha a respiração curta e os olhos dorminhocos". Ocupa uma posição neutra : não se opunha ao plano de Bentinho, mas também não intervinha como adjuvante.
José Dias, agregado, "amava os superlativos", "ria largo, se era preciso, de um grande riso sem vontade, mas comunicativo ... nos lances graves, gravíssimo", "como o tempo adquiriu curta autoridade na família, certa audiência, ao menos; não abusava, e sabia opinar obedecendo", "as cortesias que fizesse vinham antes do cálculo que da índole". Tenta, no início, persuadir Dona Glória à mandar Bentinho para o Seminário, passando-se, depois, para adjuvante.
Prima Justina, prima de Dona Glória. Parece opor-se por ser muito egoísta, ciumenta e intrigante. Viúva, e segundo as palavras do narrador : "vivia conosco por favor de minha mãe, e também por interesse", "dizia francamente a Pedro o mal que pensava de Paulo, e a Paulo o que pensava de Pedro".
Pedro de Albuquerque Santiago, falecido, pai de Bentinho. A respeito do pai o narrador coloca : "Não me lembro nada dele, a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande; o retrato mostra uns olhos redondos, que me acompanham para todos os lados..."
Sr. Pádua e Dona Fortunata, pais de Capitu. O primeiro, "era empregado em repartição dependente do Ministério da Guerra" e a mãe "alta, forte, cheia, como a filha, a mesma cabeça, os mesmos olhos claros". Jamais opuseram-se à amizade de Capitu e Bentinho.
Padre Cabral, personagem que encontra a solução para o caso de Bentinho; se a mãe do menino sustentasse um outro, que quisesse ser padre, no Seminário, estaria cumprida a promessa.
Escobar, amigo de Bentinho, seminarista, "era um rapaz esbelto, olhos claros, um pouco fugitivos, como as mãos, ... como tudo".
Sancha, companheira de Colégio de Capitu, que mais tarde casa-se com Escobar.
Ezequiel, filho de Capitu e Bentinho (Será ?). Tem o primeiro nome de Escobar (idéia de Bentinho, em colocar o mesmo). Vai para a Europa com a mãe, sendo que mais tarde, já moço, volta ao Brasil para rever o pai. Morre na Ásia.
Através das descrições que se faz das personagens, percebe-se um fato comum: os olhos, tão bem explorados por Machado de Assis, como nos exemplos "Olhos de cigana oblíqua e dissimulada", "olhos de ressaca", "olhos dorminhocos", "olhos redondos, que me acompanham para todos os lados". Na verdade, esses elementos físicos, muitas vezes, destacam o estado interior; tem-se um retrato íntimo das personagens. Em "olhos redondos" percebe-se uma característica física, mas, logo após, verifica-se um importante traço psicológico: "...que me acompanham para todos os lados"; que me observam, me estudam. Quanto ao narrador, é homodiegético (aquele narrador que conta e participa da história) e, também, por se tratar do personagem principal, autodiegético. Já em relação ao narratário (o receptor do texto narrativo, a criatura ficcional ou não a quem se dirige o emissor-narrador), vê-se que é extradiegético mencionado, leitor virtual não ficcional. O personagem-narrador dialoga constantemente com os leitores: "Não me tenhas por sacrilégio, leitora minha devota, a limpeza da intenção...", "Por outro lado, leitor amigo, nota que eu queria...", "Sim, leitora castíssima, como diria o meu finado...".Percebe-se claramente a fábula, conjunto de acontecimentos ligados entre si e narrados no decorrer da obra, e a trama, constituída pelos mesmos acontecimentos da fábula, mas caracterizada mais por um procedimento estético, em que o artista revolve com os fatos, não precisando se preocupar em seguir a ordem cronológica da fábula. Em Dom Casmurro, a narrativa encontra-se "in ultimas res", com a presença de analepses, quando o artista volta no tempo, no passado. A fábula é a história em si, a que o narrador quer nos contar, e a trama é o modo como ele nos narra a fábula; a ordem dos fatos na trama é diferente da ordem dos fatos na fábula.
