Análise do Conto: A menina de lá – João Guimarães Rosa.
No isolamento da roça, num lugar chamado “Temor-de-Deus”, localizado atrás da Serra do Mim, vivia uma estranha meninha chamada Nhinhinha. É notável como os topônimos iniciais já conferem ao conto uma aura de misticismo, que será progressivamente mesclado com um processo de sondagem do inconsciente. Nhinhinha inventava estórias absurdas, como a da abelha que se vou para uma nuvem ou da necessidade “de fazer uma lista das coisas todas que no dia por dia a gente vem perdendo. Intercalava suas brincadeiras com frases do tipo “A gente não vê como o vento acaba”, ou “Eu quero ir para lá”.
Quando a família falava dos parentes mortos, ela se ria dizendo: - “Vou visitar eles...” Tiantônia foi a primeira a perceber os dotes paranormais da menina: certa manhã ouviu-a dizer que queria um sapo; instante depois, entra pela sala uma “rã verdíssima”, indo direto para os pés de Nhinhinha. A família decide guardar o segredo:
“(...) não viessem ali os curiosos, gente maldosa e interesseira, com escândalos. Ou os padres, o bispo, quisessem tomar conta da menina, levá-la para sério convento. Ninguém, nem os parentes mais de perto, devia saber. Também, o pai, Tiatônia e a mãe, nem queriam versar conversas, sentiam um medo extraordinário da coisa. Achavam ilusão.”
Muitos prodígios se sucederam: o que ela falava acontecia. Quando a mãe adoecera, suas dores foram aliviadas pelo abraço e beijo quente da filha. Como as terras do roçado estavam secas, anunciando a perda total da colheita, o pai manifesta seu desespero e procura convencer a filha a pedir chuva. Dois dias depois, Nhinhinha “quis” uma arco-íris: choveu e, logo depois, um “vivo cor-de-rosa” desenhou-se no céu! Nesse dia, os pais não entenderam o motivo da menina Ter sido duramente repreendida pela tia. Dissimularam sua revolta, contentes com a perspectiva risonha que o futuro lhe acenava, alimentando projetos de desfrutarem economicamente a paranormalidade da filha. Foi aí que Nhinhinha adoeceu e morreu. Abatidos pela tristeza, os pais, ao tomarem as primeiras providências para um enterro com “acompanhamento de virgens e anjos”, são interrompidos por Tiantônia, que lhes conta o motivo da repressão em Nhinhinha: no dia do arco-íris, a menina dissera que queria um caixãozinho cor-de-rosa com enfeites brilhantes. Diante do derradeiro milagre, os pais como que a beatificam: o conto acaba com a expressão “Santa Nhinhinha”.
Nhinhinha é uma personagem alegórica, que simboliza o lirismo puro da mágica inocência infantil. Ela representa o estágio congênito, inato da sabedoria, numa fase irracional, anterior à consciência lógica. Lembra o arquétipo da “criança primordial” desenvolvida por Jung; segundo essa noção, a criança possui sentido de totalidade ou integridade no conhecimento das coisa, que se manifesta apenas antes do aparecimento do ego consciente, irrompendo sob a forma do misticismo e da ilogicidade.
Análise do Conto: Antiperipléia – João Guimarães Rosa.
Este conto, o primeiro de Tutaméia (ou Terceiras Estórias), terá como protagonista uma personagem muito interessante, pela sua profissão. Prudenciano é guia de cego. “Patrão meu, não. Eu regia – ele me acompanhava(...) ”. Esta atividade foi muito desempenhada por crianças do sertão que por serem parentes do cego mediante remuneração: “ele me dava cachaças, comidas.” passam toda a infância e parte de sua adolescência a vagar com o seu “regido” de vila em vila: “Aqui paramos, os meses, por causa da mulher....”
Porém, esse guia, desde o começo da história, dialoga com um delegado que pede que saia do Vilarejo por causa da misteriosa morte de seô Tomé, homem que ele guiava. Ele hesita, com medo das acusações que todos fazem.
“E vão me deixar ir? Em dês que o meu cego seô Tomé se passou, me vexam, por mim puxam, desconfiam discorrendo. Terra de injustiça.”
Em seu diálogo com o delegado ele diz que há coisas que todos desconhecem, pois o cego encontrava-se escondido com uma mulher, que não tinha, assim, uma aparência tão formosa: “as coisas começam deveras é por detrás do que há, recurso: quando no remate acontecem, estão já desaparecidas.” E pelo fato do delegado não lhe Ter perguntado nada, diz que vai lhe contar o que se sucedera. Começa narrando o seu relacionamento com seô Tomé, e como ele era desejados pelas mulheres. E o cego, sem ver, pedia para que ele – que ao contrário do cego, era feio e pouco desejado - descrevia a formosura das mulheres que a ele desejavam. Um fato interessante é que ambos (o cego e o guia) se invejavam. O guia, para suprir esta falta bebia: “Bebo, para impor em mim amôres dos outros.” E quando o guia se embriagava, o cego tinha de esperá-lo: “Bebo. Tomo até me apagar, vejo outras coisas. Ele carecia de esperar...”
Em um certo dia eles chegam ao vilarejo e logo essa mulher, a Sa Justa, vai pedir ao guia que descreva ela, que era “muito feia”, como uma mulher formoso para o cego, a mais formosa de todas. Diante de tais descrições, o cego logo se apaixona e passa a encontrar-se, às escondidas, com a mulher. Ela, era casada, contudo seu marido desgostava dela. “O marido desgostava dela, druxo homem, de estrambolias, nem vinha em casa..”. Mas era preciso cautela. Assim a cada novo encontro a mulher pedia ao guia que descrevesse malucas belezas. De observar o quanto a mulher ficava com o guia o cego começou a se inciumar. O marido da mulher, que com o guia bebia e já deveria Ter consciência do caso, a toda hora queria o dinheiro da sacola, que era arrecadado pelo cego. Esmolas.
Até que uma certa noite, o cego cai de um precipício, e todos acham que o guia é culpado. Ele, que se embriagara na noite do incidente diz que: “Seô Tomé, no derradeiro, variava: falando que voltara a enxergar.” Assim ele elenca algumas suposições sobre o autor do crime, se assassinato ou o caso de suicídio, pois se o cego realmente tivesse, realmente, voltado a enxergar, avistaria toda a feiura de Justa, pode Ter se desiludido de tal forma e se jogado. Já no caso de assassinato, o primeiro a ser sugerido seria o esposo, que desgostoso com a traição ou até mesmo para roubar a sacola com as esmolas, empurrara o cego ladeira abaixo. Ainda sugere a própria mulher, após Ter tomado consciência de que o cego voltara a enxergar, o empurrara para não ver o assombro de seus traços.
Ele acaba dizendo ao delegado que vai para a cidade somente se for para voltar a guiar cegos.
Organização: Francisco Muriel
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2 comentários:
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