A questão do adultério
Não se sabe ao certo se houve ou não adultério por parte de Capitu e Escobar, já que o personagem-narrador apresenta, no decorrer da narrativa, vários indícios, provas e até contraprovas. Os leitores podem até pender para o lado de um (Bentinho) ou para o de outra (Capitu), entretanto a dúvida sobre o adultério permanece. Machado de Assis, talvez com a intenção de entregar ao leitor este difícil julgamento, foi brilhante ao estruturar sua obra com a apresentação tanto de provas quanto de contraprovas.Primeiramente, atenta-se para a escolha de uma narrativa em primeira pessoa e, portanto, do personagem-narrador, o marido atormentado pela dúvida. Tudo o que se sabe é através de Bentinho, que narra os fatos; além da limitação, pois o leitor é informado apenas sobre o que o narrador conhece ou presencia, há também a possibilidade de Bentinho passar a sua visão das coisas, movido pelo ciúmes e pela imaginação. Desse modo, não se sabe o que é verdadeiramente concreto, real, dentro do romance, ou o que seja imaginado por Bentinho; dedução sua na observação dos fatos. Ele mesmo afirma "A imaginação foi a companheira de toda a minha existência ...".O ciúme generalizado de Bentinho por Capitu toma espaço na narrativa, permitindo-se concluir que Dom Casmurro foi precipitado ao deduzir que Capitu amava Escobar. Desde o início, fica claro o ciúme: "Diante dessa fagulha, que bem podia ser uma maldade do agregado ou pura provocação, Bentinho se vê possuído de "um sentimento cruel e desconhecido, o puro ciúme". Ou ainda quando conversando com Capitu na janela, um jovem passa e olha para ela, que retribui o olhar. Já casados, o ciúme continua presente; Bentinho tem ciúme do mar, quando Capitu permanece com o olhar perdido no mar: "Venho explicar-te que tive tais ciúmes pelo que podia estar na cabeça de minha mulher, não fora ou acima dela".O ciúme é tanto que chega a declarar, em determinado ponto da narrativa, que chegou a tê-lo "de tudo e de todos" e acrescenta "Um vizinho, um par de valsa, qualquer homem, qualquer moço ou maduro, me enchia de terror ou desconfiança".Outras passagens já põem em evidência o clima de traição. É o caso do comentário feito a respeito da teoria do velho tenor italiano – "a vida é uma ópera" -, quando Bento afirma, que em sua ópera, ele cantou "um duo terníssimo, depois um trio, depois um quatuor..." como referência ao seu drama-ópera: o duo, composto de Bento e Capitu; o trio, Bento, Capitu e Escobar, o quatuor, quarteto formado por Bento, Capitu, Escobar e Ezequiel. Mesmo assim, cada vez que se apresenta uma prova, sugerindo o adultério, imediatamente lança-se uma contraprova.Outra sugestão seria a citação, na narrativa, de um velha expressão do povo de que "O filho é a cara do pai". Como contraprova imediata e eficiente, surge a semelhança de Capitu com a mãe de Sancha, parecidíssimas sem qualquer grau de parentesco entre as duas. O próprio pai de Sancha afirma: "Na vida há dessas semelhanças assim esquisitas".Outras duas ocorrências poderiam ser tomadas como provas de adultério: as duas vezes em que Escobar visita Capitu em casa, na ausência de Bentinho. Essas visitas, ao mesmo tempo, não provam nada ou induzem a tudo, principalmente quando Capitu se vê obrigada a contar ao marido sobre a primeira visita do amigo e comenta: "Pouco antes de você chegar; eu não disse para que você não desconfiasse". Desconfiasse do quê? Certamente Capitu já conhecia o ciúme do marido e não queria provocá-lo. Na Segunda, então, Bento, ao voltar da estréia de uma ópera, encontra Escobar no corredor, de saída. Como desculpa, o amigo lhe apresenta um motivo jurídico importante que para Bento não era nada. Isso faz com que ele questione o porquê de Capitu não querer acompanhá-lo ao teatro, alegando estar adoecida e insistindo para que fosse sozinho. Quando chega em casa e se depara com Escobar, constata também que a esposa já "estava melhor e até boa".Assim nada é esclarecido sobre o possível adultério, e o próprio Bentinho afirma: "Não é claro isto, mas nem tudo é claro na vida ou nos livros". Ele ainda atenta para que o leitor considere a sua "fraca memória"; confessa não ter boa memória e por esse motivo diz que "nada se emenda bem nos livros confusos, mas tudo se pode meter nos livros omissos". Ou seja, uma narrativa que apresenta falhas, lacunas a serem preenchidas pelo leitor.
Cabe, então, ao leitor esclarecer tal questão do adultério. O leitor, analisando todas as provas e contraprovas apresentadas, poderá opinar em favor do adultério ou contra ele, ou ainda permanecer na infinita dúvida.
Organização: Professor Francisco Muriel.
Assinar:
Postagens (Atom)